|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SHOW/CRÍTICA
Marina encena sua depressão
CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Chega a ser tocante o retorno
oficial de Marina Lima aos
palcos, após um afastamento de
mais de seis anos. O show "Síssi
na Sua", que a cantora e compositora carioca apresenta até o dia 1º
de outubro no DirecTV Music
Hall, em São Paulo, não evita
abordar o assunto: ao contrário,
leva a delicada razão de seu sumiço para o centro do palco.
Com uma dose de humor negro, Marina representa o processo
depressivo que chegou a prejudicar sua voz: canta "Nem Luxo,
Nem Lixo" (de Rita Lee e Roberto
de Carvalho), dançando, enrolada
numa inusitada camisa-de-força.
Na platéia da noite de estréia, anteontem, poucos sorriram diante
de uma imagem tão forte e reveladora.
Esse é apenas um dos vários recursos cênicos utilizados no espetáculo (mais que um show musical), bem dirigido pelo ator e encenador Enrique Diaz. A iluminação de Maneco Quinderé e o cenário de Gualter Pupo e Beli
Araújo, que inclui dois telões para
projeções de filmes e slides, são
assumidamente teatrais.
Em outro momento, logo depois de cantar a sensível "Irremediáveis Mortais" (parceria com o
violonista Giovanni Bizzotto),
Marina sai de cena, enquanto a
banda segue tocando. Troca de
roupa e reaparece pouco depois,
na janela de um pequeno cenário
adjacente, como personagem de
uma cena sensual e sem palavras.
Mais uma vez, ela encena a depressão.
A beleza estranha dessas imagens reforça, no entanto, uma
ambiguidade. O tom sombrio que
marca praticamente todo o espetáculo não se afina com a excitação de Marina, em sua volta ao
contato direto com o público.
Uma alegria que ela expressa em
vários agradecimentos e declarações de amor a São Paulo.
Para essa contradição entre o
discurso feliz de Marina e o que se
vê e ouve no palco também contribuem o repertório e os arranjos. Centrado nos dois últimos álbuns da cantora ("Registros à
Meia-Voz" e "Pierrot do Brasil"),
o roteiro reúne muitas canções
tristes e doloridas, como "Pierrot", "Na Minha Mão" (parceria
com Alvin L.), "Deixe Estar" e "O
Solo da Paixão" (parcerias com o
irmão Antonio Cícero), ou ainda
a pungente versão de "Para um
Amor no Recife" (de Paulinho da
Viola).
E mesmo quando Marina vai
buscar em seu passado canções
mais ensolaradas e dançantes, como "Fullgás", "Pra Começar"
(outra com Cícero) e "À Francesa" (de Cláudio Zoli, já no bis), os
arranjos sombrios e excessivamente eletrônicos parecem esfriar
o apelo original das músicas.
Seria muito mais fácil, certamente, voltar aos palcos com uma
seleção dos maiores sucessos de
seus 21 anos de carreira. Mas a corajosa Marina prefere arriscar,
mostrando que não parou no
tempo. Revela à platéia toda a dor
do afastamento, para talvez sublimar o que passou.
Síssi na Sua
Quando: hoje, às 22h; amanhã, às 19h;
qui., às 21h30; sex., às 22h. Até 1º/10
Onde: DirecTV Music Hall (av. dos
Jamaris, 213, Moema, São Paulo, tel. 0/
xx/11/5643-2500)
Quanto: de R$ 40 a R$ 90 (qui. e dom.);
de R$ 50 a R$ 100 (sex. e sáb.)
Texto Anterior: "Olhares em Trabalho" é exibido hoje Próximo Texto: Festival encerra hoje disputa entre novos e veteranos Índice
|