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Atrizes citam Silvio de Abreu
como motivo para retorno à TV
Yáconis diz que há menos riscos com o autor, e Montenegro vê novelista como sinônimo de qualidade
"Fazer coisa ruim é triste (...)
Faço muito pouco e vejo
menos [TV] ainda", diz Cleyde
Yáconis, que considera
divertido fazer novela agora
AUDREY FURLANETO
DA SUCURSAL DO RIO
Na tarde de uma terça-feira,
ela surge em um camarim da
novela "Passione" de peruca
branca cacheada e expressão
austera. "Sejamos rápidas", diz
à repórter. "Não explique nada,
apenas faça as perguntas."
Enquanto o cabeleireiro remove a peruca, Cleyde Yáconis,
87, diz que "envelhecer é viver".
"Outro dia estava no estacionamento de um shopping com
a irmã, procurando uma vaga
-sim, eu guio-, quando ela
apontou: "Olha aí uma vaga".
"Não, essa aí é para idoso", eu
respondi."
A atriz cai na risada. "Não é
maravilhoso? Eu ria tanto! Sou
eu! Estou viva! É a prova de que
estou bem. Por enquanto, não
há nada que a idade me impeça
de fazer", afirma.
Apesar da vitalidade, Cleyde
sente algumas mudanças:
"Parece que meu tempo mudou. Faço as mesmas coisas,
mas talvez demore mais um
pouco. É nisso que eu sinto
mais a quarta idade, porque já
não é a terceira. Estou com 87!
Tem problemas, mas é preciso
bom humor".
Em parte, é a vontade de
manter o bom humor que leva
Cleyde de volta à televisão.
Também foi fundamental o fato de o convite vir para uma trama de Silvio de Abreu, com
quem, diz ela, "corre-se menos
riscos de equívocos".
"Fazer coisa ruim é triste." E
a televisão anda muito ruim?
"Nem me pergunte. Faço muito
pouco e vejo menos ainda."
Se faz novela agora é porque
"é divertido": "Quando você
usa a TV, é bom. Sempre tem
um aprendizado. Por exemplo,
estou contracenando com a
Fernanda. É uma oportunidade
que não se perde, além de ser
gostoso reencontrar a amiga".
O tempo sem angústia
Cleyde diz não se lembrar de
ter dividido com Fernanda
Montenegro alguns dos teleteatros dirigidos por Antunes
Filho. Seu vasto currículo permite a confusão: a atriz, irmã de
Cacilda Becker, fez 90 peças.
"O teatro é a síntese da humanidade, reflete o que acontece no mundo: as evoluções, a
moral, a ética, a política cultural, tudo isso. É um templo sagrado e, se para, é porque o
mundo parou", diz.
E é por tê-lo como espaço sagrado que a atriz se diz "muito
magoada" com a situação atual
das artes cênicas.
"Quando eu comecei, fazíamos dez sessões por semana.
Hoje são dez sessões por mês",
lamenta ela, que, como Fernanda, não vê com bons olhos a dependência das leis de incentivo.
"Politicamente, tem essa esmola, com chapéu na mão...
Quando produzi, fiz com meu
dinheiro. Foram oito espetáculos. Parei porque não quero
enlouquecer." E reclama da ausência de plateia: "A evasão do
público é uma tristeza".
Mas nem isso, diz a atriz, é
motivo de angústia. Cleyde não
teve filhos, nem pensou em tê-los quando esteve casada com
Stênio Garcia (por 11 anos).
"Não os teria apenas para satisfazer a ideia de que a mulher
deve procriar". Vive com a "irmã Preta", que cuidou dos filhos e netos de Cacilda Becker.
"Ela agora é minha babá!", diz.
Outra companhia são as duas
cadelas na chácara onde vive, a
30 km de São Paulo.
"Não posso ter angústia. Alguém pode ter ansiedade com
200 roseiras? Alguém pode sofrer com árvore, passarinho, cachorro? Tenho árvore e animal,
o suficiente para não ter angústia."
