São Paulo, quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA

Filme de Michael Winterbottom, atração em Berlim, conta história real

"Road to Guantánamo" critica os EUA

FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

A crítica à política externa norte-americana definitivamente está marcando o Festival de Cinema de Berlim. Seu momento mais forte até agora ocorreu anteontem, com a exibição de "Road to Guantánamo" (estrada para Guantánamo), do diretor inglês Michael Winterbottom.
O público da sessão para a imprensa aplaudiu com entusiasmo o filme baseado na história verídica de quatro jovens muçulmanos que vivem em Tipton, Inglaterra. Na narrativa, dois deles são presos por mais de dois anos em Camp Delta, na base americana de Guantánamo, Cuba, acusados de pertencerem ao Taleban, a milícia radical islâmica que controlava o Afeganistão até ser deposta pelas tropas dos EUA.
Em setembro de 2001, Ruhal Ahmed, Asif Iqbal, Shafiq Rasul e Monir Ali partem para o Paquistão, onde Iqbal iria se casar. De lá, com um primo de Iqbal, seguem a Cabul, no Afeganistão, "para ver o que se passa e ajudar de alguma forma as pessoas", disse Ahmed, em Berlim.
Em plena guerra, os jovens perceberam que era melhor voltar ao Paquistão, comprando a viagem de retorno num microônibus. Entretanto, eles vão parar em Cunduz, um dos últimos territórios mantido pelo Taleban, e se perdem. Os rapazes conseguem voltar a Cunduz, mas a guerra já está no auge. Monir se perde e o trio é capturado pela Aliança do Norte, força afegã que atuou ao lado dos americanos para derrubar o Taleban, e levados para Guantánamo, onde são mantidos por mais de dois anos. Só foram liberados em março de 2004.
Os quatro eram acusados de envolvimento na gravação de um vídeo de Osama bin Laden, mas foram liberados ao provar que, na época da filmagem, Rasul trabalhava numa loja de fast food e os demais estavam em Tipton.
A saga é narrada no filme de forma dupla: pelos depoimentos dos rapazes e em assustadoras reconstituições. "Para transmitir a experiência deles, tínhamos que combinar ficção e realidade", disse Winterbottom. Na primeira cena de "Road...", George W. Bush afirma: "Em Guantánamo há apenas pessoas ruins presas, que não tem os mesmos valores que nós". O que se vê em seguida é a desmontagem dessa tese e a existência de um campo de prisioneiros mantido à base da violência.
"Com o filme, busco mostrar o que pessoas inocentes passaram e esse sistema perverso que viola os direitos humanos, em Guantánamo, onde ainda estão mantidas cerca de 500 pessoas", disse o diretor inglês, que assina a produção com Mat Whitecross.
O filme será exibido na televisão inglesa no próximo mês, já que foi financiado pelo Channel Four (o custo declarado da produção é de R$ 5,6 milhões), mas deve entrar no circuito de cinema mundial. Curiosamente, os rapazes retratados contaram que até participarem do filme nunca tinham ouvido falar de Winterbottom: "O que nós gostamos é de Hollywood", disse Rasul.

Brasileiros
Também anteontem foi a vez dos brasileiros, em Berlim. "Casa de Areia", de Andrucha Waddington, teve um início discreto: sessão para imprensa vazia, apenas 40 pessoas numa sala de 400 lugares, e uma pequena resenha nos jornais. Já a estréia do documentário "As Meninas", de Sandra Werneck e Gisela Camara, teve direito a sala lotada e tudo para agradar ao público estrangeiro: a história de quatro adolescentes, entre 13 e 16 anos, que engravidam e moram em favelas.


O jornalista Fabio Cypriano viajou a convite do evento


Texto Anterior: Mônica Bergamo
Próximo Texto: Panorâmica - Ópera: Tenor Antonio Lotti morre em São Paulo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.