|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Abaixo-assinado reúne 25 mil contra projeto
DA REPORTAGEM LOCAL
O projeto que altera a Lei
Rouanet para nela incluir explicitamente como beneficiários os templos religiosos tem
provocado reações adversas e
ataques dos meios culturais e
de fora deles, que consideram a
proposta uma distorção dos objetivos da lei.
Além de manifestações de
produtores, escritores e cineastas, um abaixo-assinado já reuniu na internet mais de 25 mil
assinaturas de pessoas contrárias à proposta do senador
Marcelo Crivella (PRB-RJ).
Cesar Oliveira, 54, organizador da petição virtual, diz que
entregará a lista completa ao
deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ) depois de amanhã, segunda-feira. Por que
ele? "Tenho o hábito de encher
o saco daqueles em que voto",
ele diz. "Eu pago meus impostos, acho que posso reclamar."
Oliveira registrou o abaixo-assinado em um site de petições virtuais e encaminhou e-mails para amigos (que deviam
fazer o mesmo com seus conhecidos, e assim por diante). Nessas mensagens, recebiam um
link para o texto no www.petitiononline.com. Preenchiam
um cadastro e acrescentavam
seu nome ao documento.
Separação igreja-Estado
Entre os nomes está o do escritor Milton Hatoum, que diz
considerar a proposta de Crivella "um absurdo". Defendendo
que o imposto repassado pela
Lei Rouanet para o Programa
Nacional de Apoio à Cultura
(Pronac) deve ser destinado exclusivamente para atividades
artísticas, Hatoum afirma que
"usar uma parte do Imposto de
Renda de empresas em templos religiosos é uma afronta à
Constituição".
Crítica semelhante é feita pelo cineasta Cacá Diegues, também contrário ao uso de dinheiro público para atividades
religiosas. "Acho que não é uma
iniciativa democrática porque
o Estado brasileiro é laico e não
pode se meter em religião, seja
de qual natureza for. Não tenho
nada contra igreja nenhuma.
Mas sou absolutamente contra", ele diz.
Gilberto Belleza, presidente
do Instituto de Arquitetos do
Brasil, e o cineasta André
Sturm fazem crítica semelhante à afirmação do senador Crivella de que o projeto busca
proteger igrejas "centenárias" e
que ele não quer templos caindo na cabeça dos fiéis.
"A manutenção de igrejas
centenárias já é possível. A lei
permite, dentro de uma classe
de edifícios tombados", diz
Belleza. "Se a igreja centenária
ou bicentenária for patrimônio
histórico, a Lei Rouanet permite [seu uso para restauração]",
afirma Sturm. Ambos não
vêem, portanto, razão para que
essa característica da lei seja
"explicitada" por novo projeto.
"Isso é uma loucura total,
uma coisa estapafúrdia. A lei
não é para isso. Ela foi criada
para incentivar a cultura", diz
Paulo Thiago, presidente do Sicav-RJ (Sindicato Interestadual do Audiovisual).
Também ressaltando a função específica da lei -estimular
projetos artísticos-, Luiz Fernando Benedini, diretor-executivo da Orquestra Sinfônica
Brasileira, diz que o projeto de
Crivella repete o pleito que veio
a dar na Lei do Esporte.
A demanda inicial de esportistas era que o setor pudesse
participar dos recursos da Lei
Rouanet. Após disputa com representantes da cultura, o governo federal terminou criando
uma outra fatia de isenção fiscal para a área, que não concorreria com a porcentagem prevista para a cultura.
"Toda vez que você tenta
usar para outros fins, você restringe os recursos que o legislador havia destinado especificamente para a cultura", ele diz.
"A cultura é setor estratégico
e a todo momento alguém tenta
entrar numa conquista que é
sua", afirma Eduardo Barata,
presidente da Associação dos
Produtores de Teatro do Rio de
Janeiro. "É um absurdo do
ponto de vista de mercado. As
igrejas têm como se sustentar,
enquanto o cinema e o teatro
são atividades de mendicância", faz coro o cineasta Domingos de Oliveira.
(EDUARDO SIMÕES E RAFAEL CARIELLO)
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Frase Índice
|