(AUDREY FURLANETO)
"Desde que você não entregue a alma [à TV] (...), é uma expressão de cultura industrializada e eletrônica", diz Fernanda Montenegro
DA SUCURSAL DO RIO
Ela surge pontual, às 22h, no
hotel vizinho à sua casa, em
Ipanema, zona sul do Rio. Elegante, ajeita o lenço no pescoço
e diz em tom grave: "Meus
amores, me desculpem a hora.
Estou gravando desde cedo".
Pouco depois, Fernanda
Montenegro volta a falar da
aflição com as horas que passam: "Os tempos mudaram.
Tudo ficou sem tempo".
Ela tem 80 anos, mas quando
a repórter lhe pergunta o que é
envelhecer, faz uma pausa, olha
para as mãos no colo:
"Não sei, não sei. Há dias em
que estou muito velha. Há dias
em que estou uma adolescente.
Há dias em que os pés doem, os
artelhos doem muito".
"É claro que tenho que usar
óculos nessa idade, mas tem
muita gente moça que usa, não
tem? Talvez eu esteja, não sei,
parece que não, perdendo a audição perfeita. Mas tem gente
moça que não ouve bem."
Continua: "Há uma gama de
falências na dita velhice que tem
gente que não é velha e tem. Por
enquanto, me sinto inteira".
Fernanda começa a gravar a
novela "Passione", de Silvio de
Abreu, de manhã e conclui as cenas à noite. "Quero que você escreva isso: a televisão é uma indústria pesada", diz, enfática.
"Ela tem importância no setor
produtivo do país. Com seu melhor e com seu pior. É um mercado violento. E, desde que você
não entregue a alma, que entregue seu trabalho com qualidade,
é uma expressão de cultura industrializada e eletrônica."
Fernanda estava distante das
novelas desde "Belíssima" (05),
também de Silvio de Abreu, novelista que considera autor de
qualidade, ao lado de Gilberto
Braga, Benedito Rui Barbosa,
Manoel Carlos, Aguinaldo Silva e
João Emanuel Carneiro.
Fora desta lista e de minisséries como "Hoje é Dia de Maria"
e "Agosto", diz que "há uma crise
de dramaturgia na televisão".
"Tem muito lixo."
Sem tempos mortos
Quando os tempos eram outros, Fernanda passava períodos só na TV -como de 1951 a
1953. Só depois, relembra, fez
teatro. A diferença, explica, é
que naquela época encenavam-se peças inteiras na TV. "Foram
mais de 400 teleteatros", diz.
Não há, no entanto, algo que
ela chama de "como era verde
meu vale" no discurso. "A dinâmica de hoje requer rapidez.
Não acho que seja bom, mas é o
que é. São os tempos do não
pensar, só executar. O teatro é
um artesanato muito caro."
"Não pode ser enlatado, não é
um produto que você compra e
põe para funcionar a hora que
quiser, como um DVD. Houve
uma mudança na inquietação
cultural do país. O teatro foi se
afunilando ficando totalmente
dependente do erário público."
Viúva há um ano e oito meses
-seu marido, o ator e diretor
Fernando Torres, morreu em
2008-, a atriz discorre sobre a
solidão: "Às vezes ela invade
violentamente a gente. E às vezes, não sei onde ela está".
Fala também sobre o amor:
"Não sei defini-lo, me sinto
constrangida. É tão importante
o amor que é melhor não definir, entende?"- e pede à repórter para voltar ao outro tema.
"A tragédia é quando se morre jovem. Você paga um preço
para viver que é ficar velho", diz
Fernanda.
"É melhor ficar velho e ir tocando, como se a velhice não
existisse. Não é ignorá-la. É encará-la, respeitá-la e não denegri-la. [Leva as mãos ao rosto]
Ah! Que loucura é a vida", e ri.
(AF)
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