São Paulo, Quinta-feira, 15 de Julho de 1999
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LIVRO
"De Olhos Bem Abertos" traz comentários sobre filmes
Volume revela preferências cinematográficas do diretor

AMIR LABAKI
enviado especial a Nova York

A espera acaba amanhã, com a estréia nos Estados Unidos de "De Olhos Bem Fechados" ("Eyes Wide Shut"), o testamento fílmico de Stanley Kubrick (no Brasil, em 3 de setembro).
Tão misterioso quanto o filme que todo mundo quer ver é tudo que o próprio Kubrick via. Ou era.
Frederic Raphael desbrava também o olhar de Kubrick sobre o cinema contemporâneo no obrigatório "De Olhos Bem Abertos" ("Eyes Wide Open"), que ganha versão brasileira neste mês pela Geração Editorial. Fragmentos de suas conversas tratam de filmes que chamaram a atenção de Kubrick na última década.
Seus comentários raramente são precisos. Ainda assim, permitem esboçar algo do quadro de referências cinematográficas recentes com que trabalhava o cineasta.
Não surpreende que fábulas sobre manipulação encabecem sua lista de preferidos.
A primeira indicação que Kubrick dá a Raphael é o "Decálogo", de Kieslowski.
Para o escritor, o único ponto em comum entre os diretores seria "uma obsessão pelo desagradável".
Kubrick não desenvolve muito as causas de sua admiração. Limita-se a considerar "extraordinário" Kieslowski "ter realizado dez daqueles num mesmo ano". "Acho que devemos levá-lo em conta", afirma, enigmático, para Raphael.
A mesma frase foi usada por Kubrick para destacar "Tempo de Violência - Pulp Fiction", de Quentin Tarantino.
Felizmente foi um pouco mais além. "O jeito que a história foi contada" chamou-lhe a atenção. Impressionou-o também "o ritmo".
Raphael se lembra ainda da admiração de Kubrick por "Jogo de Emoções" (1987), de David Mamet, e "O Esquilo Vermelho" (1993), de Julio Medem. Não nos dá nenhuma pista, limitando-se a discordar.
Não por coincidência, ambos giram em torno de manipulações. No filme de Mamet, de uma psicanalista por um obsessivo jogador. No de Medem, de uma acidentada por um desconhecido que se faz passar por seu amante.
Kubrick classifica "Maridos e Amantes", de Woody Allen, como "um filme muito bom". Obcecado por detalhes, nota, porém, que o apartamento em que vive o protagonista é grande demais para os ganhos do personagem.
Bastante original é sua leitura de "A Lista de Schindler", de Steven Spielberg. Kubrick não o considera um filme sobre o Holocausto.
"Aquilo é sobre sucesso, não? O Holocausto são 6 milhões de pessoas sendo mortas. "A Lista de Schindler" era sobre 600 pessoas não o sendo."
Kubrick diz a Raphael não acreditar que já tenha havido algum filme sobre o Holocausto. Ele mesmo tentou rodar um. Depois de filmar "Nascido para Matar", Kubrick dedicou-se a uma adaptação do romance "Wartime Lies" (Mentiras de Guerra), de Louis Begley.
É a história de um garoto judeu polonês que se faz passar, com sua tia, por católico para sobreviver à perseguição em Varsóvia.
Presos num trem enviado a Auschwitz, conseguem escapar e abrigam-se numa fazenda até o fim do conflito.
Reentitulado "Aryan Papers", o filme seria rodado por Kubrick na Dinamarca.
No final de 1993, as notícias sobre o início das filmagens em fevereiro de 1994 eram desmentidas pelo anúncio oficial de "A.I." como o novo projeto de Kubrick, logo substituído por "De Olhos Bem Fechados".


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