São Paulo, terça-feira, 16 de janeiro de 2001

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CINEMA

Estréiam no mês que vem, em Dublin, 19 filmes de obras do irlandês

Teatro de Beckett é adaptado para a tela

JOSÉLIA AGUIAR
DE LONDRES

A obra teatral do escritor e dramaturgo irlandês Samuel Beckett acaba de ser adaptada para o cinema de uma só vez.
O Beckett Film Project conta com financiamento da rede estatal de TV irlandesa RTE, que investiu 4,5 milhões de libras (cerca de US$ 7 milhões). À empreitada associaram-se o Canal 4, do Reino Unido, a produtora irlandesa Blue Angel Films e o Gate Theater, de Dublin.
Sob o formato de um festival, a estréia dos filmes está prevista para o mês que vem, em Dublin, cidade onde Beckett nasceu em 1906. O festival chega a Londres em maio. Somente depois entrará em cartaz em Nova York. Ainda não foram divulgadas datas em que os filmes serão apresentados na televisão.
Quem conhece as peças de Beckett sabe que não são todas longas-metragens. São 19 filmes, um de apenas 45 segundos, a maioria de curta duração e apenas quatro com mais de uma hora, conduzidos por diretores como Neil Jordan, David Mamet, Anthony Minghella, Atom Egoyan e Patricia Rozema. No elenco, há desde estrelas de Hollywood, como a atriz Julianne Moore, até o diretor de teatro inglês Harold Pinter. Moore foi dirigida por Jordan em "Not 1", de 14 minutos. Pinter atua em "Catastrophe", de David Mamet, com 84 minutos.
Até então, uma das maiores dificuldades para adaptar o dramaturgo irlandês para o cinema era vencer a lendária resistência dos proprietários do seu espólio, principalmente do sobrinho, Edward Beckett. Anos atrás, uma montagem da peça "Footfalls", dirigida por Deborah Warner, teve de sair de cartaz após duas apresentações porque desobedecia às marcações prescritas pelo seu criador. Desta vez, o sobrinho não só permitiu a realização dos filmes como fez elogios aos que já assistiu.
À frente do projeto, está Michael Colgan, um devotado a Beckett de longa data, diretor artístico do Gate Theatre, em Dublin. Nos anos 90, Colgan já havia montado 19 peças de Beckett de uma só vez em três ocasiões diferentes -em Dublin (91), em Nova York (96) e em Londres (99).
A idéia de adaptar Beckett para o cinema surgiu nessa época, segundo Colgan. "Eu não poderia montar todas as 19 peças pelo mundo afora, seria como um circo", disse à Folha, por telefone, de sua sala no Gate Theatre.
Colgan afirma que o projeto atual permitirá, acima de tudo, que mais pessoas conheçam a obra do autor. "Sei que não são filmes para exibir no mesmo lugar que "Gladiador", por isso vamos tentar transformar sua apresentação em um momento de discutir a obra de Beckett."
Encontrar patrocínio para a empreitada não foi tão difícil quanto pode parecer. "Não se trata unicamente de um sem-número de filmes, mas da oportunidade única de adaptar para o cinema toda a produção teatral de um autor", avalia Colgan.
A principal -e inglória- tarefa de Michael Colgan foi disciplinar a criatividade dos realizadores a fim de que o resultado final fosse o mais fiel possível a Beckett. "Sem dúvida, foi uma experiência muito curiosa. Ter de dizer que uma frase não podia ser mudada ou que uma locação não poderia ser incluída, pois não foram previstas pelo autor", explica. Como lembra Colgan, os próprios diretores, no seu dia-a-dia, precisam limitar seus arroubos criativos na etapa de edição. Nesse projeto, o sofrimento deles, por assim dizer, teve de começar bem antes.
Apesar de todas as exigências, a adaptação das peças não será a pura e simples gravação de cenas de atores em cima de um palco. As filmagens foram feitas em estúdios e envolveram o uso de locações especiais.
Colgan explica que procurou reunir diretores que, de algum modo, estivessem relacionados ao teatro ou à obra do autor. Atom Egoyan é um antigo fã de Beckett e já confessou várias vezes que o autor irlandês foi uma das grandes influências para que se tornasse um escritor e diretor.
No caso de Anthony Minghella, a primeira peça que dirigiu foi do autor irlandês. Neil Jordan, por sua vez, trabalhou em "Esperando Godot" quando ainda era estudante.


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