|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Música
Arnaldo adota linha intimista em novo CD
Ex-Titã grava "Acabou Chorare" e se
distancia do rock em "Qualquer"
"João Gilberto era uma lição que eu também usava
quando estava berrando com os Titãs", afirma ele,
que não renega o passado
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Arnaldo Antunes passou a
adolescência ouvindo "Acabou
Chorare", o histórico disco dos
Novos Baianos, e sempre gostou de cantar em casa a delicada canção-título do álbum de
1972. Mas só agora encontrou o
lugar certo para gravá-la:
"Qualquer", seu novo CD.
A opção ajuda a entender o
disco que Arnaldo chama de
"doce". É seu primeiro trabalho
sem bateria, a sonoridade é dada por instrumentos de corda e
um piano, todas as 14 músicas
são suaves e as interpretações,
intimistas. O ex-Titã nunca esteve tão distante do rock.
"Às vezes acho que esse disco
reflete uma maturidade, mas
me recuso a pensar que cheguei
a um formato no qual vou me
sentar confortavelmente ou renegar o que eu fiz. Mudei minha atenção para privilegiar
um aspecto que já havia no meu
trabalho, mas que estava convivendo com outros, inclusive o
lado mais pesado", relativiza.
No texto para a imprensa, o
cantor fala na "lição de João
Gilberto", o que também torna
interessante a escolha de "Acabou Chorare", dada a influência
e a relação do mestre da bossa
nova com os Novos Baianos.
Arnaldo ressalta que, no seu caso, a influência é antiga.
"João Gilberto era uma lição
de interpretação que eu também usava quando estava berrando junto com os Titãs. A lição dele é de adequação, o que
eu mais prezo em música. Não
haveria adequação se cantasse
nesse disco "Lugar Nenhum"
[dos Titãs]. Quando você consegue interpretar com naturalidade, expressa ao máximo o
que a letra está dizendo e sugere emoções que estão para além
do que diz a letra", diz ele.
Em "Qualquer", Arnaldo
adota a naturalidade não só no
sentido de adequação, mas de
cantar da forma mais próxima
possível da que fala. Ou seja,
um canto grave.
"É o meu registro de voz natural. Quando cantava com os
Titãs, escolhia os tons todos altos, mas era para poder soltar o
berro. Som pesado tem que ter
volume", diferencia.
Ele descobriu de que forma
baixaria o volume ao gravar, no
ano passado, "Hotel Fraternité" (poema do alemão Hans
Magnus Enzensberger que musicou) para o filme "Achados e
Perdidos", de José Joffily.
A canção foi refeita para
"Qualquer", mas com o mesmo
estilo que deu conceito ao CD:
instrumentos de cordas -nas
mãos de Cézar Mendes, Chico
Salem, Dadi e Edgard Scandurra- e o piano de Daniel Jobim.
Tudo foi gravado em três dias
em um estúdio do Rio, com todos tocando ao mesmo tempo,
como se fosse ao vivo.
"O fato de eu fazer um disco
com uma sonoridade mais restrita, sem apontar para muitos
lados, talvez seja maturidade
não por chegar a esse formato,
mas por ter chegado ao desejo
de fazer um disco com um formato", avalia Arnaldo.
Parcerias
Invertendo o caminho habitual, ele buscou no seu repertório músicas que cabiam no conceito sonoro. Gravou pela primeira vez "Eu Não Sou da Sua
Rua", parceria com Branco Mello que Marisa Monte lançou
em 90, "As Coisas", parceria
com Gilberto Gil do disco "Tropicália 2" (93), e "Lua Vermelha", canção sua e de Carlinhos
Brown interpretada por Bethânia no disco "Âmbar" (96).
Das inéditas, há a primeira
parceria com Adriana Calcanhotto ("Para Lá"), duas com os
portugueses Hélder Gonçalves
e Manuela Azevedo ("Qualquer" e "Num Dia"), e duas com
os tribalistas Marisa e Brown
("Contato Imediato" e "O Que
Você Quer Saber de Verdade").
"São raros os parceiros com
quem eu tenha uma produção
tão fértil e tão fluente. Foi uma
experiência muito feliz que
continua para além dos Tribalistas. Continuamos nos encontrando para compor no Rio, na
Bahia, em São Paulo. Eu tinha
uma relação assim com os Titãs, muito íntima, sem medo de
jogar idéias fora", conta.
Para falar das guerras de hoje, Arnaldo optou por uma canção de Péricles Cavalcanti:
"Nossa Bagdá". "Em tudo o que
eu vi referente a essa questão,
faltou essa doçura [da música].
Ela fala da cidade de Bagdá como um tempo que vai além desse momento, uma coisa milenar, antiga, do que representa
no imaginário da gente. É a resistência da tradição, da história, da cultura que sobreviveu a
várias guerras e, pensando positivamente, vai sobreviver à
atual também."
QUALQUER
Gravadora: Biscoito Fino
Quanto: R$ 33,50, em média
Texto Anterior: Horário nobre na TV aberta Próximo Texto: Análise: "Qualquer" é reinvenção da particularidade Índice
|