São Paulo, sábado, 16 de agosto de 2008

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Crítica/"Jornalismo e Política Democrática no Brasil"

Estudo associa imprensa ao vigor das instituições democráticas

Doutora em mídia, a jornalista Carolina Matos analisa coberturas de eleições no Brasil

OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os jornais brasileiros passam com alguma folga pelo crivo de Carolina Matos, autora do livro "Jornalismo e Política Democrática no Brasil". A publicação, baseada em tese acadêmica, conclui que "a grande imprensa comercial contribuiu para o avanço da democracia nas últimas duas décadas". A jornalista, doutora em mídia pelo Goldsmith College, da Universidade de Londres, elegeu quatro coberturas para a sua análise: a campanha das Diretas-Já em 1984 e as eleições de 1989 (com o subseqüente impeachment de Fernando Collor de Mello), 1994 e 2002. O que emerge desse retrospecto, na avaliação de Carolina Matos, é a evolução qualitativa da imprensa escrita, que foi sucessivamente militante, partidária e denuncista, antes de optar pelo caminho da maior objetividade possível. O trabalho identifica diferenças de atitude entre os veículos de comunicação, mas nada que comprometa a conclusão geral. É, assim, um contraponto relevante à crítica de que os jornais, movidos apenas por interesse comercial, são meros reprodutores da ideologia dominante, comportando-se como porta-vozes de uma elite unificada.

Sem radicalismo
O livro se beneficia da posição em que se coloca a autora. Ela foge das armadilhas do pessimismo radical, em que caem os nostálgicos da imprensa de resistência à ditadura, e do otimismo ingênuo, em que ficam presos os que incensam o marketing como salvação da mídia. Ao evitar os extremos, porém, a autora não opta pela confortavelmente morna eqüidistância. Ao contrário, compra briga. Os críticos radicais são considerados por ela "simplistas" por não admitirem que a imprensa comercial tem fiscalizado o poder e funcionado como mediadora do debate público. Quanto ao mercado, ela argumenta, foi o que pavimentou o caminho para a mídia investir em reportagens investigativas, aumentar o profissionalismo e melhorar a cobertura política. Sem independência financeira, nada disso seria possível. Em defesa de sua tese, a autora propõe a atualidade do comentário do filósofo alemão Jürgen Habermas, que, referindo-se à Europa do século 19, liberou a imprensa para assumir a "lógica do lucro", uma vez alcançada a legitimidade da esfera política pública. Há ainda o endosso da perspectiva do australiano John Keane, estudioso das relações entre imprensa e democracia, sobre o papel do mercado: "Onde não há mercados, a sociedade civil não consegue sobreviver. Onde não há sociedade civil, não pode haver mercados". Os jornais teriam, então, importado o modelo americano? Não totalmente, acredita a autora. A imprensa ainda reflete simpatias e antipatias pelo PSDB e pelo PT, conforme o caso, revelando aí um elemento do jornalismo europeu, mais inclinado ao partidarismo. A obra ganharia em fluência com uma adaptação que atenuasse a formalidade típica de uma tese. Ainda assim, pode ser lida com igual proveito por profissionais e leigos.

OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor de "A História do Brasil no Século 20" (em cinco volumes, pela Publifolha)

JORNALISMO E POLÍTICA DEMOCRÁTICA NO BRASIL
Autora: Carolina Matos
Editora: Publifolha
Quanto: R$ 49,90 (384 págs.)
Avaliação: bom



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