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São Paulo, quinta-feira, 16 de outubro de 2003

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O JULGAMENTO DE SIMONAL

Simoninha defende causa do pai na OAB; cantor marcou encontros com Chico e Caetano nos 80

"Queriam dar um sumiço nele na época"

DA REPORTAGEM LOCAL

Com a disseminação da alcunha de "dedo-duro" em órgãos de imprensa como "O Pasquim", Wilson Simonal saiu da gravadora Odeon, mas continuou gravando discos, desta vez pela Philips, a mesma gravadora de Chico Buarque e Caetano Veloso.
O então diretor da Philips, André Midani, afirmou em entrevista à Folha em 2001 que contratara Simonal por imposição do regime militar. "Tive que ir artista por artista, entre os mais importantes, explicando que ia ter que contratá-lo", disse. Hoje Midani afirma que não quer voltar ao assunto.
Consumada a condenação informal pela esquerda, veio então o julgamento pela direita. Simonal só voltou ao noticiário em novembro de 74, no desenlace do caso policial com o contador (que, segundo a família de Simonal, desapareceu após esse episódio).
Acusado pelo contador de sequestro, coação e extorsão, foi condenado a cinco anos de prisão, pelo terceiro crime. Também julgado, o policial que conduziu a sessão no Dops, Mário Borges (já morto), foi absolvido.
Na ocasião, a imprensa publicou a afirmação, por parte de Borges, de que Simonal afirmara em juízo que era informante do regime militar -o que o músico seguiu negando até a morte.
Por habeas corpus, Simonal foi solto uma semana depois e cumpriu pena em liberdade. Numa das poucas declarações à imprensa na ocasião, citou o maestro Erlon Chaves, seu parceiro próximo e figura de destaque no movimento black power do início dos 70.
Erlon morrera de infarto aos 40 anos, no dia seguinte à prisão de Simonal. "Ele morreu por minha causa, eu não merecia uma homenagem tão grande", disse.
Crianças à época, os filhos de Simonal, Wilson Simoninha, 40, e Max de Castro, 30, guardam memórias difusas do tempo da prisão. "Ele pagou uma pena que ninguém mais nessa situação pagou. O dia da prisão foi o pior da minha vida", diz Simoninha, que afirma acreditar irrestritamente na inocência do pai e tomou para si a causa do fã potiguar João Bastos Santana Filho, 51.
Max, que tinha dois anos e estava com o pai no ato da prisão, lança mais um dado: "A gente sabe que pessoas queriam matar ele naquela época. Não sabemos quem foi, mas havia um plano de dar um sumiço nele".
"No auge disso tudo ele estava no momento mais feliz da sua vida. O condenado pela agressão foi meu pai, mas como uma pessoa civil pode agredir alguém dentro das dependências do Dops?"
Dali em diante, Simonal gravou discos largamente ignorados na mídia, mergulhou no alcoolismo e tentou de forma intermitente denunciar o boicote a seu nome e pedir socorro a colegas.
Nos anos 80, chegou a se encontrar com Caetano Veloso, que lembra: "Senti muita ternura por ele. Mas achei que as palavras de encorajamento e solidariedade que disse caíram num pântano de desesperança autodestrutiva".
Outra tentativa de encontro foi com Chico Buarque, que, segundo o fã Santana Filho, teria recusado o pedido. Por meio de sua assessoria de imprensa, Chico afirma que topou o encontro por razões humanitárias, porque se teria dito que Simonal tentara o suicídio. Chico teria ido ao encontro, mas Simonal, não.
Simonal morreu em junho de 2000, ainda clamando sua inocência. Pelo princípio constitucional agora relembrado pela OAB, morreu inocente -até que alguém venha provar o contrário.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)

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