São Paulo, domingo, 16 de janeiro de 2005

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Pais ignoram classificação indicativa de filmes e jogos e preferem fazer avaliação própria

Código desconhecido

Flavio Florido/Folha Imagem
Margarete Florio e as filhas Cristiane (à esq.) e Patricia (à dir.)


ISABELLE MOREIRA LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL

Já se foram os dias em que a entrada do cinema era o único lugar a exigir a carteira de identidade de seus espectadores. Hoje, DVDs, fitas VHS e até games trazem indicações de faixa etária em suas embalagens, e a televisão exibe, no cantinho da tela, para qual idade os programas são adequados. Apesar disso, na hora de alugar um filme para os filhos, pais preferem fazer sua própria classificação a consultar a informação presente na caixa.
Na casa da empresária Margarete Molnar Florio, 42, é assim que funciona. Na maioria das vezes, é ela quem pega filmes para a filha Patricia, 13, e, na hora de alugar, o que vale mais é a história. "Eu acho que não é a faixa etária do filme que importa, mas [a maneira] como eu crio minha filha, o que ela está acostumada a ver. Eu prefiro ler a sinopse e avaliar se vale a pena", diz ela, que também decidiu o que a filha mais velha, Cristiane, 20, podia assistir durante a adolescência.
O filme "Aos Treze", por exemplo, considerado inadequado para menores de 16 anos, foi considerado por Florio adequado para a filha. "O filme conta a história de uma menina de 13 anos que usa drogas. Eu deixei que ela assistisse, vi junto e achei interessante. Não adianta nada proibi-la se ela pode ver a mesma coisa na rua."
A mãe, no entanto, se queixa da programação da televisão. "A novela das sete tem cenas muito mais fortes que a das oito. A classificação, por mais que apareça lá, não adianta nada. Eu não tenho como tirar a minha filha da sala."
A advogada Fabiana Kadi, 38, mãe de Ricardo, 8, também assume o papel de "classificadora" em casa e se irrita um pouco com a televisão. Mesmo sem prestar atenção na classificação etária, Kadi diz que é rigorosa e barra quase tudo o que considera impróprio para o filho. "Quando ele vê alguma coisa que não devia, é escondido. Com a TV a cabo fica mais difícil de evitar que ele assista a filmes impróprios", explica.
De acordo com um estudo chefiado pela pesquisadora Kimberly Thompson, da Universidade Harvard, Kadi e Florio não estão equivocadas em não prestar atenção à indicação de idade. "Faixas etárias sozinhas não fornecem boas informações sobre a descrição de violência, sexo, profanação e outros assuntos (...). Pais devem reconhecer o papel da mídia como professores na vida dos filhos, prestar atenção às mensagens e conversar com eles para ajudá-los a fazer boas escolhas em suas vidas", diz o estudo.
Segundo o chefe do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação (DJCTQ) do Ministério da Justiça, José Eduardo Elias Romão, a classificação etária de filmes feita no Brasil já evoluiu de acordo com o que defende o estudo. "A classificação indicativa não se restringe mais apenas à informação sobre a idade. Já há descrições das cenas e inclusão de informações sobre assuntos polêmicos", explica, referindo-se à chamada "descrição temática de cenas inadequadas", obrigatória desde a portaria 1.597, de julho de 2004, que estabelece os critérios e procedimentos da classificação indicativa de filmes.
A mesma portaria também obriga lojas e locadoras a não permitirem que crianças e adolescentes com idade inferior à da classificação do filme ou do jogo adquiram o produto, a não ser que apresentem um formulário de autorização dos pais.
O gerente da locadora Premier Caio Galvão conta que viu o formulário uma única vez na vida. "Isso é raríssimo. Geralmente, quando o filho de um cliente não tem idade para ver o filme, nós barramos e avisamos o pai. Para que alguém retire o filme de uma faixa diferente, o responsável tem de ligar ou vir aqui", diz.
Galvão conta que alguns clientes se aborrecem com a barreira imposta aos filhos. "A nossa posição agrada a parte dos clientes, mas alguns não gostam. Acham que exercemos papel de censores, que deveria vir de casa."
O diretor-executivo de mercados da Blockbuster, Marcos Vignal, diz que na rede de lojas o procedimento comum é barrar a retirada do filme quando a classificação etária não corresponde à idade do cliente. O único problema, segundo Vignal, são os "adolescentes mais velhos". "A gente não pede documentos", diz.
Vignal afirma também que os funcionários não são instruídos a falar sobre a indicação etária dos filmes. "Não é argumento de venda, não temos esse princípio, mas é uma ferramenta que, dependendo da ocasião, deve ser levada em consideração", completa.
Jogos eletrônicos também cobram carteirinha. Segundo informa o site do Ministério da Justiça, entre outubro de 2002 e setembro de 2004, o DJCTQ analisou e classificou cerca de 2.100 jogos eletrônicos, que devem receber o mesmo tratamento de filmes.
Para o diretor da Abragames (Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos), Jeferson Valadares, no entanto, ainda falta "educação" sobre o gênero. "Os pais não estão preparados para julgar os jogos, pois nunca jogaram."
Valadares afirma concordar com a identificação etária de jogos, mas diz que o acompanhamento dos pais é necessário. "A classificação em si não resolve se o pai não toma controle da situação. Ele deveria ficar de olho nisso, da mesma maneira como faz com filmes de terror e com os violentos", completa.


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