São Paulo, sábado, 15 de setembro de 2007

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Livros

Afeganistão vira "cebola" em mesa da Bienal do Rio

Autora de "O Salão de Beleza de Cabul" diz que o país, como o bulbo, tem muitas camadas

Afegão Muhammad Rais ataca autora do best-seller "O Livreiro de Cabul" em debate; escritor argelino critica política dos EUA

SYLVIA COLOMBO
ENVIADA ESPECIAL AO RIO

"O Afeganistão é como uma cebola, cada vez que descascamos uma fatia, descobrimos outra." Foi desse modo bastante didático que a norte-americana Deborah Rodriguez definiu o país onde viveu por cinco anos e no qual ambientou seu romance "O Salão de Beleza de Cabul".
A ex-cabelereira, hoje celebridade literária, debateu as dificuldades de comunicação entre Ocidente e Oriente com o afegão Shah Muhammad Rais ("Eu Sou o Livreiro de Cabul") e o argelino Yasmina Khadra ("As Andorinhas de Cabul"), anteontem, no primeiro dia da 13ª Bienal do Livro do Rio.
O encontro foi marcado por diferenças entre os autores com relação a vários temas, violência, direitos humanos, pobreza e fanatismo religioso. Mas, apesar das divergências, o debate não decolou. O formato não permitiu discussão entre os participantes, pois os temas eram lançados a cada um separadamente, sem réplicas.
Muhammad Rais atacou a norueguesa Asne Seierstad, que publicou "O Livreiro de Cabul", baseada em sua experiência depois de viver com sua família, no Afeganistão. "Fiquei com a impressão de que ela entrou numa dessas lojas de tecido indianas, onde tudo é muito colorido e muito fácil de se confundir. Ela não entendeu nada do que viu", disse.
Yasmina Khadra foi agressivo o tempo todo, deixando claro que não quer ser misturado ao filão literário dos "autores de conflito". "Escrevo há 25 anos, tenho 19 livros. Sempre avisei o Ocidente, mostrando que sua maneira de impor a verdade nos levaria a uma crise de enfrentamento. Não me ouviram, aí está o resultado."

Choque
Mais humilde, porém mais lúcida, Rodriguez confessou que, até o 11 de Setembro, nunca tinha ouvido falar no Taleban nem sabia achar o Afeganistão no mapa. E, quando foi para o país, em missão humanitária, teve um choque, pensou que tinha voltado 2.000 anos no tempo. "Como mulher ocidental, devo ter feito tantas coisas consideradas ofensivas que nem posso imaginar. Mas o choque foi dando lugar à curiosidade e ao respeito. Não tenho o direito de julgá-los."
A questão dos direitos humanos foi mais controversa. Rodriguez disse que não concorda com a prisão de mulheres que fogem dos maridos. Mas acha que a sociedade está mudando por meio da educação.
Já o radical Khadra voltou à carga contra o Ocidente. "Há mais mulheres exploradas nos EUA e na Europa do que no mundo islâmico. Os EUA vivem sob um regime stalinista, onde a barbárie atingiu seu ápice. Chamo os intelectuais para ajudar a derrubar toda a hipocrisia ocidental e os estereótipos que se fazem de nós."


A jornalista SYLVIA COLOMBO viajou a convite da organização do evento

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