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"SWEET MOVIE"
Diretor iugoslavo filma Eros contra repressão dos instintos
TIAGO MATA MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Eros contra a civilização.
"Sweet Movie" (1974), do iugoslavo Dusan Makavejev, é, como indica o seu título, um filme
(doce) contra todos os regimes,
mas nem tanto no sentido político. A repressão de que o filme trata não é apenas política, mas cultural: a repressão dos instintos.
Nessa perspectiva, Makavejev
mira nos regimes políticos da
Guerra Fria para acertar na própria civilização. Ao menos se a entendermos aqui em seu sentido
freudiano, como coação cultural
dos instintos naturais do homem.
O objetivo desse filme, dizia o diretor, é fazer renascer em todo o
espectador "o animal pleno de
alegria e prazer". "Sweet Movie" é
uma derivação do filme anterior
de Makavejev, sua obra-prima,
"Wilhelm Reich - Os Mistérios do
Orgasmo".
A revolução que Makavejev, ex-estudante de psicologia, ambiciona é reichiana, uma revolução sexual que, aqui voltada contra o
belicismo das ideologias, poderia
ser sintetizada no velho lema: "Faça amor, não faça guerra".
Para tal, o diretor iugoslavo atira antes tanto para a esquerda
quanto para a direita, traçando,
ainda em plena Guerra Fria, uma
alegoria sempre um tanto ligeira
de ambos os regimes. A ex-União
Soviética já era então vislumbrada
como uma nau à deriva. Com a
mãe Rússia, uma viúva negra que
devora marinheiros e come criancinhas, na direção e a cabeça de
Marx (chorando) na proa, esse
navio alegórico já se dirigia, apinhado de cadáveres, ao fim.
Já os americanos são representados pela velha caricatura do milionário industrial ignorante e
grosseirão que conta com a hipocrisia de sua sociedade para legitimar suas cafajestagens. Num concurso de TV promovido pela Liga
do Cinto de Castidade (associação
que desenvolveu um "método
sensacional" para extinguir os
"impulsos animais" das pessoas),
o milionário do "pênis de ouro"
encontra a noiva ideal na figura de
uma doce virgem canadense.
Makavejev logo deixa suas pretensões satíricas de lado para se
concentrar na iniciação libertina
da jovem canadense. O périplo da
personagem, de virgem reprimida a ninfômana resolvida, resume
a proposição do filme. Depois de
deflorada e descartada pelo americano, ela lega seu corpo ao sexo
antes de ir parar numa comunidade cujos integrantes parecem
decididos a voltarem à fase oral da
infância.
Contra a higiene dos puritanos,
Makavejev afirma aqui a mais pura escatologia. "Sweet Movie" pode ser, afinal, um filme um tanto
grosseiro, feio e datado, mas é, de
certo, visceral e de uma ousadia
que já não se vê nestes tempos de
repressão politicamente correta.
Sweet Movie
Sweet Movie
Direção: Dusan Makavejev
Produção: França/Canadá/ Alemanha,
1974
Com: Carole Laure, Pierre Clementi
Quando: a partir de hoje na Sala UOL de
Cinema e no Vitrine
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