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61º FESTIVAL DE CANNES
Woody em férias
Preguiçoso e com olhar de turista, Woody Allen decepciona em Cannes com "Vicky Cristina Barcelona", seu novo filme da fase européia
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA, EM CANNES
Em 2002, Woody Allen
abriu o Festival de Cannes com "Dirigindo no
Escuro", uma comédia de erros
sobre um cineasta (o próprio
Allen) que sofre de uma cegueira temporária, mas, ainda assim, consegue rodar um filme.
A piada final parecia ter sido
feita sob encomenda para Cannes: o caótico filme rodado pelo
homem cego fracassa nos EUA,
mas cai nas graças da crítica
francesa -e o cineasta muda-se, feliz da vida, para Paris.
Ironia ou não, seis anos depois Allen está de volta a Cannes com seu quarto filme realizado na Europa. Depois de três
histórias situadas em Londres
("Match Point", "Scoop" e "O
Sonho de Cassandra", em cartaz no Brasil), ele agora aponta
a câmera para a arquitetura de
Barcelona, onde encena um
qüiproquó amoroso estrelado
pela sua atual favorita, Scarlett
Johansson, a novata Rebecca
Hall e os atores espanhóis Javier Bardem e Penélope Cruz.
É difícil saber ao certo, no entanto, até que ponto essa fase
européia de Allen, que começou em 2005, é fruto de uma
necessidade artística real ou
apenas de uma combinação de
oportunidades. Fato é que o diretor, como tantos outros cineastas americanos, vinha encontrando imensas dificuldades para viabilizar seus filmes
nos Estados Unidos, e, a partir
de determinado momento, resolveu aproveitar sua fama na
Europa e acompanhar o fluxo
dos financiamentos possíveis
que mantivessem o intenso ritmo de cerca de um longa-metragem por ano.
Evidentemente, Allen tem
todo o direito de filmar como e
onde quiser e com o financiamento que for, mas o fato é que
"Vicky Cristina Barcelona",
bem mais do que seus trabalhos
londrinos, ficou com um jeitão
de filme de conveniência, tantas são as obviedades em torno
dos contrastes entre a cultura
européia e a americana que
desfilam pela tela. Mais incômoda ainda é a visão de uma suposta latinidade espanhola,
mas da qual Allen nada parece
compreender.
Colorido demais
Com Nova York, que durante
tantos anos foi a casa e o cenário de seus filmes, Londres
compartilha a língua e um certo
ar cinzento -dois aspectos que
passam longe da originalidade
colorida de Barcelona. A câmera de Allen parece um peixe fora d'água na cidade de Gaudí e
Miró, o que não seria, por si só,
um problema maior, pelo menos se ele soubesse explorar
seu olhar estrangeiro a favor da
história que quer contar.
Mas não é o que acontece.
Vicky (Rebecca Hall) e Cristina
(Scarlett Johansson) são duas
jovens amigas americanas com
visões completamente diferentes sobre o amor. Elas desembarcam de férias em Barcelona
e conhecem um pintor libertário e sedutor, interpretado por
Javier Bardem.
De casamento marcado com
um americano com cara de relógio parado, Vicky tenta resistir às investidas do pintor, mas
acaba apaixonando-se secretamente por ele depois de uma
noite furtiva. Já Cristina, que
logo se entrega, acaba vivendo
um affair a três com ele e sua
ex-mulher, interpretada por
Penélope Cruz. (Não espere as
tão faladas cenas de sexo ousadas, que se limitam apenas a
uns beijinhos e olhe lá).
O olhar que Woody Allen lança sobre Barcelona é simplesmente preguiçoso. Ele garante,
no material de divulgação, que
a cidade é um personagem à
parte de seu filme -mas a afirmativa parece apenas protocolar, já que o que se vê na tela não
vai muito além de pontos turísticos que são visitados pelos
personagens.
Com uma narração em off
exagerada, que compromete o
ritmo da comédia, e algumas situações repetitivas, "Vicky
Cristina Barcelona" dá saltos
imensos quando entram em cena os dois personagens excêntricos: primeiro, o pintor vivido
por Bardem, e, mais tarde, sua
ex-mulher ciumenta e explosiva, interpretada por Penélope
Cruz. Ela, no entanto, dá muito
mais sorte do que ele. Logo o
personagem de Bardem torna-se um tanto enfadonho e pouco
coerente, enquanto a personagem de Cruz, alucinada, consegue ter uma vida que vai um
pouco além de uma mera peça
de xadrez que se movimenta
para a história caminhar -e garante os bons momentos de comédia que o filme tem.
VICKY CRISTINA BARCELONA
Avaliação: regular
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