São Paulo, quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

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CRÍTICA

De perto, eles são bem mais normais

DENISE MOTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

É como assistir a uma fita de casamento sem haver estado na festa, mas tendo ao lado alguém próximo o suficiente dos noivos para detalhar -sem envolvimento emocional- aquilo que não aparece na filmagem.
"A Volta do Poderoso Chefão", de Mike Winegardner, se ocupa da trajetória de Michael Corleone (interpretado nas telas por Al Pacino), filho que assume o controle do grupo mafioso após a morte de Don Vito Corleone, e que -como o espectador bem deve se lembrar- se revelaria muito mais implacável que o pai.
À semelhança do não-italiano Tom Hagen -o garoto adotado por Vito e transformado num intocado conselheiro (levado ao cinema por Robert Duvall)-, Winegardner é um americano descendente de irlandeses que só foi admitido na "famiglia" após haver superado idiossincráticas provas. O resultado é que, convidado a mergulhar nesse universo, mas sem nunca haver de fato pertencido a ele, o escritor consegue dar frescor aos Corleone.
Ao focar no período 1955-1962, portanto num antes-e-depois imediato aos ocorridos ilustrados em "O Poderoso Chefão 2" (1974), constrói uma teia menos de fatos do que de sentimentos. Os motivos para o inepto Fredo haver sido assassinado pelo próprio irmão não importam tanto quanto as frustrações acumuladas entre os dois. O filho de Michael, Anthony, deixa evidente o rechaço em relação ao pai não só por haver crescido longe de seus olhos, mas por saber a que ponto chega a crueldade daquele que todos reverenciam por medo. Além disso, em subtramas, personagens à primeira vista acessórios terminam por ser a causa das muitas desgraças vividas pela família, para além das óbvias rixas.
Winegardner conecta ainda os Corleone ao que acontecia à época nos EUA. Entre outros feitos, o grupo de Michael se infiltra na nova estrutura de poder que se ergue quando um descendente de irlandeses torna-se presidente e distribui favores a um cantor e ator popularíssimo, algumas das muitas piscadelas do escritor ao leitor, que identifica nessas passagens figuras como John Kennedy ou Frank Sinatra. Em outros momentos, Hitchcock cruza na rua com um dos homens de Michael, a mulher de Hagen apresenta Andy Warhol à elite de Las Vegas e Mae West comparece ao enterro de um líder do submundo.
Quando do anúncio do processo de seleção que deu origem a essa "Volta", seus promotores declararam ter como objetivo continuar a história "de modo divertido". Se foi essa a prova de fogo, como um "soldato" perspicaz Winegardner cumpriu a missão.


A Volta do Poderoso Chefão
   
Autor: Mark Winegardner
Editora: Record (588 págs.)
Quanto: R$ 62, em média



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