São Paulo, domingo, 15 de março de 2009

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BIA ABRAMO

"CQC" e os limites da propaganda


O programa voltou ótimo, mas protagonizar vinhetas comerciais pode não ser tão boa idéia

O "CQC" voltou como foi: engraçado, provocativo, energético e atolado nos comerciais.
Medida do sucesso, sim, mas talvez também de uma limitação, que cedo ou tarde, o programa pode sofrer.
Além dos regulares (e longos, muito longos) intervalos comerciais, há vinhetas entra cada atração, nas quais os próprios jornalistas-atores-apresentadores atuam vendendo cerveja, desodorante etc. Todos, como dizem em Portugal, têm piada.
Repito, o programa é ótimo. Mesmo. Voltou com novos quadros, "Fala na Cara", "Palavras Cruzadas" e "CQC Teste", e voltou com pauta boa para os antigos. O trio de apresentadores -Marcelo Tas, Rafinha Bastos e Marco Luque- é rápido, inteligente e, importante, tem carisma e combina.
Os repórteres fixaram seus tipos e sabem explorá-los com criatividade e graça. O quadro "Top Five" é de gargalhar. O recurso da animação gráfica como "comentário" irônico e gag visual, parece ainda mais afiado, a julgar por essa reestreia.
O "CQC" 2009 conseguiu botar os óculos no Ronaldo, o grande assunto da segunda-feira em que reestreou, deixou Paulo Maluf frente a frente com transeuntes críticos, testou o nível de conhecimentos de parlamentares com os resultados vexaminosos esperados, esteve na entrada do aniversário da Hebe importunando as celebridades e botou Rafinha Bastos de cueca no hall do palácio do governo do Distrito Federal a reclamar de um hospital-fantasma. Tudo certo, na verdade.
Por que, então, implicar com o excesso de vinhetas comerciais? De certa forma, o que se faz de um lado, desfaz-se, ao menos parcialmente, de outro: "Sejamos iconoclastas e irreverentes com tudo e com todos, menos, é claro, com o capital que nos viabiliza (compreensível) e para quem emprestamos rosto, verve, gestos e, sim, credibilidade (um pouco menos compreensível)".
A contundência e a coragem de fazer políticos e autoridades passarem os mais diversos ridículos, a capacidade de zombar de famosos dos mais variados calibres, a inquietude do jornalismo-cidadão dos quadros mais "sérios" se rende à publicidade e à "neutralidade" do consumo.
São as contradições do mundo moderno: ao mesmo tempo em que o dinheiro dos patrocinadores e anunciantes os mantém autonômos e livres de pressões políticas, também se subordina, de alguma forma, a independência ao mercado. Pode-se argumentar que ajudar a vender desodorante é o preço que se paga, mas o caso é que a indistinção entre os campos do "conteúdo" e da propaganda podem acabar por comprometer a credibilidade.

biabramo.tv@uol.com.br


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