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livros
CRÍTICA ROMANCE
Trama antinazista escapa de demagogia
"A Questão Humana" troca centro demoníaco dos acontecimentos por multinacional em narrativa intensa
NELSON DE OLIVEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Adolf Hitler e o nazismo foram responsáveis, de 1933 a
1945, por crimes metódicos e
brutais: racismo, eugenia,
genocídio, terrorismo de Estado etc.
Outros carniceiros célebres foram Stálin, Mao e
Ceausescu. Mas nenhum
conseguiu atingir a dimensão mítica de Hitler e seu Estado-Maior.
Outro crime -este mais
duradouro- pelo qual o Terceiro Reich deve ser responsabilizado: a enxurrada de
arte e literatura kitsch de temática antinazista.
A Segunda Guerra terminou há quase sete décadas,
mas os oportunistas de toda
espécie continuam produzindo toneladas de filmes e
romances melodramáticos e
sentimentais sobre o Führer
e o Holocausto.
O romance "A Questão Humana", do belga François
Emmanuel, escapa por pouco da vala comum onde foram parar todos os best-sellers sensacionalistas sobre o
assunto.
É um romance de denúncia, certamente. Mas o autor
soube se safar das armadilhas da demagogia barata.
De que modo? Evitando o
centro demoníaco dos acontecimentos -os gabinetes do
Reich ou os campos de extermínio de judeus- e trabalhando na periferia: a filial
francesa de uma multinacional alemã.
São cerca de 80 páginas de
uma trama simples, ambientada numa cidade hulheira
no nordeste da França, em
19... (assim mesmo, com reticências).
Quem narra a história é o
psicólogo do departamento
de recursos humanos da empresa alemã SC Farb.
PSICOSE
Um dos diretores da empresa, Karl, pede a Simon, o
psicólogo, que investigue outro diretor, Mathias, cuja sanidade mental parece estar
se esfacelando.
Quando Simon toma posse
de documentos comprometedores e passa a receber misteriosas cartas anônimas, a
apuração dos fatos sai rapidamente de controle.
A narrativa é um arremedo
de relatório em que ação e digressão alternam-se de modo
equilibrado.
Os capítulos são curtos e
certo suspense sem malícia
mantém a intensidade até o
fim do livro.
A trama também traz pequenas surpresas laterais como, por exemplo, a insinuação de que o satirista austríaco Karl Kraus teria colaborado indiretamente na educação retórica do jovem Hitler.
Assistindo às palestras inflamadas de Kraus, o futuro
Führer teria aprendido como
seduzir pela eloquência. Ótima anedota.
O romance é de 2000. Sete
anos depois o diretor Nicolas
Klotz e a roteirista Elisabeth
Perceval adaptaram-no para
as telas de cinema. O filme foi
estrelado pelo ator francês
Mathieu Amalric, no papel
do psicólogo Simon.
A dupla respeitou o temperamento do livro, mas sem se
deixar limitar por ele. O filme
é mais erotizado e explícito
do que o original literário.
NELSON DE OLIVEIRA é autor de "Poeira:
Demônios e Maldições" (Língua Geral)
A QUESTÃO HUMANA
AUTOR François Emmanuel
TRADUÇÃO Marina Appenzeller
EDITORA Estação Liberdade
QUANTO R$ 29,80 (88 págs.)
AVALIAÇÃO bom
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