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O REI DOS REIS
Herchcovitch contesta a idéia de "moda brasileira"
DA REPORTAGEM LOCAL
Dez anos de desfiles na São
Paulo Fashion Week e mais de
uma década de trabalho não
enfraqueceram o espírito de
novidade e ousadia que Alexandre Herchcovitch representa para a moda brasileira. O
estilista de 35 anos que veio do
underground e se tornou um
dos casos mais bem-sucedidos
de estilista-empresário, com
sete licenciamentos de grande
porte de sua marca, continua
imperando como o símbolo
da vanguarda fashion no país.
Nesta temporada ele preparou uma coleção inspirada na
Renascença. "A partir desse
tema, introduzi elementos
muito contemporâneos, relendo coisas que fiz antes", conta.
A seguir, ele contesta o conceito de moda tipicamente
brasileira e indica o desafio futuro dos estilistas do país: entender melhor os brasileiros.
Folha - Quando você cria, pensa em fazer moda brasileira?
Alexandre Herchcovitch -
Nunca. A brasilidade do meu
trabalho existe apenas pelo fato de eu ter nascido aqui. Tudo
o que produzo já vem com a
característica de ser o trabalho
de um homem, judeu, descendente de poloneses e brasileiro, sem precisar que eu busque
expressar isso ou aquilo.
Folha - Mas você acha que
existe uma moda brasileira?
Herchcovitch - Você acha que
o Saint Laurent, ao criar, pensava em fazer moda francesa?
Duvido. E ninguém olha a
roupa dele ou do Lacroix e diz:
"Nossa, que moda francesa!".
Não entendo por que as pessoas insistem tanto nisto. Às
vezes os jornalistas me perguntam: "Você está exportando porque seu produto é exótico, é brasileiro?". Não é. Eu luto para provar que o Brasil não
é apenas uma tendência.
Folha - O Brasil ainda é uma
tendência internacional?
Herchcovitch - Não acho que
seja mais. Agora, só vão sobreviver os que tiverem um estilo
próprio, que independa de seu
país e cujo trabalho tenha consistência e uma constância
muito grande. No exterior,
nem sabem direito onde é o
Brasil. Eles perguntam: "Nossa, tem moda no Brasil? Tem
loiras?". Veja o que enfrentamos lá fora: temos que mostrar a roupa, mas, antes, ensinar onde é o país.
Folha - O Brasil tem estilistas
de estatura internacional?
Herchcovitch - Tem. O grande problema é que, lá fora,
ninguém perdoa se você copiou ou teve uma referência
muito clara. E ainda existem
no Brasil estilistas que fazem
referências muito nítidas ao
que está sendo feito no exterior. Com a globalização, eles
identificam de cara e acham
que você é um subproduto. O
estilista, então, tem que decidir se vai ser copiador ou criador, com uma moda mais autoral. Não é problema você copiar. O problema é copiar e dizer que é criador. Para ser um
criador de moda, você tem que
se policiar o tempo todo.
Folha - Você se policia?
Herchcovitch - Sim, muito.
Mas eu também não costumo
fazer o que é tendência e o que
as pessoas querem. Eu faço o
que eu quero, e as pessoas é
que têm que gostar ou não.
Folha - O que falta ainda aos
estilistas brasileiros?
Herchcovitch - O estilista, hoje, precisa ser também um empresário. Se ele não souber
quanto custa um botão, não
vai para a frente. Já acabou a
época daquele estilista antigo
que fazia um croqui e ia embora para casa, com dor de cabeça. Você também tem que ter
humildade e saber que não
trabalha sozinho. Além disso,
falta entender melhor a condi-ção de vida dos brasileiros, que
dinheiro têm para gastar com
roupa. Muita gente cria roupas
que não são para o Brasil, seja
porque são caras, seja porque
são quentes. Há muita inadequação do produto com a realidade do país. Se você quer
crescer fazendo roupa no Brasil, primeiro tem que entender
os brasileiros.
(ALCINO LEITE NETO E VIVIAN WHITEMAN)
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