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Comentário
Personagens de Jack Nicholson vocalizaram a rebeldia de uma época
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
A exemplo de Francis
Coppola, Martin Scorsese, Peter Fonda e
Bruce Dern, Jack Nicholson
cursou a "Escola de Cinema de
Guerrilha Roger Corman", como o diretor Peter Bogdanovich -outro ilustre ex-aluno-
se refere à American International Pictures, para a qual todos trabalharam nos anos 60.
Especializada em filmes "B"
para circulação em salas populares, rodados em poucos dias
com baixíssimo orçamento, a
produtora de Corman foi a
principal incubadora dos talentos que, na virada para a década
de 70, ajudariam a desenhar, no
processo de revitalização da indústria norte-americana, a
"nova Hollywood".
A tomada do poder por essa
geração tem uma de suas melhores traduções na carreira de
Nicholson, há quase 50 anos na
ribalta. O primeiro estágio, ainda no anonimato, foi o de
aprendizado em filmes como
"A Pequena Loja dos Horrores"
(1960) e "O Terror" (1963), no
qual Coppola trabalhou como
assistente de direção.
O próprio Corman diz, no documentário "Uma Década sob a
Influência" (2003), que acreditava no futuro dessa turma,
mas não imaginava que ela iria
tão longe. Para Jack Nicholson,
o rito de passagem foi "Sem
Destino" (69), que lhe valeu
uma indicação ao Oscar de ator
coadjuvante.
Transformado em ícone da
"nova Hollywood", o filme de
Dennis Hopper enterrou o "código Hays", usado desde a década de 30 como instrumento de
auto-censura da indústria, e
apontou para a incorporação
de valores da cultura hippie como oportunidade de sintonia
com o público jovem, então distante da produção norte-americana.
Rebeldia
O espírito de rebeldia do período, ácido em relação à presença dos EUA no Vietnã, ao
vazio da sociedade de consumo
e ao papel repressivo de instituições como governo, família e
escola, foi vocalizado com eficiência por seus personagens
em "Cada um Vive como Quer"
(70), "Ânsia de Amar" (71), "A
Última Missão" (73) e "Um Estranho no Ninho" (75).
Junte ao pacote filmes como
"Chinatown" (1974) e "O Passageiro - Profissão: Repórter"
(1975), hoje clássicos, e em
pouco mais de cinco anos Jack
Nicholson já era um astro, um
dos principais indícios de que
as antigas regras do estrelato
masculino em Hollywood haviam sido revogadas.
Como o seu amigo Bruce
Dern observa em "Uma Década
sob a Influência", era o triunfo
do homem comum, demonstrado também pelo êxito de Gene Hackman, Robert De Niro e
Al Pacino, entre outros atores
que despontaram naquele momento.
A fama, o poder e a mudança
de ares na sociedade foram aos
poucos diluindo em Nicholson
a rebeldia desses anos gloriosos. Há algo no olhar de seus
personagens, entretanto, que
mantém viva a lembrança daquela saudável tensão criativa,
do zelador de "O Iluminado"
(1980) ao aposentado de "As
Confissões de Schmidt"
(2002), do Coringa de "Batman" (1989) ao neurótico de
"Melhor É Impossível" (1997).
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