São Paulo, quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A esquerda prepondera, diz Rosenfield

UIRÁ MACHADO
COORDENADOR DE ARTIGOS E EVENTOS

No começo da entrevista, o filósofo Denis Lerrer Rosenfield, 55, titubeou ao ser questionado se suas idéias são de direita. "Se for algo pejorativo, é um equívoco completo", disse. Depois, fez questão de procurar a reportagem para acrescentar que sim, é de direita. Mas que fique claro: ele fala de uma "direita moderna".
Professor de filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e editor da revista "Filosofia Política", Rosenfield está entre os que vêem espaço para o surgimento de uma nova direita, desvinculada das idéias de um Estado totalitário e corrupto e identificada com a boa gestão administrativa e a defesa das liberdades.
A seguir, trechos da entrevista.

 

Folha - O sr. considera um equívoco ou um acerto suas idéias serem classificadas como de direita?
Denis Rosenfield -
Se se trata de algo pejorativo, e, portanto, a pessoa está querendo me agredir, é um equívoco completo. No fundo, direita ou esquerda, hoje, são conceitos relativos. Não têm maior conteúdo ideológico. Mas o que ocorre é que, no Brasil, havia e há ainda uma preponderância do pensamento de esquerda marcado pela influência petista. Mas o PT no governo mostrou que essa esquerda não tinha idéia nenhuma. Frente a essa questão, se coloca a necessidade de uma direita moderna.

Folha - Como ela seria?
Rosenfield -
Definiria assim: economia de mercado, Estado de Direito, democracia representativa, Estado menor e menor carga tributária. E acrescentaria um ponto fundamental: no mais amplo reino de liberdades. E isso não se confunde minimamente com selvageria ou com barbárie.

Folha - O escândalo do "mensalão" abriu espaço para essa direita moderna intensificar seu discurso?
Rosenfield -
Certamente. Mas, para que esse discurso da direita moderna se fortaleça, ele precisa de uma bandeira ética, de defesa da moralidade. Identificar a direita com a corrupção é um despropósito completo. No Brasil, a questão da corrupção está vinculada a um outro problema que eu considero central: o tamanho do Estado e a questão dos impostos.

Folha - Mas não é mais "defensável" um Estado que dê sustento à população do que um Estado que deixe as pessoas ao deus-dará?
Rosenfield -
Estou de acordo. Mas eu não estou defendendo a idéia de que o Estado enxuto vai deixar as pessoas pobres ao deus-dará. Digo o seguinte: vamos fazer um choque de gestão e ter outras idéias do ponto de vista de melhor atender os destinatários.
O que você coloca como questão, que eu acho muito boa, é o discurso. Mas temos que confrontar o discurso com a realidade.

Folha - Então, a crise abre um espaço para que o discurso da direita moderna seja mais ouvido?
Rosenfield -
Disso estou convencido. O que me surpreende é que os partidos políticos ainda não tenham entrado nessa via. A crise do PT abre um espaço enorme para essa proposta que eu chamo de direita moderna.

Folha - E que não seja mais vista de forma pejorativa?
Rosenfield -
Sim.

Folha - Sua primeira resposta, quando perguntei se suas idéias eram de direita, foi defensiva, dizendo que, se fosse pejorativo...
Rosenfield -
Pois é, que poderia ser entendido como pejorativo...

Folha - Mas se eu tivesse perguntado a alguém se tais idéias são de esquerda, acho que essa pessoa não começaria se defendendo...
Rosenfield -
Exatamente. Estou de acordo com você.

Folha - Isso pode se inverter?
Rosenfield -
Acho ainda muito difícil. Se considerarmos as últimas eleições presidenciais, tivemos quatro candidatos de esquerda. Isso é único no mundo. Diria até patológico. Em nenhum lugar do mundo é assim. Aqui é. E por quê? Porque, aqui, todos dizem que ser de direita é pejorativo, né?
Mas podemos ter uma direita moderna identificada a um partido de centro. Uma direita moderna, atenta às questões sociais.

Folha - Em termos ideais, o sr. não concorda com que um Estado mais ausente deixa os "fracos" mais expostos ao domínio dos "fortes"?
Rosenfield -
Isso sim. Estou de acordo com você, mas depende da função reguladora do Estado. É uma questão que se coloca.

Folha - Podemos dizer que a direita está saindo do armário?
Rosenfield -
Se for uma direita moderna, vai saber sair do armário. Se não for, fica lá dentro. Porque as pessoas ficam identificando a direita com regime militar. Aí não dá, né? E deixa eu acrescentar uma coisa: se ser de direita significa defender as liberdades, então sou de direita. E por liberdades quero dizer as liberdades políticas, de opinião, de expressão, econômica e direitos civis.


Texto Anterior: Direita, volver!: "O povo brasileiro é maciçamente de direita"
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.