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Bonde das letras
Um grupo de 16 autores brasileiros,
veteranos e novos, embarca para 16 cidades
do mundo para escrever uma história de amor
CADÃO VOLPATO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Você é um escritor sem dinheiro, lutando pela sobrevivência. Tem, segundo suas próprias palavras, "apenas um dia
de príncipe ao mês". Você emigrou dos quadrinhos para a literatura, vendeu os direitos para
o cinema dos livros que publicou, mas ainda desenha uma
última história de despedida.
Um dia, aparece um sujeito
oferecendo um mês de estadia
em Nova York, onde você nunca esteve, com todas as despesas pagas e a única obrigação de
retornar com uma história de
amor na cabeça, que depois será publicada por uma das maiores editoras do Brasil.
O escritor em questão existe,
é Lourenço Mutarelli, um dos
16 autores brasileiros a caminho de 16 destinos diferentes
no mundo, para viver uma experiência -qualquer experiência-, voltar e escrever um livro.
A coleção se chama Amores
Expressos e foi idealizada por
Rodrigo Teixeira, um jovem
Quixote de pés bem plantados
no chão. Teixeira já foi chamado de maluco na sua primeira
experiência na área de cultura.
Ele tinha 21 anos e quis publicar uma coleção de futebol.
No começo, ninguém quis saber. Bastava pensar na combinação improvável do assunto
futebol com a cara de garoto do
proponente para saber: não ia
dar certo.
Pois Teixeira conseguiu um
patrocinador tão apaixonado
quanto ele ("Aos 45 do segundo
tempo da minha vida", diz),
chamou 13 autores expressivos
e criou uma coleção de futebol,
a Camisa Treze, que vendeu, no
total, cerca de 350 mil livros.
Desde então, Teixeira tem
inventado diversos projetos
multimídia: "Um livro que pode virar um filme que pode virar um DVD que pode virar um
programa de televisão", diz.
Assim nasceu a idéia da coleção Amores Expressos, que ele
divide com o escritor João Paulo Cuenca, autor de um único
romance, "Corpo Presente", e
de uma novela entre as três do
livro "Parati Para Mim", em
que os autores passaram uma
temporada na cidade para escrever uma pequena história.
Já os 16 afortunados viajantes da coleção da Companhia
das Letras vão ganhar o mundo,
a partir de abril, quando embarca a primeira leva.
O dinheiro para essa aventura -cerca de R$ 1,2 milhão,
contabilizando todos os produtos finais- vem, em parte, da
Lei Rouanet. Todos os autores
recebem o mesmo valor pelos
direitos autorais e pela cessão
de direitos ao cinema.
"Estamos num momento
fértil, em que a literatura brasileira vem encontrando novos
nomes", diz o editor Luiz
Schwarcz, da Companhia das
Letras. Para ele, o projeto também vale como garimpo, por
conta de seus escritores novos
e novíssimos. Os títulos devem
ser publicados ao longo de quatro anos pela editora.
Histórias de amor
"Quase todas as histórias do
mundo são histórias de amor",
diz Bernardo Carvalho, destino
São Petersburgo, Rússia. A afirmação surpreende, vinda de
um escritor cerebral, mas sinaliza a disposição de quase todos
os autores.
"Dá para ambientar romances até na Lapônia, como no filme "Os Amantes do Círculo Polar'", conta Adriana Lisboa,
destino: Paris.
Filme, aliás, é o formato embutido e desejado nessas histórias que serão gestadas no exterior. Não só isso: uma equipe de
filmagem deve acompanhar os
viajantes por três dias, retratando sua experiência para lançá-la em um DVD futuro.
Para o veterano Sérgio Sant'Anna, destino Praga, a viagem
lembra um filme antigo: ele já
esteve na cidade, com a família,
em 1968, um pouco antes dos
tanques soviéticos.
"Sinto Praga como um cenário perfeito e até com um mistério poético para uma história
de amor. E há toda aquela magia de ser a cidade de Kafka.
Sinto que a novela nascerá e
fluirá a partir do que sentir lá."
Ao imaginar as estadias dos
16 escritores, Cuenca e Teixeira
pensaram em criar "ruídos". O
próprio Cuenca pretende se
perder em Tóquio. Chico Mattoso, inédito em romance, encara o socialismo musical e decadente de Havana, uma festa
para os sentidos. "É isso que faz
você escrever e ter idéias. É tirar o seu chão", diz a colunista
da Folha Cecilia Giannetti,
destino Berlim.
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