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FESTIVAL DE BRASÍLIA
Diretor de "Porto das Caixas" e "Capitu" fala sobre seu novo longa-metragem, que será exibido hoje
Saraceni leva seu "Viajante" ao evento
JOSÉ GERALDO COUTO
enviado especial a Brasília
"O Viajante", que será exibido
hoje no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, é o terceiro longa-metragem de Paulo Cezar Saraceni
baseado em obra do escritor mineiro Lúcio Cardoso (1913-68).
É o fecho do que o autor chama
de "trilogia da paixão", que inclui
"Porto das Caixas" (1962), baseado
em argumento original do escritor,
e "A Casa Assassinada" (1971),
adaptação do romance "Crônica
da Casa Assassinada".
"O Viajante" baseia-se em romance inacabado de Lúcio Cardoso, publicado postumamente.
Conta a história de um forasteiro
que chega a uma pequena cidade
de Minas Gerais para a festa da padroeira e provoca um terremoto
nas relações humanas locais.
O filme custou R$ 3 milhões e
tem no elenco Jairo Mattos, Marília Pêra, Leandra Leal, Nelson
Dantas e Milton Nascimento.
Saraceni, um dos fundadores do
cinema novo -ao qual deu obras
fundamentais, como "Porto das
Caixas" (62) e "O Desafio" (65)-,
não fazia um longa de ficção desde
"Natal da Portela" (88), que ainda
não teve lançamento comercial.
Folha - De onde vem sua afinidade com a obra de Lúcio Cardoso?
Paulo Cezar Saraceni - Conheci
primeiro o homem, que me foi
apresentado por Octavio de Faria,
e depois a obra. Impressionei-me
com a extraordinária energia dele.
Depois li toda a sua obra e fiquei
inteiramente apaixonado. Concordo com o (escritor católico) Octavio de Faria, que considerava Lúcio um romancista da estatura do
Machado de Assis. Ele tinha uma
prosa poética, mas muito visual.
Em qualquer coisa dele que eu lia,
via a possibilidade de um filme.
Folha - Que obra você quis adaptar primeiro?
Saraceni - Primeiro, eu quis filmar a "Crônica da Casa Assassinada". Naquele tempo (1960), eu estava na Itália estudando cinema e a
(escritora) Edla Van Steen pretendia produzir e atuar no filme, mas
queria que eu convidasse Luchino
Visconti para dirigir, tendo a mim
como assistente. Não topei. Eu
mesmo queria dirigir. Cheguei a
procurar locações, fui conhecer a
"casa assassinada", em Minas, cenário do romance e do meu filme.
Folha - Então o projeto é anterior
a "Porto das Caixas"?
Saraceni - Sim. Mas os produtores que fariam o filme eram ligados
a Jânio Quadros, e o Jânio renunciou, eles ficaram sem apoio.
Um dia, passando de trem por
Porto das Caixas (RJ), Lúcio começou a imaginar um filme sobre o
lugar. Escreveu o argumento e me
deu para filmar.
O filme teve uma repercussão
enorme, e brincamos que iríamos
ser a "dupla Tom Jobim-Vinícius
do cinema". Imaginamos então a
"trilogia da paixão", que além do
"Porto" teria "A Casa Assassinada" e "O Viajante", que o Lúcio
ainda estava escrevendo.
Folha - Como você compara seu
filme "O Viajante" com os dois anteriores da trilogia?
Saraceni - Ele é mais radical do
que os outros, é mais onírico. Fiz
uma narrativa barroca. Sabe, debrucei-me sobre o barroco mineiro, acho que é uma coisa da altura
do renascimento italiano.
Então, do ponto de vista narrativo, o filme tem uma liberdade
muito grande, com contrapontos
de flashbacks etc.
Acho que o cinema hoje, no
mundo todo, esqueceu muito a
criação na linguagem. A exceção
é o filme experimental, de vanguarda, mas isso fica muito restrito a um gueto, não chega ao cinema de grande público.
Eu quero fazer arte. Tentei fazer
o filme mais belo possível, porque o Lúcio era acima de tudo um
grande poeta.
Folha - Quais são seus próximos
projetos?
Saraceni - Tenho vários roteiros
esboçados. Um deles é sobre a vida do jogador de futebol Heleno
de Freitas. Outro é sobre o "eterno feminino", sobre a chegada de
Nossa Senhora no céu, formando
o quarteto perfeito. Chega dessa
história de ter só o pai, o filho e o
Espírito Santo.
Mas antes de realizar esses projetos eu preciso fazer com que
meus últimos filmes -"Natal da
Portela", "Bahia de Todos os
Sambas" e "O Viajante"- cheguem ao público. A Lei do Audiovisual deu dinheiro para a produção, mas esqueceu da exibição.
Continuamos cometendo o erro
de não peitar os americanos, que
dominam o mercado exibidor.
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