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Mônica Bergamo
bergamo@folhasp.com.br
Museu em casa
Obras de arte confundidas com sofás ou varridas para debaixo do tapete como se fossem lixo: como são as casas dos aficionados que dividem espaço com dezenas de quadros, esculturas e instalações
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Marisa Cauduro/Folha Imagem
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PINTANDO O SETE
Na casa de Fernanda Feitosa, crianças e obras de arte convivem em harmonia
O cenógrafo José Marton, 42,
mora sozinho. Mesmo assim, se
dá ao luxo de acordar com Leda
Catunda, tomar café da manhã
com Vik Muniz, tomar banho
com Marepe e, antes de sair para trabalhar, ganhar um bom-dia de Iran do Espírito Santo e
de Rosângela Rennó.
Não, ele não transformou seu
apartamento de 260 m2, nos
Jardins, em uma hospedaria.
Mas enche a boca na hora de falar que mora com obras assinadas por todos esses artistas
plásticos e tantos outros de renome internacional.
"É muito bom viver rodeado
por energias e pensamentos diferentes", diz Marton, que tem
cerca de cem obras espalhadas
pela casa, sendo 33 em um único quarto. Outras 300 tiveram
de ser realocadas para o escritório na Barra Funda e para um
depósito.
"Quero comprar um outro
apartamento para poder expandir a coleção, mas tenho
mais impulso em comprar arte
do que um imóvel", diz Marton,
que vive de aluguel.
Na casa da advogada Fernanda Feitosa, diretora da SP Arte,
inaugurada na quarta-feira, a
coleção de mais de 350 obras de
artistas como Tunga, Adriana
Varejão, Pancetti e Iberê Camargo começou justamente
com a necessidade de preencher as paredes vazias. "A gente
foi gostando e se envolvendo
cada vez mais. Com o tempo, foi
preciso aprender a revezar os
quadros e a pendurar mais de
um por parede", diz.
Mas o aproveitamento espacial teve de ir além. Hoje, na casa de 600 m2, há instalações de
José Rufino sob a escada, esculturas de Amilcar de Castro
na beira da piscina, fotos de
Thomaz Farkas no lavabo e
quadros de Aguilar no quarto
do filho João Guilherme, 11.
"Nunca imaginei que fosse
colocar uma obra de arte no batente da porta, mas é melhor do
que deixar dentro do armário",
afirma ela, que garante nunca
ter tido problemas com as
crianças. "Eles sempre souberam respeitar."
Com boa parte de sua coleção
formada por arte contemporânea espalhada pela casa, José
Marton já teve de rebolar para
sair de situações inusitadas
com funcionários e convidados
que não conseguiram reconhecer as obras. "Um dia, uma pessoa se sentou na poltrona asséptica do Iran do Espírito Santo [formada por dois retângulos
de madeira pintados de branco
e que fica na sala, como forma
de provocação] achando que
era parte do mobiliário. Desde
então, coloco uma plaquinha
indicando que se trata de uma
obra", diz o colecionador.
Outra saia justa aconteceu
com a empregada que, na melhor das intenções, varreu parte de uma obra do coletivo dinamarquês Superflex, uma cadeira recortada cujos pedaços
ficavam espalhados pelo chão
da sala de jantar. "Tive que recuperar as peças no lixo. De lá
pra cá, ela me pergunta sobre
qualquer papel amassado antes
de jogar fora", conta, rindo.
Tamanho cuidado também
faz parte da rotina da faxineira
do casal de artistas plásticos
Sandra Cinto e Albano Afonso.
E não é para menos. No lar da
dupla, até mesmo uma bandeja
de café da manhã se transformou em obra de arte pelas
mãos de Alice Ricci. Na porta
da geladeira, o "puzzle" magnético é assinado por Julia Kater.
E os espelhos que emolduram
os interruptores de luz são criações de Reginaldo Pereira.
"Conviver com esses trabalhos é uma alegria. É como viver com uma parede de amigos", diz Sandra, que, por outro
lado, não tem sequer um porta-retrato em casa. "Cada peça
traz uma história, uma lembrança", completa ela, que incrementou sua coleção trocando obras com os amigos.
Poder relacionar sua história
com a de cada quadro ou escultura é o que faz uma casa repleta de arte ter uma atmosfera
completamente diferente de
uma galeria.
Foi exatamente essa sensação que fez o arquiteto David
Bastos deslocar boa parte da
coleção que ele mantinha em
Salvador, na Bahia -com obras
assinadas por artistas como Siron Franco, Carybé, Cildo Meireles, Lasar Segall e Di Cavalcanti- para seu novo apartamento em São Paulo.
"Quis trazer peças conhecidas para me fazer companhia e
dar um ar mais de casa", afirma
ele, que preencheu as paredes
do quarto com fotos de Christian Cravo, o banheiro com
uma tela de 2 m2 de Joaozito e a
entrada com uma foto de Tuca
Reinés e uma família de Exu de
Tatti Moreno. De novidades,
ele só se permitiu colocar, por
enquanto, obras de José Rufino e de Daniel Senise.
Há quem chegue a receber
grupos para visitação. Na época
de grandes exposições na cidade, Fernanda Feitosa costuma
fazer jantares "para reunir amigos e amigos de amigos que
querem ver as obras que temos.
No começo, achei estranho,
mas é muito comum. É a oportunidade de ver obras que não
estão no museu", explica.
Sempre disposto a receber
visitas guiadas, José Marton já
tentou incluir sua casa no roteiro de exposições paralelas à
Bienal. Foi vetado pela síndica
do prédio. "Quem sabe um dia",
diz. Enquanto isso não acontece, ele se contenta em emprestar suas obras para museus e
galerias do mundo todo.
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Reportagem JULIANA BIANCHI
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