São Paulo, Sexta-feira, 17 de Dezembro de 1999


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LITERATURA
Cervantes vai para memorialista político

SYLVIA COLOMBO
Editora-assistente da Ilustrada

O escritor chileno Jorge Edwards, 68, que venceu o Prêmio Cervantes deste ano, anunciado terça-feira última em Madri, é um adepto dos romances históricos e renega o realismo mágico, vertente tão difundida na América Latina por nomes como o cubano Alejo Carpentier, o colombiano Gabriel García Márquez e os argentinos Jorge Luis Borges e Julio Cortázar.
Edwards, que prefere se definir como um memorialista ou um historiador da vida privada, admite que sempre trabalhou com a tênue linha que separa a ficção da não-ficção.
Desde o início de sua carreira, nos anos 50, Edwards se dedicou a satirizar a oligarquia chilena e as contradições da sociedade, tendo a história política do país como agente transformador de comportamentos.
O prêmio, concedido pelo Ministério da Cultura espanhol, chega num momento delicado das relações diplomáticas entre o Chile e a Espanha. O país latino-americano não aceita a posição da Justiça espanhola, que quer julgar o ex-ditador chileno Augusto Pinochet em Madri por crimes de tortura e conspiração cometidos durante o período em que ele esteve no poder no Chile (1973-1990). O general está detido em Londres desde outubro de 98, correndo o risco de ser extraditado.
O escritor peruano Mario Vargas Llosa, membro da comissão julgadora do Prêmio Cervantes, negou que a decisão de premiar Edwards esteja relacionada com a questão diplomática entre Chile e Espanha.
Porém, o próprio Edwards disse ao jornal "El País" que a premiação poderia ser vista como um gesto da Espanha para mostrar que o caso Pinochet não significa um ataque a todos os chilenos.
A história política da América Latina sempre esteve presente na obra de Edwards. Seu livro mais famoso, "Persona Non Grata" (1973), foi escrito a partir da experiência que o autor teve ao exercer um cargo diplomático em Cuba em 1970, durante o governo socialista de Salvador Allende no Chile.
Edwards deixou de ser um admirador de Fidel Castro para, aos poucos, assumir uma postura crítica ao seu regime.
Depois do golpe militar que derrubou Allende, em 1973, Edwards foi para o exílio na Espanha, fixando-se em Barcelona.
A questão da ruptura de valores, tema de seus romances políticos, também invade obras que tratam de questões morais e sociais, como o sexo e a pobreza.
Sem abandonar o estilo, Edwards usou a política para comentar a premiação. Logo após a divulgação, o autor declarou à imprensa: "Parece que sou eu o único vencedor". O autor se referia ao empate entre os candidatos a presidente do Chile no primeiro turno das eleições, no último final de semana (o esquerdista Ricardo Lagos e o conservador Joaquín Lavín).

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