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"O PRISIONEIRO DA GRADE DE FERRO"
Produção sobre a vida no Carandiru, extinto em 2002, começou como curso de vídeo
Documentário traz memórias do cárcere
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
"Curso de Vídeo." Isso e apenas
isso era o que informava o anúncio feito no presídio no Carandiru, hoje extinto, onde viviam
7.000 detentos em 2001. Cem homens se matricularam, nos primeiros 60 minutos de inscrição.
Nenhum dos futuros alunos sabia que as aulas seriam oferecidas
pelo cineasta Paulo Sacramento e
que o plano final do diretor era
produzir um documentário -"O
Prisioneiro da Grade de Ferro",
que estréia hoje no Rio e em São
Paulo- sobre a rotina na maior
prisão da América Latina.
Sacramento diz que não revelou
a intenção desde o início porque
não tinha "absoluta convicção"
de que conseguiria realizar o filme. "E, na prisão, você deve cumprir o que promete", afirma.
Faltavam ao projeto do longa a
garantia de recursos financeiros e
a conquista da confiança dos presos e da administração penitenciária.
Escolta
O curso foi realizado em janeiro
de 2001, proporcionando aos alunos alguma prática no manejo de
câmeras digitais e noções de técnica cinematográfica.
Terminadas as aulas, Sacramento e sua equipe continuaram
freqüentando o Carandiru (e gravando imagens) durante mais seis
meses. "Quando percebemos, estávamos há tempos andando por
lá sem escolta", diz o diretor.
A convivência no Carandiru foi
pontuada por aprendizados mútuos, desde o contato inicial. A
avalanche de inscrições é fruto
"da demanda pelo quer que seja
de atividade dentro da cadeia",
diz Sacramento. "Poderia ser um
curso de marchetaria que aconteceria o mesmo."
Lição número dois aprendida
pelo diretor: "A informação não
chegava aos pavilhões 8 e 9". Entre os cem inscritos ao curso, não
havia nenhum morador desses
dois pavilhões.
Para Sacramento, era indispensável ter entre os alunos (e futuros
co-autores de seu documentário)
representantes de todas as áreas
do presídio e sujeitos de trajetórias diversas na carceragem
-"Gente que acabou de ingressar e que estava lá há tempos; gente com passagens por outras unidades e com histórico de retornos
ao Carandiru; gente jovem e gente
velha".
Por esses critérios, foram selecionados os 20 participantes, alguns requisitados afora os inscritos, em expedições do cineasta
por todo o complexo Carandiru.
Debate
Parte das cenas de "O Prisioneiro da Grade de Ferro" tem um detento por trás da câmera. Sacramento preferiu não explicitar no
filme a autoria das imagens, exceto na passagem "A Noite de um
Detento". A dúvida do espectador
sobre quem está no comando da
câmera objetiva ressaltar o modo
coletivo de produção do documentário. As gravações eram
sempre objeto de discussão, decidindo-se pelo debate que aspectos
da prisão deveriam ser filmados.
Os detentos não participaram
da montagem, que reduziu a 2h03
as quase 170 horas de material
gravado. "Se todos fossem participar, não seria uma montagem,
mas um assembleísmo. Estaríamos lá até hoje, montando ou discutindo o filme", diz Sacramento.
O diretor deve depositar na Cinemateca Brasileira o material
bruto de "O Prisioneiro da Grade
de Ferro" e deixá-lo disponível
para que outro cineasta monte
um novo documentário com as
mesmas fitas gravadas. "O que eu
tinha para dizer está dito no meu
filme. Não tenho vontade de retrabalhar esse material", afirma.
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