São Paulo, quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

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COMIDA

Sucesso do jovem chef francês Piège, discípulo de Alain Ducasse, reforça tendência de bons restaurantes dentro de hotéis

Hotel de estrelas

JOSIMAR MELO
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

Paris, vetusta e clássica, ao mesmo tempo se renova sempre -e na cozinha, onde reside uma de suas principais artes, isso não deixaria de acontecer. E entre suas novas estrelas está Jean-François Piège, que, aos 35 anos, vem passando por uma ascensão acelerada, desde que assumiu, em 2004, o restaurante Les Ambassadeurs, do luxuoso hotel de Crillon, e não parou de acumular estrelas e premiações. Nada mal para quem, até então, vivia à sombra de um mestre -ele era o chef de cozinha permanente do restaurante do estreladíssimo (e itinerante) chef Alain Ducasse, no hotel Plaza Athénée, em Paris.
Em poucos meses, Piège adquiriu duas estrelas do guia "Michelin" -algo significativo, pois o centenário guia costuma ser lento em consagrar novos nomes. O chef ganhou galardões também em outros guias e publicações ao mostrar seu trabalho-solo.
O fato de estar sendo tão incensado mostra que novos nomes não param de proliferar na cozinha francesa (que hoje enfrenta o prestígio ascendente de cozinhas concorrentes, como a espanhola); mas mostra também outro fenômeno: o peso crescente dos restaurantes de hotel no cenário gastronômico.
Se, no início do século 20, os hotéis sediaram grandes cozinhas na Europa, com o passar das décadas seus restaurantes tornaram-se burocráticos e antiquados, voltados para os hóspedes preguiçosos. Mas, no final do século, o alto custo da manutenção de restaurantes de luxo começou a ficar pesado demais para os chefs-proprietários. Para um grande hotel, que tem custos de ingredientes e equipamentos pulverizados entre vários restaurantes, bares e serviço de quarto, fica mais fácil conseguir melhores preços e mesmo abrir mão de ter lucro com seu restaurante principal, que serve como uma grife que vale a pena sustentar.
Na França, essa tendência desenhou-se nos anos 90: num período em que nenhum restaurante de hotel tinha três estrelas no "Michelin", eis que o Louis 15, restaurante do Hotel de Paris (em Mônaco), ganhou a cotação máxima, com a cozinha dirigida por Alain Ducasse.
Depois, ele ganharia igual cotação em Paris, em outro hotel, o Plaza Athénée, e, neste ano, mais três estrelas em Nova York, também num hotel, o Essex House. Na França e fora, outros hotéis começaram a se destacar -o único três estrelas de Roma, La Pergola (do chef Heinz Beck), fica no hotel Cavalieri Hilton; e, em Londres, o chef Gordon Ramsey, além da casa que leva seu nome, assina o restaurante do hotel Claridge.
Mas Jean-François Piège pensa diferente. "A grande cozinha não custa caro, basta ter ótimos ingredientes e chefs", disse ele à Folha, em Paris. Ele cita outros chefs emergentes que, como ele, praticam uma cozinha inovadora, mas não dentro de um hotel -caso de Pascal Barbot, do L'Astrance, que acaba de ganhar sua segunda estrela. Não é o caso de Piège, que decolou nos hotéis, com Ducasse: primeiro em Mônaco, em 1992, depois no Plaza Athénée, em 2000, e agora no Crillon.
Pode ser um acaso que ele esteja neste faustoso endereço da place de la Concorde, no edifício construído em 1758 por Luís 15, e onde pode servir iguarias como seu vaporoso blanc-manger com trufas, seu trio de delicadas variações em torno do presunto, suas penetrantes versões do timo de vitelo, seu refrescante doce de chocolate, banana e limão... De fato, o luxo que envolve a grande arte da cozinha não é fundamental, mas a tradição tem consagrado o ambiente, equipamento e serviço apoteóticos, o que é um problema real. E que grandes hotéis mostram poder enfrentar.


Josimar Melo viajou a Paris a convite da Air France e do hotel de Crillon


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