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Cinema/estréias
Crítica/"Scoop - O Grande Furo"
Comédia transmite o prazer de Allen
Longa sobre jovem repórter que busca desvendar identidade de "serial killer" é simulacro de filme de investigação policial
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Woody Allen são pelo
menos dois. Existe
aquele cineasta grave, intelectual, que pode se inspirar em Dostoiévski ou Bergman e parece viver preocupado
com o lugar que a história do cinema lhe reservará.
E existe o Woody Allen que
não esquece sua origem de comediante e gosta de se divertir
enquanto filma. Este último
pode nos dar filmes irregulares,
é verdade, nem sempre memoráveis, mas que nunca se confundem com os vôos cegos tão
freqüentes na indústria do entretenimento.
Woody sabe o que faz quando
faz "Scoop - O Grande Furo",
por exemplo, em que uma estudante de jornalismo é freqüentada pelo espírito de um grande
repórter -já morto, evidentemente- que lhe dá pistas para
resolver um tenebroso caso de
"serial killer". Como estamos
na Inglaterra, trata-se de um
caso tipo Jack, o Estripador.
A jovem repórter é Scarlett
Johansson, e a primeira vez
que ela "recebe" o repórter ela
está na cabine em que um prestidigitador (Allen) executa seu
truque de desmaterialização.
Esse fato ligará os dois: a moça
fará do mágico seu acompanhante, protetor etc.
Convenções
Ocorre que, em meio à onda
de crimes, o finado repórter
aponta como criminoso (com
todo o conhecimento que se
pode adquirir no além sobre essas coisas) um rapaz belo e riquíssimo (Hugh Jackman), filho de um lorde, portanto,
membro da aristocracia.
A partir daí, estamos no território da investigação. E de seus
desastres. O primeiro e mais
definitivo vem do fato de a garota se apaixonar pelo belo
aristocrata. Mas, que importa
essa falha profissional? O que
Woody Allen parece nos dizer
ao longo de todo este filme (e
dos filmes como este que faz) é
que talvez não convenha levar
essas convenções tão a sério.
Ou seja, seu filme não é um
filme de investigação policial,
mas uma espécie de simulacro
consciente a nos lembrar que,
se não é possível chegar à verdade (artística ou criminal),
convém ao menos não fingir
que estamos chegando.
Nesse aspecto, o Woody
Allen desses "filminhos irresponsáveis" é mais grave e mais
interessante que o dos "grandes temas humanos".
E talvez não seja por acaso
que Woody Allen se permite,
no final, basear a resolução do
filme na mais completa inverossimilhança: temos a história
de um criminoso capaz de calcular tudo, com exceção do óbvio. Solução só aparentemente
tola, feita para chatear os "nossos amigos verossímeis", como
diria Hitchcock.
Pois uma solução que remonta a Fritz Lang, ao Lang de
"Suplício de uma Alma" -o filme mais inverossímil de todos
os tempos, mas também um
dos mais verdadeiros.
É claro que "Scoop" não é
memorável como "Suplício".
Mas é um filme que não finge
ser mais inteligente do que é, e
em que Woody Allen, sua equipe e atores parecem ter trabalhado com prazer que, afinal,
nos transmitem.
SCOOP - O GRANDE FURO
Direção: Woody Allen
Produção: Inglaterra/EUA, 2006
Com: Scarlett Johansson, Hugh Jackman e Woody Allen
Quando: em cartaz nos cines Metrô
Tatuapé, Reserva Cultural e circuito
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