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Cinema - Crítica/"Cartas de Iwo Jima"
Filme encontra eco nos EUA de hoje
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
"A Conquista da Honra" e "Cartas de Iwo
Jima" são filmes
que se dispõem como espelhos
e refletem a Segunda Guerra a
partir de pontos de vista distintos. Estreado há algumas semanas, "A Conquista" aborda o
"lado americano", o que não
significa que o defenda. É dos
soldados, de sua experiência,
que trata o diretor Clint Eastwood, em um nível. E é da representação da guerra que se
ocupa o filme, num outro nível.
"Cartas de Iwo Jima", que
agora chega aos cinemas, aborda o "lado japonês", e novamente isso não quer dizer que o
defenda. Existe uma nítida diferença entre os dois filmes. O
primeiro parte do conhecimento que Clint tem de seu país.
"Cartas", ao contrário, é um
filme de prospecção. Como se a
pergunta a fazer fosse: que povo é esse que enfrentamos? Por
que o enfrentamos? Por que o
detestávamos? A resposta passa por uma reflexão sobre os
enfrentamentos atuais entre os
EUA e os povos islâmicos.
Mas a composição do filme
parte da pouca intimidade do
diretor com os costumes japoneses. Daí um trabalho mais
clintiano, em que a morte se
apresenta desde as primeiras
imagens, pela voz do padeiro
Saigo. Sua primeira carta escrita à mulher é como que uma
carta de além-túmulo, de alguém que já se vê morto.
Saigo tem como contraponto
o novo comandante das tropas
japonesas, o competentíssimo
general Kuribayashi. Este não
parece ser um militarista na
tradição nipônica. Tanto sabe
ser compassivo com os comandados como considera um erro
o atual enfrentamento.
Pacifismo
Kuribayashi também escreve
cartas e em certo momento
confessa não saber por que
aceitou esse comando que só
pode culminar com a própria
morte. No entanto, o general
não é um desses samurais que
consideram morrer a suprema
honra. Como um Miyamoto
Musashi, ele entende que o dever do guerreiro é viver para lutar. Ele não cultiva a morte
nem muito menos a deseja.
No entanto, ela o ronda, pois
é sob o signo da fatalidade que
se delineia este filme. Aquele
mar coberto de navios de guerra, que vimos em "A Conquista"
e que nos tranqüilizava quanto
ao resultado do combate, agora
parece uma maldição. Idem os
aviões que bombardeiam a ilha,
que os recrutas americanos
saudavam com tanta alegria e
que agora soam aterrorizantes.
O conjunto dos dois filmes é
evidentemente pacifista. O primeiro questionava a guerra a
partir de suas representações.
O segundo torna a guerra insuportável na medida em que nos
leva a conhecer intimamente
os japoneses. E, se conhecemos
o outro, se o admitimos como
um igual, já não temos forças
para exterminá-lo. Existem aí
ecos do atual enfrentamento
dos EUA com os povos islâmicos, sem dúvida. Não se trata,
no entanto, de atacar George
Bush. Clint Eastwood nunca foi
de chutar cachorro morto.
CARTAS DE IWO JIMA
Diretor: Clint Eastwood
Produção: EUA, 2006
Com: Ken Watanabe, Kazunari Ninomiya e Tsuyoshi Ihara
Quando: em cartaz nos cines Reserva Cultural, Unibanco Arteplex e circuito
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