São Paulo, segunda-feira, 17 de outubro de 2005

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ERUDITO

Pianista russo apresenta no Cultura Artística peças de Schubert e Liszt em dois concertos; ingressos estão esgotados

Arcadi Volodos sobrepõe espírito à técnica

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

O russo Arcadi Volodos, 33, é ao piano um recente e eloqüente fenômeno. Depois de estudar seriamente o instrumento por apenas dez anos, tornou-se solista das principais orquestras européias e norte-americanas. Apresenta-se hoje e quarta-feira na temporada da Sociedade de Cultura Artística -os ingressos estão esgotados para as duas sessões.
Volodos interpretará duas sonatas de Schubert, "Sonata em Mi Maior, d. 157" e "Sonata em Fá Menor, d. 625", e obras de Liszt, como "Vallée d'Obermann Anos de Peregrinação - Primeiro Ano" e "Il Penseroso Anos de Peregrinação - Segundo Ano", além de sua versão para "Rapsódia Húngara nš 13", deste último.
O russo é em muitos sentidos um pianista de idéias heterodoxas. Acredita bem mais em compreensão espiritual do que em técnica como forma de se aproximar do repertório. As pequenas liberdades que ele toma com os andamentos são irrelevantes diante de uma espécie de familiaridade amorosa com as sonoridades que ele produz.
A Rússia nos deu recentemente Evgeny Kissin. Volodos, um ano mais jovem, segue um caminho parecido, que nos surpreende e nos deixa com uma felicidade impactante, boquiaberta.
A seguir, a entrevista que ele concedeu à Folha.

Folha - Como explicar seu aprendizado tão rápido do piano?
Arcadi Volodos -
Até os 16 anos eu estudava para me tornar maestro de coral. Como era também preciso aprender um instrumento, a partir dos nove anos passei a fazer o piano. Mas era no conservatório uma cadeira suplementar. Só aos 16 anos passei a estudar para me tornar pianista.

Folha - E a rapidez de sua ascensão, como explicá-la?
Volodos -
Na verdade não senti como se isso tenha sido um problema. Nunca pensei muito em termos de técnica. Eu gostava de música. Há pianistas que aos seis anos já estudam intensamente. Não foi o meu caso. Consegui viver uma infância normal. Brincava com meus amigos e tinha uma rotina sem loucuras de estudo.

Folha - Quantas horas o sr. estuda por dia hoje?
Volodos -
Eu não tenho uma rotina. A rotina acaba matando nossas vontades. Quando tenho vontade, estudo bastante. Quando essa vontade não existe, não chego perto do piano. Ao voltar de alguma longa turnê eu passo duas ou três semanas sem estudar.

Folha - Mas depois de tantos dias não é difícil o recomeço?
Volodos -
É bastante fácil, porque me sinto refeito. O piano não é algo que exija a cronometragem das horas de trabalho. Bem mais importante é a intensidade do estudo. Uma hora de alta concentração pode me deixar absolutamente exausto. Há também o perigo de me entregar ao instrumento por um número excessivo de horas e perceber que minha espontaneidade foi prejudicada.

Folha - A expressão "escola russa de interpretação" tem para o sr. um significado preciso?
Volodos -
Na verdade, não. Há diferenças acentuadas entre os pianistas normalmente classificados como integrantes dessa escola. Seria esquisito afirmar que Glenn Gould, por ser canadense, pertencia à escola canadense de interpretação. Não creio que na música haja uma especificidade tão clara quanto na pintura, onde se pode falar do barroco flamengo, com Rubens e Rembrandt.

Folha - Quais os pianistas que o sr. mais escuta e admira?
Volodos -
Tenho preferências que independem da nacionalidade deles. Sempre gostei muito de Rachmaninov, de Alfred Cortot, Artur Schnabel, Walter Giezerking e, ainda, Arthur Friedheim.

Folha - O sr. gravou com apenas 28 anos o "Concerto nš 3" de Rachmaninov (Filarmônica de Berlim, direção de James Levine). Durante quantos anos o senhor estudou essa peça?
Volodos -
Há uma falsa legenda em torno desse concerto. É um concerto muito pianístico. Ele é fácil de ser interpretado. Rachmaninov foi um grande pianista, sabia escrever para piano. A dificuldade desse concerto é mais "espiritual", a de entrar em sua atmosfera. É um concerto muito intenso, muito dramático. Ele exige muita energia espiritual e não necessariamente energia técnica.

Folha - Que compositores o sr. considera tecnicamente difíceis?
Volodos -
Acredito com sinceridade que questões técnicas são próprias a computadores e aparelhos eletrônicos. Pode-se até falar em técnica, mas como uma imagem, como uma metáfora musical. A música não é compatível com a técnica.


Arcadi Volodos
Quando:
hoje e quarta, às 21h
Onde: Teatro Cultura Artística (r. Nestor Pestana, 196, região central, São Paulo, tel. 0/xx/11/ 3258-3344)
Quanto: de R$ 80 a R$ 180 (R$ 10 para estudantes com menos de 30 anos, meia hora antes das récitas); ingressos esgotados



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