São Paulo, quarta, 16 de dezembro de 1998

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O carimbador maluco

Arquivo MIS/Divulgação
O artista Alex Vallauri com uma máscara para grafite



MIS faz exposição que reúne as centenas de símbolos que Alex Vallauri, precursor do grafite paulistano, "carimbou" nos muros de São Paulo


CASSIANO ELEK MACHADO
da Reportagem Local

Em abril de 1987 um disco voador começou a aparecer em diversos muros de São Paulo. Ao lado das naves espaciais, vinha a frase "Ring, ring. Alo? É Deus? Cuida do Alex, Meu Deus".
O artista plástico Alex Vallauri havia morrido. E nada melhor do que um grafite em um muro paulistano para exprimir a dor que isso representava para a comunidade dos artistas da rua.
Foi Vallauri quem, em 1978, começou a jorrar tinta spray nas paredes da cidade, moldadas por formas como botas de salto alto, luvas pretas e gravatas listradas.
A partir de hoje, as dezenas de ícones que o artista etíope-italiano-argentino, mas sobretudo paulistano, "carimbou" obsessivamente por toda a cidade nas décadas de 70 e 80 estão reunidos em torno de apenas um grito.
"Viva Vallauri" é o nome da exposição que está sendo inaugurada na noite de hoje no Museu da Imagem e do Som.
Mais do que um apanhado de trabalhos do artista, a mostra que se espraia pelos três andares do MIS pretende capturar a "atitude Vallauri", como explica o curador Paulo Klein.
A "alegria" que o artista imprimiu nas partes cinzentas paulistanas está representada em reproduções de até seis metros de largura de algumas das marcas registradas do artista, como por exemplo a imagem "Acrobata", que faz piruetas nesta página de jornal.
Essa figura da mulher contorcida, aliás, é um retrato do processo criativo de Vallauri, marcado pela característica pop de se apropriar, deglutir e reproduzir incansavelmente imagens vindas de outros criadores.
"Acrobata" foi inspirada em personagem da tela "O Circo", do pintor francês Georges Seurat (1859-1891), que por sua vez havia "recolhido" a malabarista de um cartaz de rua criado pelo artista Jules Chéret.
Nem todos os símbolos "vallaurianos" têm fontes tão distantes. Boa parte deles foi inspirada em carimbos que o artista colecionava, muitos deles vindos da casa Dulcemira, na rua Aurora (centro de SP).
"A Rainha do Frango Assado", uma de suas personagens mais célebres, foi criada à imagem e semelhança da "bem-fornida" empregada do artista, chamada Iraci.
A "femme fatale" que veste luvas pretas e exibe um suculento frango assado sobre uma bandeja está, no MIS, reproduzida no hábitat que fez dela uma celebridade artística. Uma sala no primeiro andar do museu exibe uma cópia da instalação "Festa na Casa da Rainha do Frango Assado", atração da 18ª Bienal Internacional de São Paulo, de 1985.
"Viva Vallauri" também traz as partes menos conhecidas do artista. Estão expostas dezenas de gravuras que Vallauri criou quando estava começando.
Esculpidas em madeira, metal ou pedra, seus primeiros trabalhos são banhados por uma linguagem expressionista, que já mostram o desejo que o artista tinha de fazer de sua arte um grito.
Esse berro que Vallauri espalhou pela cidade também está expresso em centenas de fotografias, que registraram a fugacidade do trabalho que o artista espalhou em muros descascáveis e passíveis de descargas de monóxido de carbono dos escapamentos de ônibus.
Coordenada por Marcos Santilli, diretor de museu e o segundo curador da mostra, a parte fotográfica foi selecionada a partir do acervo de 6.000 cromos que o artista tinha de sua obra e que foi doado para o MIS.
Ufanista com relação à produção de Vallauri, Santilli diz: "Ele ainda vai ser reconhecido como um dos grandes artistas deste século".
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Exposição: Viva Vallauri
Quando: hoje, às 20h; diariamente, das 14h às 22h; até 16 de janeiro Onde: MIS - Museu da Imagem e do Som (av. Europa, 158, Jardim Europa, tel. 011/ 280-0896)
Quanto: entrada franca





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