São Paulo, segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

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Exposição compara brasileiros e japoneses

Em ano do centenário da imigração, MAM-SP reúne produção dos 2 países

A curadora japonesa Yuko Hasegawa vai mostrar obras de artistas, estilistas e arquitetos no museu e levará brasileiros ao Japão

Divulgação
'Hoops', de Atsuko Tanaka, que deve entrar na mostra


SILAS MARTÍ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Quando Cildo Meireles a recebeu de bermuda em seu ateliê, no Rio, Yuko Hasegawa perguntou chocada se os "trajes sumários" eram o uniforme do artista carioca. Mas o recato e o 1,50 m da curadora japonesa não dão idéia de sua estatura no mundo da arte.
Hasegawa foi curadora da Bienal de Istambul, fundou o Museu de Arte do Século 21 em Kanazawa, no Japão -com um projeto arquitetônico entre os mais ambiciosos do mundo-, e hoje é curadora do Museu de Arte Contemporânea de Tóquio (MOT), para onde pretende levar 36 artistas brasileiros numa grande mostra em 2008.
Mas, antes disso, Hasegawa monta no MAM-SP um panorama da arte contemporânea brasileira e japonesa, englobando também os campos do design, da moda e da arquitetura. Parte das comemorações do museu para o centenário da imigração japonesa -que começou com a individual da fotógrafa Rinko Kawauchi em julho-, a mostra que começa em abril é uma das mais significativas no calendário de 2008.
A Folha teve acesso à lista de artistas que participam da exposição. Vão ocupar as salas do MAM obras dos brasileiros Cildo Meireles, Hélio Oiticica, Lina Bo Bardi, Beatriz Milhazes, Vik Muniz, Marepe, Lucia Koch e Leonilson, entre outros.
Numa comparação, cada obra será exposta ao lado do trabalho de um artista japonês, entre eles o estilista Issey Miyake, o grupo Sanaa, Shigeru Ban e Takashi Murakami.
Embora ainda não tenha confirmado todos os nomes, a curadora pretende levar 20 artistas de cada país ao MAM.
Hasegawa passou uma semana no Brasil no início do mês. Foi sua terceira viagem ao país nos últimos dois anos. Ela visitou o acervo de Hélio Oiticica, no Rio, reuniu-se com artistas da galeria Vermelho e da Casa Triângulo, encontrou o estilista Jum Nakao e visitou a Casa de Vidro de Lina Bo Bardi, em São Paulo.
O roteiro revela o ecletismo da exposição que pretende montar. Na leitura que faz da arte brasileira e japonesa de hoje, ela aponta a mistura de suportes e a fusão das áreas de atuação. Ao mesmo tempo, desmonta um estereótipo do Japão high-tech ao identificar lá, como aqui, uma apropriação da rotina e elementos do dia-a-dia na linguagem desses artistas. "A geração de artistas dos anos 90 é muito focada em comunicação, quer abrir a arte que faz para um público mais amplo. É por isso que usam materiais banais e baratos", explica Hasegawa à Folha, por telefone, de Tóquio.
Ela nega, porém, que os japoneses tenham adotado a "arte da gambiarra", fenômeno atual da arte brasileira, marcado pela improvisação e pelo uso de materiais precários.
"Ela não está buscando a gambiarra. Ela está falando de elaborações a partir de momentos do cotidiano que são mais banais, mas isso não quer dizer que eles tenham soluções da gambiarra. Eles conseguem alto grau de acabamento nessas situações", completa Felipe Chaimovich, curador do MAM.
"Uma semelhança entre Brasil e Japão é que são países com grandes mercados culturais, além da rapidez com que se modernizaram, o que os torna muito sensíveis a culturas estrangeiras. Por isso há uma forte hibridização", diz Hasegawa.

Em paralelo
Maquetes e desenhos de Lina Bo Bardi, entusiasta da transparência e da leveza, serão comparados a projetos da dupla Sanaa, que apresentam aqui "Flower House", uma grande casa com paredes de vidro em formato de flor, em harmonia explícita com a natureza.
Para Hasegawa, é um exemplo da atualização do cânone modernista para a arte de hoje, tendência observada entre artistas japoneses e brasileiros. "O que aconteceu nos anos 50 e nos anos 60 é incorporado pelos artistas de hoje, que tentam atualizar as experiências daquele período", diz.
Dessa forma, a arte participativa de Hélio Oiticica ganha um paralelo com o projeto de Ruy Ohtake, que pintou com tintas coloridas as casas da favela de Heliópolis, na zona sul de São Paulo. Shigeru Ban, que montou um espaço expositivo de papelão em Nova York, também entra na comparação.
Os bordados e arte delicada dos japoneses Zon Ito e Ryoko Aoki são comparados à obra inquieta e lírica de Leonilson, que costurou o sofrimento e sua interpretação do mundo em bandeiras e trapos.
Os vestidos de material reciclado de Jum Nakao, que já levou roupas de papel à passarela, entram em paralelo com a obra do estilista Issey Miyake, que faz vestidos sem costura, apenas com cortes no tecido.

Lá e cá
Hasegawa revelou que teve de mudar os planos para a exposição várias vezes. Quando cogitaram realizar a mostra na Oca, ela pensou em grandes instalações. Depois teve de readaptar a escala dos trabalhos para o espaço menor do MAM.
Ela adianta que em Tóquio, porém, será do seu jeito. Convidou Beatriz Milhazes para intervir na fachada do MOT e Ernesto Neto e Cildo Meireles para trabalhar no espaço interno. "O museu no Japão é muito grande. Vou poder mostrar toda a potência da criatividade brasileira", comemora.


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