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Na roça com Jamie
Em seu sítio na Inglaterra, o jovem chef Jamie Oliver mostra à Folha a
horta de onde saíram ingredientes para livro de receita a ser lançado no
Brasil e diz que gosta de "caos" e de comida caseira, sem "frescuras
francesas'
PEDRO DIAS LEITE
ENVIADO ESPECIAL A ESSEX
(INGLATERRA)
Jamie Oliver detesta os programas de TV com chefs de 50
anos e seus potinhos com tudo
já cortado. Jamie Oliver não
tem o menor interesse na "alta
culinária", com seus pratos sofisticadíssimos. Jamie Oliver
odeia que digam a ele o que fazer. O jovem chef britânico, aos
32 anos, gosta mesmo é do caos.
Passam das 15h de uma sexta
com clima de primavera (sol e
12º C) em Essex, vilarejo calmo
a uma hora de Londres, quando
Jamie senta para a entrevista
com a Folha, no sítio que comprou há alguns anos e que foi
palco de seu mais recente programa, "Em Casa com Jamie".
No enorme galpão envidraçado, de um lado há uma pequena cozinha, com fogão, panelas, pia; e queijos, temperos,
verduras. Do outro, uma bateria num canto, um sofá no outro. Na estante, dezenas de livros de culinária, alguns muito
antigos, outros do próprio Jamie, um do superchef norte-americano Mario Batali.
"Quando você vê alguns programas de culinária, tudo já está cortadinho em pequenos potes, reparou? Pote disso, pote
daquilo. Mas, quando chega em
casa e decide fazer o jantar, está tudo na geladeira! Você cria
o maldito caos para cozinhar.
Não dá para acreditar em alguns programas, tudo em ótimos potinhos, e vai, esvazia esse, esvazia aquele. Ah, isso é cozinhar? Não, não é", argumenta, apaixonadamente, enquanto move os braços, ajeita-se no
sofá e faz uma série de sons
com a boca, para deixar clara a
imagem dos potinhos sendo esvaziados. Evitou, no entanto,
citar os programas nos quais
não se pode "acreditar".
A divergência de Jamie com
os outros chefs vai além dos potinhos. Ele não gosta da culinária sofisticada, com pratos milimetricamente arranjados e ingredientes irreconhecíveis.
"Ah, não, nunca cozinho isso.
É como você gostar de rave e alguém pedir para você gostar de
jazz; gostar de Audi e pedirem
para usar Volvo; ter cabelo
comprido e pedirem para usar
curto", reage. "Gosto de cozinhar boa comida caseira. Sei fazer essas frescuras francesas,
mas [mais gestos] acho tão destrutivo, não significa nada. Não
me faz sorrir. Faz tocar demais
a maldita comida, e não gosto
disso. Minha filosofia, na medida do possível, é tocar a comida
que estou fazendo o mínimo
possível e tirar o menos possível de suas características."
A culinária, argumenta Jamie, é o oposto. Sua filosofia é
usar ingredientes bons e frescos e "mandar ver". "Minha regra é manter as coisas simples.
Quando estou fazendo boa comida, nunca é comida de chef.
É só cozinhar comida caseira.
Gosto de azeite de oliva em vez
de manteiga, ervas, vegetais,
massa, temperos."
"Maldito hippie"
"O importante é: divirta-se e
seja corajoso. Você não acreditaria como algumas pessoas viram covardes na cozinha. Você
vê uns caras enormes que ficam
medrosos. Tem de ir e fazer,
mandar ver. Quer dizer que não
vai errar? É claro que vai. Mas,
se não fizer com um mínimo de
convicção, vai fazer ainda mais
erros", afirma.
A sua horta, a alguns passos
do galpão, é um exemplo vivo
do modo Jamie Oliver de fazer
as coisas. Dela saíram os ingredientes e a inspiração para seu
atual programa e seu livro de
receitas, que será lançado no
Brasil no próximo semestre.
"As pessoas pensam que você
tem de ter certa idade para cultivar vegetais, ou parecer um
maldito hippie para cuidar de
uma horta. Não mesmo! É simplesmente colocar umas coisas
no chão, um pouco de luz, de
água e, na maioria das vezes, vai
crescer algo. Pode não ser bonito nem ordenado, ficar meio
bagunçado, mas, do que sai, você consegue seu jantar."
O chef está no meio da explicação quando uma mulher com
um desses aparelhos de fazer
chapinha se aproxima e começa a arrepiar ainda mais seus
cabelos loiros já estrategicamente levantados para o alto.
"Desculpe, ela está tentando
me deixar lindo", explica-se ele.
Na verdade, já é a preparação
para uma filmagem que será
feita em uma hora, para um vídeo para seus funcionários.
Mas, então, é natural a dúvida: é tudo mesmo espontâneo
ou não passa de marketing?
"É real. Eu nunca ensaio,
nunca mesmo!", diz Jamie, para logo engatar em mais uma
história, a de como aprendeu a
ensinar. Aos oito anos, começou a cozinhar no pub dos pais,
perto de onde comprou o sítio.
Aos 11, já usava uma faca de
chef e dava ordem em gente
com o dobro de sua idade e seu
tamanho: "Então tive que, rapidamente, desenvolver um jeito
de falar com as pessoas e ensinar para, basicamente, não
chutarem a minha cabeça".
Mais uma pausa -outro funcionário, que veio trazer um
chá. "Meu Deus, o que esse cara
pôs aqui?", diz Oliver, sorrindo
para o assessor que trouxe seu
chá com leite. "Está uma porcaria. Pode falar, você cuspiu [na
verdade, uma palavra pior, impublicável] na minha bebida,
não é?", reafirma, de bom humor, e toma mais um gole.
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