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Troca troca na moda
São Paulo Fashion Week começa hoje, sob o impacto da aquisição de grifes por investidores; Alexandre Herchcovitch e Marcelo Sommer conversam sobre o novo momento da moda brasileira
Henrique Gendre/Folha Imagem
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Alexandre Herchcovitch veste look da grife Do Estilista, de Marcelo Sommer, e este veste modelo da marca Herchcovitch |
ALCINO LEITE NETO
EDITOR DE MODA
VIVIAN WHITEMAN
DA REPORTAGEM LOCAL
A moda brasileira vive um
momento histórico. Investidores começaram a adquirir no final do ano passado algumas das
principais grifes do país, a fim
de formarem grupos de gestão
de marcas, nos moldes dos que
existem na Europa e nos EUA.
Com isso, empresas de moda
que muitas vezes eram negócios quase familiares passaram
para as mãos de gestores profissionais, com objetivos capitalistas ambiciosos.
A temporada do inverno-2008 da São Paulo Fashion
Week, que começa hoje e vai
até a próxima segunda, acontece sob o impacto do novo poder
desses grupos recém-surgidos
e de suas aquisições bombásticas -como a da holding I'M
Identidade Moda, que comprou a Zoomp e arrematou neste mês as grifes Herchcovitch;
Alexandre e Fause Haten.
Para discutir a situação atual
da moda no país, a Folha convidou dois dos principais estilistas do país, Alexandre Herchcovitch e Marcelo Sommer. O
primeiro, após vender a sua
marca, agora exerce três funções na I'M: diretor de criação
da Herchcovitch; Alexandre e
da Zoomp e curador geral das
demais marcas da holding.
Sommer é dono da marca Do
Estilista e atua como diretor de
criação da Cavalera. Em 2004,
ele vendeu a grife Sommer para
o grupo catarinense AMC Têxtil, passou a atuar como diretor
criativo da marca, mas, após
uma série de mal-entendidos,
saiu da empresa em 2006.
Hoje, ele está impedido de
usar o nome Sommer em seus
produtos. "Foi muito ruim que
tivesse ocorrido esse problema,
mas, por outro lado, foi bom
para o aprendizado geral do
que não se deve fazer com uma
grife", afirma Herchcovitch.
FOLHA - A aquisição de grifes por
investidores é um bom negócio para
a moda brasileira?
MARCELO SOMMER - Esses grupos
que estão aparecendo agora,
como o da Cavalera e o que
comprou a Herchcovitch [I'M]
entendem melhor a função do
designer e a função da moda.
Não pensam a moda apenas como commoditie. Eu tive a experiência de vender a minha marca para uma tecelagem, não para um grupo financeiro. Quando vendi, entendi o seguinte:
"Olha, vamos comprar porque
essa marca é legal". Mas vi que
eles não sabiam muito bem do
que se tratava. Existem marcas
dentro desse mesmo grupo [a
AMC Têxtil] que já tinham uma
ferramenta de vendas, no caso,
o jeans e a camiseta. Não sou
contra, acho ótimo ter grifes assim. Só que eu penso que o meu
jeans e a minha camiseta não
precisavam ter a mesma cara
dos outros que o grupo produz.
ALEXANDRE HERCHCOVITCH - O que
está acontecendo, talvez até
tardiamente, é um processo de
amadurecimento. As aquisições e junções, tal como estão
sendo feitas agora, podem fortalecer as marcas. O segredo do
sucesso daqui para a frente é
respeitar a individualidade de
cada marca e não querer pasteurizar o que elas produzem.
O grupo X [ele não diz o nome
da AMC Têxtil] pasteurizou
muito as grifes que comprou.
Isso é um grande erro. Marcelo,
você acha que a marca Sommer
perdeu quantos clientes depois
que foi vendida?
SOMMER - Perdeu todos.
HERCHCOVITCH - Pois é, todos.
Hoje, quem quer aquela roupa
da Sommer que você fazia vai
procurar na loja Do Estilista
[nova marca de Marcelo Sommer]. Então, esse foi o grande
erro. Foi muito ruim que tivesse ocorrido esse problema,
mas, por outro lado, foi bom para o aprendizado geral do que
não se deve fazer com uma grife. É burrice jogar um balde de
areia e enterrar uma coisa que
demorou tanto tempo para ser
construída. O que interessa é
entender a marca que se está
comprando e fazer dinheiro
com a sua história.
FOLHA - O que um estilista deve fazer para, ao vender a sua marca, não
assistir à destruição dela?
HERCHCOVITCH - A primeira coisa a saber é que a marca não será mais sua. Então, se o grupo
decidir mudar o direcionamento do que você vinha fazendo,
não adianta chiar, porque você
já vendeu e colocou o dinheiro
no bolso. Acabou. Precisa ter
um desapego muito grande.
SOMMER - Exatamente isso.
Por mais que você coloque uma
cláusula no contrato dizendo
que todas as decisões de criação
vão passar por você, a marca
não é mais sua -e isso muda tudo. Então, uma dica é repensar
essa cláusula de modo que ela
possa garantir que o estilista
realmente tomará conta da grife até ela crescer e se desenvolver. É como se você desse um filho para a adoção, mas pudesse
ficar como babá dele por um
período determinado.
HERCHCOVITCH - Por outro lado,
a venda da marca também pode
propiciar ao estilista um grande sonho, que é se desvencilhar
da parte comercial e continuar
só como diretor de criação.
SOMMER - 10% do meu tempo
eu passo criando, e 90%, batalhando por dinheiro. Custa caro a criação, custa caro um desfile na São Paulo Fashion Week
-é um apartamento por edição! É preciso patrocínio. Mas
minha intuição é a de que os
grupos de investimentos no
Brasil, mesmo com toda a estrutura, ainda não têm essa
mentalidade de deixar esse
tempo livre só para a criação.
Acho que todos ainda terão
muito o que aprender.
HERCHCOVITCH - Sim, porque é
tudo muito novo ainda. Mas o
ponto forte é que a própria moda do país mostrou aos investidores que estava na hora de seguir por esse caminho dos grupos e das aquisições. Às vezes,
as pessoas menosprezam o momento atual da moda brasileira,
mas ele é muito importante comercialmente e também para o
entendimento do público. Está
acabando aquela coisa de que
moda é futilidade. Não é mais.
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