São Paulo, quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

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Crítica/cinema/"Babel"

Trama segmentada explora movimentos no tempo e no espaço

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

Como em "Amores Brutos" (2000) e "21 Gramas" (2003), as duas parcerias anteriores entre o diretor Alejandro González Iñárritu e o roteirista Guillermo Arriaga (que escreveu também "Três Enterros", de Tommy Lee Jones), o espaço e o tempo são movediços em "Babel".
Os três núcleos da trama -no deserto do Marrocos, na fronteira dos EUA com o México e em Tóquio (Japão)- se alternam sem que, de início, haja ligação entre eles. As convenções narrativas sugerem que os eventos de cada subtrama ocorrem simultaneamente.
Nem uma coisa nem outra -e o espectador já familiarizado com a estrutura circular dos filmes de Iñárritu e Arriaga tem motivos para esperar por isso.
Aqui, no entanto, as conexões e ilusões são menos complexas, como se o virtuosismo do entrelaçamento fosse secundário em relação à força dramática individual dos segmentos.
Dois deles são pautados por um tom de tragédia anunciada que já se vislumbra quando um rifle vai parar nas mãos de dois garotos marroquinos e uma governanta mexicana resolve viajar dos EUA para seu país com duas crianças que não são suas.
Telegrafar o andamento compromete o resultado porque as estratégias de sedução de Iñárritu e Arriaga costumam se alimentar da vertigem do desconhecido -e, nesses dois núcleos, renunciam um pouco a ela, como bem o demonstra a esquemática via-crúcis marroquina do casal de turistas americanos (Brad Pitt e Cate Blanchett).
Em contrapartida, a força do núcleo japonês vem do fato de que tudo ali é ambíguo, incerto, tortuoso e, em boa medida, irremediável. Há personagens mais ricos -um pai distante (Kôji Yakusho) e sua filha adolescente (Rinko Kikuchi)-, exploração mais radical das dificuldades de comunicação, intervenções do passado no presente.
Além da idéia-base contida no título, o que mais integra no conjunto as três subtramas é a distinta beleza formal com que Iñárritu as ergue, com a ajuda valiosa de outros dois parceiros regulares, o diretor de fotografia Rodrigo Prieto e o compositor Gustavo Santaolalla.
Nos filmes de Iñárritu, o mundo parece muitas vezes inapreensível e sujeito a desígnios superiores graças à dramaturgia e à combinação de imagens e música segundo movimentos errantes, voltados para deixar significados em aberto, sem conduzir a lugar nenhum específico.
É o que ajuda a entender por que, no mercado norte-americano, ele foi vendido como o "filme sério" da temporada, preocupado com temas sociais urgentes e com uma visão artística incomum em Hollywood. De fato, a sobreposição de situações aponta para diversas idéias, algumas divergentes, mas o que sustenta mesmo "Babel" lembra a eloqüência dos contadores de história cuja contação é mais atraente do que a história em si.


BABEL    
Direção: Alejandro González Iñárritu
Produção: EUA, México, 2006
Com: Brad Pitt, Cate Blanchett
Quando: estréia amanhã nos cines Bristol, Jardim Sul e circuito


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