São Paulo, terça-feira, 16 de dezembro de 2008

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Opinião

Show é doce que gruda e não enjoa

Apresentação de Madonna com a turnê "Sticky & Sweet" no Maracanã termina em rave, em que cantora é patrona e musa

CECILIA GIANNETTI
COLUNISTA DA FOLHA

"Sticky & Sweet" prova que o mundo é o playground de Madonna; mas Nova York, desde o começo (e novamente destacada no recente retorno a uma espécie de disco revitalizada, com o álbum "Confessions on a Dancefloor"), é a nave-mãe da diva, que trocou Michigan pela Maçãzona em 1978, com (diz-se) não mais do que 37 doletas amassadas no bolso, para tornar-se dançarina.
Virou também cantora, em clubes como Paradise Garage e Danceteria, onde em 1983 já mandava pra galera um playback de "Everybody". Foi a partir dali, no circuito de clubes noturnos e coreografias que misturam todo o tipo de danças de rua, que se tornou ícone mundial pop, em vez de apenas mais uma sensação importada dos Estados Unidos via MTV.
O show da atual turnê da loira, que estreou no Maracanã, no Rio, no último domingo, desenrola para o público, em quatro blocos de canções, o novelo de influências absorvidas e reviradas pela estrela em 25 anos de carreira, intercalados por poderosas intervenções em vídeo -e quem poderia duvidar de que a mídia que Madonna melhor manipula seria uma das chaves de suas bodas de prata pop?-, responsáveis por guiar o público entre mudanças de clima bem arquitetadas.
A cola que junta todas as pontas é feita de chiclete, marshmallow, açúcar de confeiteiro... Doces que grudam nos dentes e viciam sem, curiosamente, enjoar. Mérito d'Ela e do faro certeiro que, desde sempre, a faz cercar-se e alimentar-se de talentos que melhoram a receita, (bom tino que parece abandoná-la quando a questão é escolher seus homens).
Quando Madonna surge num trono suspenso, na abertura com "Candy Shop", apesar de uma ou outra nota desafinada pelo gogó real, a coroação não parece em momento algum exagerada ou despropositada. Ela é mesmo a rainha dessa zona chamada indústria pop; levanta uma sobrancelha, esboça um meio sorriso superior. O seu "bota a mão no joelho, dá uma agachadinha" começará a pegar fogo é com a segunda canção, "The Beat Goes On", também de seu 11º álbum de estúdio, quando um veículo Auburn Speedster 851 branco, de 1935, invade o palco, demarcando o bloco Pimp do show.
A platéia também produz imagens fortes; um exemplo: o grandalhão que passa entre a multidão gritando "Abre!" e se destaca por um imenso "bois" de penas cor-de-rosa vibrante de um grupo de outros igualmente altos e musculosos, todos carregando um gigante desacordado. Álcool e drogas ou pura emoção? Mistério, que não chegou a desplugar do palco os olhos de quem deu passagem ao grupo e continuou a pular na chuva.
Animações sobre obras de Keith Haring abriram o segundo bloco, Old School, com mr. DJ, seu boné e scratches. Mas nele, também brinca com hits dos anos 80, como "Borderline", que transforma em... rock de arena, quase, com direito a guitarradas. Em seguida, ela levou o inevitável escorregão e prosseguiu linda e loira após esticar um joelho pro alto (não, não era parte da coreografia).
No terceiro bloco, Gypsy, não é à toa que a música romena é destaque: recauchutada por uma nova sensação nova-iorquina, que chegou ao Brasil pelos próprios pés, a banda Gogol Bordello, agora celebrada pela cantora. O último bloco não poderia ter título mais apropriado: o Maracanã, afinal, está alagado, a platéia, no escuro, e todos dançam ao som da batida. É uma rave, mas diferente. Esta tem dona, patrona e musa. Uma idosa que não aparenta a idade.


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