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Crítica/"A Casa de Alice"
Olhar severo e moralizante marca história
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Após uma hora e meia
vendo "A Casa de Alice", que se passa quase
todo no interior de um pequeno apartamento, é impossível
ao espectador conhecer a geografia do local: onde fica a sala
em relação à cozinha, esta em
relação aos quartos, e um quarto em relação a outro.
"A Casa de Alice" trabalha
com espaços desconectados.
Embora exíguos, é como se desconhecessem uns aos outros.
Algo análogo se passa com os
personagens do filme de Chico
Teixeira. Alice, a mulher, parece não ter relações senão formais com Lindomar, marido e
chofer de táxi. O mesmo se pode dizer dos filhos do casal.
A única entidade aparentemente capaz de dar alguma
unidade aos lugares e pessoas é
d. Jacira, mãe de Alice. Não por
acaso, é em seu nome que se encontra a casa onde moram. É
ela quem se ocupa dos serviços
domésticos: cozinhar e lavar
são atividades que dão alguma
unidade à casa e às pessoas.
É Jacira, mais do que tudo,
que olha. Por sua idade, talvez,
ela já se encontra além dos dramas humanos. Os desentendimentos entre marido e mulher,
os problemas e oscilações da
adolescência e pós-adolescência vividos pelos rapazes: tudo
isso está além ou aquém dela.
Mas não de seu olhar. Ao
mesmo tempo em que olha, Jacira julga com severidade. É como se este mundo "de hoje" a
desgostasse profundamente.
A proposta original parece limitar-se à observação de uma
família paulistana razoavelmente disfuncional, sendo que
suas disfunções têm ligação direta com uma situação social
(pequena classe média). Se esta
foi de fato uma intenção, ela parece ter se perdido: a família
mostrada não tem nada de tão
específico. O fato de habitar em
um apartamento razoavelmente exíguo e ainda assim seus
membros permanecerem
alheios uns aos outros não caracteriza, afinal, uma situação
de classe. O fato de a observação ser fria (não é estranho que
venha de um documentarista)
não produz uma Alice mais verdadeira. Ela é sobretudo verossímil: uma dona-de-casa um
tanto frustrada, uma manicure
excitada, uma mãe razoavelmente ausente. Diga-se o mesmo de Lindomar, com suas cervejas, seu táxi, sua ninfeta.
O que é específico, de fato, o
que marca o filme, não é uma
classe social e menos ainda o
enredo que um comparsa com
razão define como "de novela".
O que marca "A Casa de Alice" é
o olhar moralizante de d. Jacira, como que a lamentação perpétua de um tempo em que ao
caos dos desejos sobrepunha-se alguma ordem (religiosa,
moral ou o que seja).
A CASA DE ALICE
Direção: Chico Teixeira
Produção: Brasil, 2007
Com: Carla Ribas, Zécarlos Machado
Onde: no Frei Caneca Unibanco Arteplex 8, Reserva Cultural e circuito
Avaliação: regular
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