São Paulo, sexta-feira, 16 de setembro de 2005

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Festival Cultura termina com vaias

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A voz do povo é a voz de Deus. Mas não é a voz do júri do "Festival Cultura - A Nova Música do Brasil". Foi histórica a vaia que o público ofereceu aos vencedores na entrega do prêmio na final do festival, no começo da madrugada de ontem e que tinha ingressos esgotados havia uma semana.
Finalmente, o festival se elevava acima da mediocridade. Não por si, que se manteve careta até o final, mas pelo público, que instintivamente exigia um pouco mais de leveza, descontração e emoção (e qualidade!) naquele ambiente de seriedade e falsa "boa música".
"Contabilidade" era uma música chata, com letra chata, que citava "a alta do preço do preservativo de baixa qualidade". "Achou" é bonita, inteligente, emocionante. A segunda foi a favorita do público. A primeira ganhou o festival. No momento da premiação, o público fez questão de deixar ruidosamente clara sua opinião.
O ministro da Cultura, Gilberto Gil, escalado para entregar o prêmio (uma plaqueta simbólica, R$ 50 mil, na realidade) para os escolhidos, acabou também vaiado no palco por tabela. Ele ainda tentou demover o público da vaia e pedir a palavra repetidas vezes ("OK, está registrada a vaia, mas deixa eu falar?"), ao que foi ignorado solenemente pelo teatro lotado, que não parou com a balbúrdia até que ele saísse do palco e os vencedores desistissem de fazer seu discurso de agradecimento.
O público ainda permaneceu no local jogando bolas de papel no palco e passou longos minutos fazendo questão de vaiar os vencedores contestados, impedindo a audição de boa parte da apresentação bisada da vencedora.
Danilo Moraes Doratiotto (filho de um dos apresentadores do festival, Wandi Doratiotto) e Ricardo Teperman, autores e intérpretes da canção vencedora, se mostravam constrangidos, mas tentavam manter a dignidade se concentrando num pequeno grupo de fãs que se juntou na frente do palco para apoiá-los.
Parte do teatro tentou ensaiar um coro reafirmando o favoritismo de "Achou", canção de Dante Ozzetti e Luiz Tatit, que havia sido cantada brilhantemente por Ceumar, mas foram desencorajados pelo próprio festival.
Enquanto por um lado a estudante de história Samira Bandeira abordava a reportagem da Folha ("Você vai escrever que foi marmelada? Pode escrever!"), por outro o vencedor popular Luiz Tatit, após a entrega dos prêmios, em conversa informal, matava a charada: "Achei que a música vencedora é muito boa, merecia estar entre as três primeiras. Mas talvez, se a seleção fosse a mesma e a colocação outra, teria sido mais compatível com o público. Imagino que na conversa do júri tenha entrado o fator juventude".
"Achou" terminou em segundo lugar, e a terceira posição ficou com "Girando na Renda", de Pedro Luís, Flávio Guimarães e Sérgio Paes. Walter Braga ganhou a plaqueta (e o dinheiro) de melhor letra por "Haicai Baião". No prêmio de melhor intérprete, houve empate entre Marcelo Pretto ("Startrek de Tacape") e Ana Luiza ("Cassorotiba"). Todos ganharam R$ 10 mil, exceto o segundo lugar para composição (R$ 20 mil). Vale lembrar que a TV Cultura, organizadora do festival, funciona com dinheiro público.
Ao final, ficou a clara impressão de que o melhor do festival surgiu natural e inesperadamente. Foi a empolgação e a emoção real da platéia espectadora e participante, que conseguiu se comover sinceramente com uma música e torcer por ela, fazendo com que, mesmo que o resultado prático não tenha sido o ideal, o moral do público tenha saído em alta.
Na TV, a final do festival, exibida das 22h04 à 1h25, teve audiência média de 1 ponto -equivalente a cerca de 52 mil domicílios na Grande São Paulo. (RE)


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