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Crítica/"O Bom Pastor"
De Niro faz bom filme sobre origens da CIA
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
Homens de sobretudo
carregando pastas na
calada da noite, agentes duplos, encontros clandestinos, codinomes, ações de contra-espionagem, vazamentos
de informação, mensagens em
código, traições, erros de avaliação, vidas sacrificadas em
nome de acertos de contas.
"O Bom Pastor" reúne tudo
isso, como um pequeno compêndio (se "pequeno" for adequado para um filme de quase
três horas) sobre a mitologia da
espionagem no cinema.
Qual espionagem? A altamente profissional, patrocinada pelo Estado, com fins supostamente nobres (a defesa dos
interesses nacionais) a justificar meios duvidosos, quando
não criminosos.
Matt Damon como protagonista talvez sugira algo na linha
da série inaugurada com "A
Identidade Bourne" (2002),
mas navega-se aqui por outros
mares, também revoltos: a formação da CIA, a agência de inteligência dos EUA.
Dois tempos
A trama desdobra-se em dois
tempos, ambos relacionados a
Edward Wilson (Damon).
Quando o conhecemos, em
abril de 1961, ele tem a aparência burocrática de um funcionário público de carreira em
Washington. Sua rotina resume-se a ir de casa para o escritório e vice-versa. De ônibus.
O local de trabalho fica, simbolicamente, no subsolo de um
prédio, nas entranhas do poder.
O clima por ali está agitado graças à malograda tentativa de invasão de Cuba pelos EUA. O
inexpressivo Wilson trabalha
na CIA, mas não se sabe direito
se apenas para a CIA.
Enquanto cresce a tensão
nos bastidores da crise, visitamos a juventude do personagem, a partir de 1939, quando
estudava em Yale e foi convidado a participar de uma irmandade bem seletiva.
As idas e vindas no tempo
apresentam as circunstâncias
de criação da CIA, mas se dedicam também à investigação da
personalidade de Wilson, alma
solitária, torturada pela perda
de identidade e privacidade que
as suas "irmandades" procuram lhe impor.
Em seu segundo longa como
diretor, Robert De Niro (que
faz breves aparições, como um
militar da comunidade norte-americana de informações) parece tão interessado pelo que se
passa dentro de Wilson quanto
pelo menino sob fogo cruzado
de "Desafio no Bronx" (1993).
"O Bom Pastor" desenha seu
protagonista como rapaz arguto que, definido em parte por
uma lembrança terrível da infância, teria provavelmente sido mais feliz como professor de
poesia e marido de uma estudante surda, mas terminou casado com uma deusa (Angelina
Jolie) a quem não dá atenção
porque sua amante é a CIA.
Experiente na costura de ficção com eventos e personagens
verídicos, o roteirista Eric Roth
-que ganhou o Oscar com
"Forrest Gump" (1994) e escreveu "O Informante" (1999),
"Ali" (2001) e "Munique"
(2005)- faz parecer que tudo,
em Wilson e na CIA do filme, é
"inspirado em fatos reais", mas
sua história sugere que preferiu
flertar com um cruzamento entre os espiões do escritor inglês
Graham Greene e os de Hollywood.
O BOM PASTOR
Direção: Robert De Niro
Produção: EUA, 2006
Com: Matt Damon, Angelina Jolie, William Hurt e Alec Baldwin
Quando: em cartaz nos cines Jardim Sul, Unibanco Arteplex e circuito
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