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"Cinema brasileiro vive momento livre"
A professora e crítica de cinema Lúcia Nagib lança livro que analisa a retomada da produção cinematográfica nacional
Diretora de centro de cinema em Leeds elogia "Antônia" e também vai em breve publicar ensaio sobre o recente "Crime Delicado"
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
A migração de talentos brasileiros para a Europa não é exclusividade do futebol. A ensaísta Lúcia Nagib, 50, representa a diáspora acadêmica.
Desde janeiro de 2005, ela é
professora titular da cátedra de
Cinema Mundial e diretora do
Centro de Cinema Mundial da
Universidade de Leeds, na Inglaterra.
Sua vaga -uma "Centenary
Chair", criada em comemoração ao centenário da instituição- foi aberta em 2004, quando era professora visitante do
Birkbeck College, da Universidade de Londres.
"Foi um processo [de seleção] bastante democrático que
contemplou, entre vários excelentes candidatos locais, alguém que era uma ilustre desconhecida para eles", diz.
Nagib acredita que não voltará tão cedo ao país. Sua obra, no
entanto, continua a dialogar
com a produção nacional. "A
Utopia no Cinema Brasileiro -
Matrizes, Nostalgia, Distopias",
seu mais recente livro, sai agora
no Brasil e em 2007 na Inglaterra e nos EUA.
O próximo, provisoriamente
intitulado "O Cinema e a Ética
do Realismo", terá "ensaio de
fôlego" sobre "Crime Delicado"
(2005), de Beto Brant, que "escapa do realismo enquanto gênero e da representação realista, para propor um cinema como "produção" do real". A seguir, trechos da entrevista que
Lúcia concedeu à Folha na última terça-feira, de Leeds.
FOLHA - Quais as atividades do
Centro de Cinema Mundial?
LÚCIA NAGIB - Adotei como base
uma definição positiva, policêntrica e democrática: cinema
mundial são todas as cinematografias do mundo, inclusive a
de Hollywood, que deve ser tratada como um cinema entre
outros. O que importa, aqui, é
estudar como diferentes cinemas se inter-relacionam e se
destacam em determinado momento e lugar. Assim, Hollywood e o "cinema clássico" deixa de ser o provedor de paradigmas para a análise de qualquer
outro cinema, enquanto as demais cinematografias do mundo se tornam capazes de inspirar novas teorias. O centro oferece módulos de graduação,
mestrado em World Cinemas e
orientação para doutorado,
além de ciclos de seminários,
conferências e publicações.
FOLHA - Após "Cidade de Deus" e
"O Invasor", os filmes mais recentes
analisados em seu livro, ambos lançados em 2002, outras produções
permitiriam discutir o que você chama de "gesto utópico"?
NAGIB - Ele está intimamente
ligado a um momento histórico. A retomada do cinema e a
abertura neoliberal deram uma
missão urgente ao cineasta brasileiro, que era a de refletir sobre o destino do projeto nacional, tão importante no período
do cinema novo. A pergunta
era: "o que esperar do Brasil, no
novo cenário político?". Descrevo, no meu livro, várias respostas que ocorrem em fases ordenadas de modo quase cronológica: uma euforia inicial da
redescoberta do sertão, em
meados dos anos 90, seguida de
uma atitude realista que consiste na constatação da permanência dos problemas históricos do país, sobretudo nos filmes de favela, e afinal a distopia
urbana, que vê com cinismo
qualquer perspectiva de mudança. Acredito ter esgotado
esse tema, mesmo porque ele
deixou de ser central no cinema
contemporâneo brasileiro, que
se encontra num momento
muito livre e diversificado.
FOLHA - Assistiu à safra mais recente?
NAGIB - Tive a oportunidade de
assistir a "Antônia" e "O Ano
em que Meus Pais Saíram de
Férias". "Antônia" me impressionou muito por abordar uma
face escondida da periferia, a
mulher, e a mulher artista, num
universo essencialmente viril e
no mais das vezes machista. É
um filme gostoso de assistir,
sem violência ou drogas, e nem
por isso deixa de estar estreitamente ligado ao contemporâneo e, por que não, à moda.
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