São Paulo, sexta-feira, 15 de outubro de 2004

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"Bit" homenageia Mundo Livre S/A

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Deu a louca no sistema fonográfico. O Mundo Livre S/A, uma das mais importantes bandas da música impopular brasileira, dá pausa em suas desavenças com as gravadoras para receber caprichada homenagem a seus dez anos de trajetória discográfica.
Trata-se da caixa de CDs "Bit", que agrega os quatro primeiros álbuns da banda (só fica de fora o independente "O Outro Mundo de Manuela Rosário", de 2003), mais um DVD com dez videoclipes e/ou apresentações ao vivo.
A estranheza começa quando se assiste ao clipe de "Melô das Musas" (2000). Era uma sátira direta e nada sutil aos desmandos dos chefões de gravadoras, que, insatisfeitos com a "feiúra" de Fred Zero Quatro, 42, e cia. os substituíam por atores e atrizes estilosos -e comemoravam ter se livrado "daqueles malas".
Pois bem, chefões do Mundo Livre à época eram os homens da hoje extinta Abril Music. Um desses era João Augusto, 47, hoje diretor da independente Deckdisc, a gravadora que resolveu bancar a edição de luxo de "Bit".
Após várias viravoltas da indústria musical, o rebelde de carteirinha Zero Quatro não esconde felicidade e surpresa com o reconhecimento. "Não me lembro de nenhum lançamento de Pernambuco que historicamente tenha tido um tratamento tão respeitoso e perfeccionista de uma gravadora. Talvez Luiz Gonzaga", diz, lembrando que toda a discografia do grupo estava fora de catálogo.
Para justificar sua iniciativa, João Augusto também é todo elogios. "O Mundo Livre pode não ter tido um grande sucesso comercial, mas construiu uma forte reputação e tem ao seu redor uma turma de admiradores que mantém a banda firme na estrada", afirma, dizendo que espera vender 10 mil caixas "Bit" (a tiragem inicial é de 3.000).
Banda intransigente e gravadora comercial fazendo concessões de parte a parte em prol de "Bit", até parece que um outro mundo musical é possível. É mesmo, mas não pense que os notórios brigões abrem mão de suas divergências.
Zero Quatro ainda se lembra da dificuldade de encontrar para o CD "Por Pouco" um produtor que fosse consenso entre banda e gravadora. "Durante meses o negócio não andava, até que João veio propor Mario Caldato, um nome que tínhamos sugerido lá no início. Topamos na hora", relembra. "Não me reconheço reapresentando idéias dos outros. E nem preciso", reage o executivo.
Fred cita outro pomo da discórdia na passagem conflituosa pela Abril, quando a gravadora recusou a mixagem de "Por Pouco" porque sua voz estaria muito baixa. "Bancaram nossa ida a Los Angeles, João Augusto entrou no estúdio com a gente. Achamos esquisito ele estar lá no meio da mixagem."
O ex-chefe não poupa palavras no contra-ataque: "Paralamas do Sucesso, Legião Urbana, Marisa Monte, Titãs, Fernanda Abreu e uma infinidade de outros grandes artistas com quem trabalhei sempre pediram minha presença no estúdio, porque, modéstia à parte, agrego muito quando trabalho no estúdio". E completa: "Esse tipo de comentário feito agora cheira a "não posso aceitar que existam pessoas competentes em gravadoras". Pura tolice".
"Tolices" à parte, a existência de "Bit" atesta a tolerância mútua crescente entre os dois lados do ringue. E a batalha de confetes conduz à consagração de um vencedor extra no final: quem gosta de música.


BIT. Caixa com quatro CDs e um DVD do Mundo Livre S/A. Lançamento: Deckdisc. Quanto: R$ 115, em média.


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