São Paulo, segunda-feira, 17 de outubro de 2011

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ANÁLISE

Zé Vasconcellos foi um humorista de primeira

Trabalho na 'Escolinha do Professor Raimundo' serve para identificá-lo aos jovens, mas não pode ser a referência

HUGO POSSOLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A morte de Zé Vasconcellos fez despencar clichês e equívocos que multiplicam por mil a tristeza pela sua perda.
A hipocrisia sempre salta quando, após a morte de uma pessoa famosa, tentam glorificar seus feitos. Pois Zé Vasconcellos foi tratado durante boa parte de sua vida como um fracassado, devido ao insucesso em montar uma Disneylândia à brasileira, a sua Vasconcellândia.
Como nossa colonização foi de exploração, qualquer um que queira empreender nestes trópicos é rotulado, em geral, de oportunista. E o sonho de construir algo que se dane. Triste cultura a nossa.
Adoramos superação, mas não há páginas de jornal que consigam revelar o quanto essa pessoa teve que se superar quando encarou a dor do fracasso. Zé Vasconcellos sempre recebeu sarcasmo da imprensa e de colegas de ofício. Vou eu ao clichê: reconhecimento deve ser em vida!
Destacar Zé Vasconcellos pela "Escolinha do Professor Raimundo" até serve para identificá-lo aos mais jovens, mas não pode ser a referência. Ele levou suas piadas e personagens ao Brasil inteiro, dos anos 50 até há pouco.
Sua criatividade, talento para escrever e capacidade em fazer vozes e prosódias precisam ser contextualizados, para não diminuí-lo.
Não adianta os moralistas afirmarem que o humor do Zé era familiar e sem grosserias. Chega de "humorfobia"!... É da natureza do humor desvendar o que a sociedade tenta esconder. E, em geral, ela esconde suas baixarias.
Dizer que o Zé foi o primeiro "stand-up" também traz uma carga de submissão terceiro-mundista. Ele trouxe, com grande capacidade, a herança do rádio e dos chamados números de cortina do teatro de revista.
"Stand-up", "clown" e "one man show" são expressões bregas, estrangeirismos que desvalorizam nossa capacidade de ser quem somos.
E Zé Vasconcellos foi o que foi. Um humorista de primeira num país que faz questão de ser de terceira, incapaz de reconhecer seus gênios.

HUGO POSSOLO, 49, é palhaço, dramaturgo, diretor dos Parlapatões e do Circo Roda e autor de "Palhaço-Bomba"



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