São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2006

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MÚSICA/CRÍTICA

Músico lota o Gigantinho (PA) em show para 12 mil pessoas

Guitarrista Santana fatura em cima do clichê da latinidade

RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Os anjos estão entre nós, anunciou Santana lá pela metade do show, num dos raros momentos em que se dirigiu ao público através do microfone. Queremos e teremos a paz mundial, continuou ele. Apropriado, para um show que começou em clima new age, com um telão mostrando imagens como o planeta Terra visto do espaço, um feto, uma pomba branca voando e africanos tocando percussão. Apropriado também para o músico que, à tarde, surgiu em um quarto de hotel para dar entrevistas de roupa branca, estampas hippies e uma pochete a tiracolo.
Em um ginásio lotado, com cerca de 12 mil pessoas ali para vê-lo, ele subiu ao palco em um calor de mais de 30 0 em Porto Alegre às 21h20, saiu às 23h50. Uma hora e meia a menos do que as quatro horas que havia prometido durante a entrevista. Não que tenha sido pouco. Tocou mais de 20 músicas e manteve presa a atenção do público até nas baladas e nas músicas instrumentais. Ao lado do guitarrista, dois percussionistas, um baterista, um baixista, um guitarrista rítmico, um tecladista e um vocalista.
"Não tenho medo de ser popular, só não quero fazer música rasa", comentou ele à tarde. À noite, ele provou ambas as coisas. De rock e jazz teve pouco. Foi basicamente um show de pop latino com pitadas de blues. Com introduções climáticas e gosto de Tijuana, a banda passeou pelo flamenco, mambo, rumba, criando uma espécie de fusion latino pop ao mesmo tempo pré e pós Ricky Martin e Shakira, com ecos de Red Hot Chili Peppers a Sepultura. Na verdade, Santana fatura em cima do clichê da latinidade. Mas, afinal, o que seria do pop sem clichês? "Eu provavelmente sou um artista pop, mas não penso nas coisas nesses termos", observou.
O público gaúcho que lotava o estádio variava entre jovens adultos e adultos jovens. Poucos adolescentes, muitos balzaquianos, bem dividido entre homens e mulheres. Um dos segredos de Santana: ele agrada a todos. E teve para todo mundo no show: metaleiros cabeludos, garotas querendo dançar, jovens querendo ouvir a música do rádio, pessoas que não conheciam a música do guitarrista mas buscavam a diversão casual, todos tiveram seu momento. O público parecia querer dançar.

Estádio
No mais, foi o habitual show de estádio (ginásio, no caso): mãos para cima, garotas nos ombros dos namorados, rapazes sem camisa, isqueiros e celulares acesos, repertório sem surpresas. De hits recentes como "Smooth" e "Maria Maria" a clássicos dos anos 70 como "Black Magic Woman" e "Oye Como Va", teve espaço até para citação de "Aquarela do Brasil", de Ary Barroso, no meio de um solo de guitarra.
Santana, é óbvio, toca muito bem. É verdade que sabe ser bem chato e meio cafona em alguns momentos, mas nunca ruim. E, afinal, ele descobriu sua fórmula e segue até o fim com ela: os solos de guitarra de sotaque blues-latino nas brechas da melodia vocal, com longas notas agudas sustentadas na guitarra, foi o que mais se ouviu ali. "Antes eu achava que John Coltrane estava lá em cima e Kenny G lá embaixo, mas agora eu sei que tudo é música", contemporizou ele na frente de jornalistas mais cedo no mesmo dia.
É a bênção e a maldição do pop. Não faz diferença dividir a música em boa e ruim, analisar seus méritos. Alguém ainda agüenta ouvir a guitarra da introdução de "Smooth"? Milhares de pessoas. Se uma melodia, uma letra, um riff têm os elementos necessários para fazer o raio do pop cair sobre uma música, tudo muda. Aquilo entra nos ouvidos das pessoas e se torna muito mais relevante do que qualquer discussão intelectual. A única saída? Divertir-se.


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