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CINEMA
Ada Falcón, cantora de tangos argentina que se recolheu no auge do sucesso, é tema de documentário exibido em SP
Filme tenta ver além dos olhos da diva
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
No documentário ao estilo de
filme de suspense "Yo No Sé qué
me Han Hecho Tus Ojos" (Não
Sei o que Seus Olhos me Fizeram)
-cartaz de amanhã na 1ª Mostra
de Documentários do Mercosul,
na Cinemateca Brasileira- o diretor argentino Sergio Wolf assume o personagem do detetive.
Wolf se deixa filmar (pela co-diretora Lorena Muñoz) caminhando pelas ruas de Buenos Aires, remexendo arquivos, interrogando
artistas da velha guarda, em busca
de uma pista sobre o paradeiro da
cantora de tangos Ada Falcón.
Diva nos anos 30, estrela de produções de teatro e cinema, Ada
deixa a cena artística, sem explicações, no início da década de 40.
Nunca reaparece. Especula-se que
a cantora se desfez de todos os signos de opulência que cultivava
(jóias, automóveis, roupas caras)
e se recolheu a um convento.
Dizem também que a reviravolta na vida da estrela coincide com
uma decepção amorosa. O então
igualmente famoso autor e diretor musical Francisco Canaro
(que havia se inspirado nas magnetizantes pupilas verdes de Ada
para compor o lamento amoroso
em forma de tango "Yo Nó Sé qué
me Han Hecho Tus Ojos", gravado por ela) teria partido o coração
da diva quando deixou sua mulher para assumir o romance não
com ela, mas com outra amante.
É o que dizem. É o que Wolf ouve aqui e ali, enquanto traça a busca paralela pelo encontro com a
única pessoa capaz de revelar as
razões de seu recolhimento.
"Yo No Sé qué me Han Hecho
Tus Ojos" levou cinco anos para
ficar pronto. Quando estreou na
Argentina, permaneceu seis meses em cartaz, em duas salas. Os
25 mil espectadores que atraiu são
marca respeitável no currículo de
qualquer documentarista no país.
Foram muitas as interpretações
do filme que Wolf ouviu de público e crítica -a história de Ada é
uma metáfora sobre os desaparecidos durante a ditadura militar; o
filme é um retrato não da cultura
argentina, mas do que a Argentina fez com sua cultura; trata-se da
geração dos netos tentando compreender a dos avós.
O diretor não refuta as análises,
por achar que falar para além do
que se quis é da natureza dos documentários. "Quando as pessoas
lêem uma história, podem ver até
aquilo que não pensamos."
O que Wolf, sim, pensou e pensa é que "os pequenos personagens, os que o mundo encostou
pelo caminho, iluminam melhor
a grande história". O fascínio do
diretor por Ada Falcón vai, portanto, além daquilo que ele enuncia no filme: a curiosidade de entender como alguém "pode deixar tudo por uma convicção".
Embora se valha da estrutura de
filme policial, própria da ficção,
"em que o público não sabe se um
personagem aparecerá ou não",
"Yo No Sé qué me Han Hecho
Tus Ojos" não perde interesse se o
espectador souber de antemão
que os diretores conseguem localizar Ada Falcón e vencer sua resistência a falar.
É no diálogo com a diva retirada
que Wolf experimenta um aspecto em que os documentários parecem superiores à ficção. O diretor pergunta à cantora qual foi o
grande amor de sua vida. "Eu
nunca conseguiria roteirizar uma
resposta com aquela ambigüidade", diz Wolf. A resposta de Ada
Falcón não será reproduzida aqui.
É segredo para o espectador desvendará vendo o filme. Se é que
Ada Falcón é um personagem
possível de desvendar-se.
YO NO SÉ QUÉ ME HAN HECHO TUS
OJOS. Argentina, 2003. Documentário
sobre a cantora de tango Ada Falcón.
Direção: Sergio Wolf e Lorena Muñoz.
Onde: Sala Cinemateca (largo Senador
Raul Cardoso, 207, Vila Mariana, SP, tel.
0/ xx/11/5081-2954). Quando: amanhã,
às 18h30. Quanto: R$ 10.
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