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Poetinha
À maneira de Vinicius
de Moraes, uma de suas
influências,
Fabrício
Corsaletti
não separa
a poesia da
vida em
novo livro
FABIO VICTOR
DA REPORTAGEM LOCAL
Solicitado a escolher ele mesmo o local da entrevista sobre
seu novo livro, um lugar em que
se sentisse bem, Fabrício Corsaletti sugeriu um boteco no
bairro da Liberdade. Para reforçar, depois enviou um poema sobre o bar, cuja primeira
estrofe diz: "Kintarô é um boteco da Liberdade/ o melhor boteco da Liberdade/ e talvez o
melhor boteco do mundo".
O poema-tributo não integra
"Esquimó", que a Companhia
das Letras lança amanhã. Corsaletti o escreveu porque adora
o tal bar e as pessoas dali. Minúsculo, com um balcão e duas
mesas, é um "izakaya", boteco
que serve pequenas porções japonesas (e, no caso, também
torresmo), administrado por
dois irmãos lutadores de sumô.
Aos 31 anos, mas já no oitavo
livro e com uma bagagem apinhada de resenhas elogiosas, o
poeta parece inteiramente
adaptado a São Paulo, a metrópole que tateou com assombro
ao deixar em 1997 a pequena
Santo Anastácio, a 600 km da
capital, para estudar letras.
A memória da província marcou o início na poesia e explodiu no primeiro livro de prosa,
"King Kong e Cervejas" (Cia.
das Letras, 2008). Antes disso,
em 2007, ganhara uma antologia poética, "Estudos Para o
Seu Corpo". Em 2009 saiu, pela
34, onde trabalha como editor-assistente, "Golpe de Ar", seu
primeiro e urbano romance.
Corsaletti está mesmo mais
urbanizado, mas continua impregnado de Santo Anastácio.
Como o Kintarô, "Esquimó" recende ao transitório -um território novo, estrangeiro e cosmopolita, protegido, logo além
do balcão, pelo minimalismo e
pelo amor aos amigos.
A melancolia lírica fez a crítica de pronto associá-lo a Bandeira e Drummond. De fato, na
adolescência ele leu ambos por
dois anos sem parar. Mas a verdadeira revelação, conta, veio
antes, ao ler uma antologia de
Vinicius de Moraes.
Vinicius era chamado de
"Poetinha", alguém que, ao viver com intensidade a vida de
artista, dessacralizou a imagem
de poeta, despiu-se da aura romântica. Neste aspecto, Corsaletti é totalmente "Poetinha".
Não há fronteira clara entre o
que vive e o que escreve; toda
matéria íntima vira literatura.
O escritor é maluco pela atriz
francesa Eva Green -a evocação do corpo feminino é outro
selo autoral. Assim, fez para ela
um poema em "Esquimó", um
dos mais divertidos do livro, em
que planeja aventuras com ela.
Mas isso é brincadeira.
A vera, Corsaletti é completamente louco pela namorada,
a professora de estilismo Mariana Rocha. "Depois da poesia,
ela é o acontecimento mais importante de minha vida", diz.
Dedica-lhe livros e poemas. Para ela escreveu "Seu nome",
que o autor considera o seu melhor poema até hoje.
Corsaletti anda, faz alguns
anos, encantado por Bob
Dylan. Estudou inglês para entender as letras. Reunia-se com
amigos para traduzir o cantor
americano. Eis que Dylan inundou "Esquimó" de referências:
"Quinn the Eskimo" é uma música dele, assim como "Everything is Broken", nome do poema de abertura do livro.
(O poeta compôs rocks para
as bandas Barra Mundo e Portnoy, e fez, em parceria com o
pai, dentista e compositor, o hino de Santo Anastácio).
O apego ao que vive não embota o rigor artístico. Corsaletti
acorda cedo para ler e escrever,
e escreve todo dia. Para a prosa
("mais lógica e trabalho braçal") é mais rigoroso, acorda às
6h e se concentra. Num caderno, registra tudo que lê em prosa ("de poesia não se lê um livro
inteiro") -a soma está em 476
títulos. Adora Rimbaud, Raduan Nassar, Salinger, Cortázar, Faulkner, Angélica Freitas
e César Vallejo.
A todo instante joga fora poemas. "Não tenho nenhum apego emocional aos meus textos,
somente quando são bons."
Entre loas, destoou uma resenha sobre "King Kong e Cervejas", a única que até hoje irritou Fabrício. Em um texto na
revista "Sibila", o crítico Rodrigo Gurgel insinuou que o coleguismo era a causa das boas resenhas. A Folha perguntou a
Rangel o que ele quis dizer com
a insinuação. "Foi retórica. Hoje no Brasil um sujeito vira genial por vários fatores: amizades, contatos, a pessoa certa
para fazer a resenha no lugar
certo", disse o crítico.
Autor de algumas das resenhas elogiosas, o professor de
literatura da USP Alcides Villaça, que leu a produção de Corsaletti quando ele ainda era seu
aluno e o estimulou a seguir,
discorda. "Normalmente os jovens expressam de forma direta e prosaica sua experiência de
vida, como uma confissão. Ele
tem altitude, achou o espaço da
sua experiência sem diminui-la
nem sobrevalorizá-la."
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