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Festival Cultura termina com vaias
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A voz do povo é a voz de Deus.
Mas não é a voz do júri do "Festival Cultura - A Nova Música do
Brasil". Foi histórica a vaia que o
público ofereceu aos vencedores
na entrega do prêmio na final do
festival, no começo da madrugada de ontem e que tinha ingressos
esgotados havia uma semana.
Finalmente, o festival se elevava
acima da mediocridade. Não por
si, que se manteve careta até o final, mas pelo público, que instintivamente exigia um pouco mais
de leveza, descontração e emoção
(e qualidade!) naquele ambiente
de seriedade e falsa "boa música".
"Contabilidade" era uma música chata, com letra chata, que citava "a alta do preço do preservativo de baixa qualidade". "Achou"
é bonita, inteligente, emocionante. A segunda foi a favorita do público. A primeira ganhou o festival. No momento da premiação, o
público fez questão de deixar ruidosamente clara sua opinião.
O ministro da Cultura, Gilberto
Gil, escalado para entregar o prêmio (uma plaqueta simbólica, R$
50 mil, na realidade) para os escolhidos, acabou também vaiado no
palco por tabela. Ele ainda tentou
demover o público da vaia e pedir
a palavra repetidas vezes ("OK,
está registrada a vaia, mas deixa
eu falar?"), ao que foi ignorado solenemente pelo teatro lotado, que
não parou com a balbúrdia até
que ele saísse do palco e os vencedores desistissem de fazer seu discurso de agradecimento.
O público ainda permaneceu no
local jogando bolas de papel no
palco e passou longos minutos fazendo questão de vaiar os vencedores contestados, impedindo a
audição de boa parte da apresentação bisada da vencedora.
Danilo Moraes Doratiotto (filho
de um dos apresentadores do festival, Wandi Doratiotto) e Ricardo Teperman, autores e intérpretes da canção vencedora, se mostravam constrangidos, mas tentavam manter a dignidade se concentrando num pequeno grupo
de fãs que se juntou na frente do
palco para apoiá-los.
Parte do teatro tentou ensaiar
um coro reafirmando o favoritismo de "Achou", canção de Dante
Ozzetti e Luiz Tatit, que havia sido
cantada brilhantemente por Ceumar, mas foram desencorajados
pelo próprio festival.
Enquanto por um lado a estudante de história Samira Bandeira
abordava a reportagem da Folha
("Você vai escrever que foi marmelada? Pode escrever!"), por outro o vencedor popular Luiz Tatit,
após a entrega dos prêmios, em
conversa informal, matava a charada: "Achei que a música vencedora é muito boa, merecia estar
entre as três primeiras. Mas talvez, se a seleção fosse a mesma e a
colocação outra, teria sido mais
compatível com o público. Imagino que na conversa do júri tenha
entrado o fator juventude".
"Achou" terminou em segundo
lugar, e a terceira posição ficou
com "Girando na Renda", de Pedro Luís, Flávio Guimarães e Sérgio Paes. Walter Braga ganhou a
plaqueta (e o dinheiro) de melhor
letra por "Haicai Baião". No prêmio de melhor intérprete, houve
empate entre Marcelo Pretto
("Startrek de Tacape") e Ana Luiza ("Cassorotiba"). Todos ganharam R$ 10 mil, exceto o segundo
lugar para composição (R$ 20
mil). Vale lembrar que a TV Cultura, organizadora do festival,
funciona com dinheiro público.
Ao final, ficou a clara impressão
de que o melhor do festival surgiu
natural e inesperadamente. Foi a
empolgação e a emoção real da
platéia espectadora e participante,
que conseguiu se comover sinceramente com uma música e torcer por ela, fazendo com que,
mesmo que o resultado prático
não tenha sido o ideal, o moral do
público tenha saído em alta.
Na TV, a final do festival, exibida das 22h04 à 1h25, teve audiência média de 1 ponto -equivalente a cerca de 52 mil domicílios
na Grande São Paulo.
(RE)
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