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MÚSICA ERUDITA
Stanislav Bunin demonstra que pode mais do que sabe
ARTHUR NESTROVSKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
P or que Chopin? Cada pianista responde como sabe e
pode. Stanislav Bunin pode mais
do que sabe. Sua integral das "Baladas" e "Impromptus", terça no
Cultura Artística, foi uma demonstração dessa potência, traduzida em velocidade e volume.
Ele tocou mais notas numa noite do que a maioria dos pianistas
numa semana. É verdade que ficou devendo bom número delas,
nos torvelinhos da "Balada nº 1" e
de outras peças. Quando as coisas
ficam difíceis, ele baixa a mão esquerda com força espetacular;
baixa o pedal também, e a renda
delicada e aristocrática de Chopin
desaparece numa borrasca.
Nada disso chega a comprometer sua interpretação, porque não
chega a ser incoerente com ela:
seu Chopin é menos o poeta refinado das ambiguidades do que
um visionário à procura de revelações. E as revelações se confundem com esse drama de gestos
impetuosos, ataques à sensibilidade que a música acordou.
A organização do programa é
uma evidência de que Bunin tem
ambições mais altas. A sequência
da primeira parte, intercalando
duas "Baladas" e três "Impromptus", compôs uma progressão
cromática das tonalidades, da tônica à dominante.
E a segunda parte fez o retorno,
nos deixando a um passo de voltar ao início. É informação para
especialistas, mas deve ser perceptível para o bom ouvinte. A
música fez uma viagem circular.
Esse tipo de engenho formal
não ganha muito espaço na arte
de Bunin. Ainda bem: pois é um
pianista mais impulsivo do que
analítico. Infelizmente: pois seus
impulsos nem sempre multiplicam os sentidos da música.
Boa parte do interesse (ou, para
usar uma palavra do outro campo, da "mágica") das "Baladas"
vem da apropriação da narrativa
oral, da fábula popular, para a
música sem palavras. E não foi
sempre que essa dimensão literária das "Baladas" se deixou ouvir
na sua interpretação. Também a
heterofonia (o mesmo tema
soando, fora de fase, em duas vozes), que é onde Chopin mais demonstra sua inspiração bachiana, não chegou a interessar.
Bunin teve momentos de grandeza. Nem sempre os mais exuberantes; até, talvez, o contrário.
Seu "Impromptu nº 3" ou o início da "Balada nº 4" traduziram
Chopin para um mundo de contornos menos definidos, suspenso em harmonias sem chão. E as
explosões e tumultos foram impressionantes, a manopla esquerda tirando trombones do
piano, e a direita, um vendaval.
A impressão é de que ele sabe
menos do que pode. Pode-se admirar um pianista como Bunin,
mas não é um músico que fica na
memória, muito menos no coração (e não só pela antipatia pessoal, assinada com o gesto de fechar o tampo do piano logo após
o bis, dado a contragosto). Não
comoveu. Não iluminou. Foi
mais um Chopin, entre os infinitos que cabem na música.
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