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DVD/LANÇAMENTO
Pacote com três filmes traz o cinema desigual da Vera Cruz, incluindo o abolicionista "Sinhá Moça"
O "studio system" de SP chega ao digital
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
A produção da Companhia
Cinematográfica Vera Cruz,
grande estúdio que teve curta
existência (1949-54), muitas vezes
é descartada em bloco com uma
única frase: "A ilusão da burguesia paulista de fazer um cinema
industrial".
Estigmatizada pelo cinema de
"uma câmera na mão e uma idéia
na cabeça", a filmografia da Vera
Cruz ganhou uma aura de coisa
velha, pesada, demodê.
A "Coleção Vera Cruz", em
DVD, vem mostrar que esse clichê tem um forte fundo de verdade, mas que sob ele se escondem
algumas virtudes e belezas importantes. O primeiro volume da coleção traz três filmes célebres e desiguais: "Tico-Tico no Fubá" (52,
de Adolfo Celi), "Sinhá Moça"
(53; Tom Payne), e "Uma Pulga
na Balança" (53; Luciano Salce).
O primeiro é a biografia romanceada do compositor Zequinha de
Abreu, o segundo é um drama
abolicionista. O único filme de temática contemporânea é a comédia de costumes "Uma Pulga...".
Como grande parte da produção da Vera Cruz, os três foram
dirigidos por companheiros que
vieram trabalhar na cia.: os italianos Celi e Salce e o argentino de
origem galesa Payne. O festival de
nomes estrangeiros é revelador de
um dos grandes méritos do estúdio: o de trazer ao país técnicos de
primeira linha, como o diretor de
fotografia inglês Chick Fowle (em
"Tico-Tico") e o montador austríaco Oswald Hafenrichter (nos
três filmes).
O grande aparato de produção
da Vera Cruz pesa de maneira diferente sobre as três obras.
"Sinhá Moça", apesar de ser
produção de época, misto de épico e melodrama, e de se ressentir
da artificialidade dos diálogos,
continua vivo por conta do dinamismo da montagem, da iluminação e dos movimentos de câmera. A seqüência final, espécie
de Carnaval à luz de archotes pela
libertação dos escravos, mantém
seu impacto dramático e visual.
"Tico-Tico", ao contrário, parece ser um filme que já nasceu velho. Um roteiro moralista e piegas
encontra em Adolfo Celi (grande
ator em sua carreira italiana) um
diretor quadrado, sem inspiração.
Nessa história do compositor de
província (Anselmo Duarte) que
hesita entre a vidinha doméstica e
a aventura de desbravar o grande
mundo, a personagem mais interessante é o da moça do circo vivida por Tônia Carreiro.
Já "Uma Pulga da Balança" oscila de modo nem sempre feliz entre a comédia, o policial e o melodrama ao contar a história de um
espertalhão que aplica grandes
golpes a partir de sua cela no presídio. O humor envelheceu, mas o
filme vale pelo menos por duas
coisas: pelas imagens da São Paulo do início dos anos 50 e pelo
elenco de iniciantes, como o grande ator Paulo Autran e o canastrão John Herbert.
Uma última observação sobre
as condições dos DVDs: em "Tico-Tico" e "Sinhá Moça" a imagem está ótima, mas o som deixa
muito a desejar. Em "Uma Pulga
na Balança" ocorre o oposto. E os
"extras" são de uma pobreza franciscana: resumem-se a fotos.
Coleção Vera Cruz Vol. 1
Lançamento: Cinemagia
Quanto: R$ 115, em média
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