São Paulo, sexta-feira, 18 de fevereiro de 2005

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FOTOGRAFIA

Maison des Amériques Latines abre mostra sobre a cidade brasileira

Paris assiste a construção e "diluição" da capital Brasília

EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Coube a Oscar Niemeyer e às formas de Brasília, ícone do movimento moderno e obra máxima do arquiteto, inaugurar a ponte que celebrará a cultura brasileira em mais de 450 diferentes atividades durante este Ano do Brasil na França. Ontem, foi oficialmente aberta a mostra fotográfica "Brasilia: Une Metaphore de la Liberté" (Brasília, uma metáfora da liberdade), dos fotógrafos Jair Lanes, 37, e Alberto Ferreira, 72, na Maison des Amériques Latines, em Paris.
Desde sua inauguração, em 1960, Brasília atrai artistas, estudantes de arquitetura e fotógrafos de todo o mundo que querem presenciar os volumes e os vazios daquilo que, segundo Paola Antonelli, curadora de arquitetura e design do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York), "é a realização mais dramática da grandiosidade e do narcisismo do movimento moderno".
Para o curador da mostra e diretor da Maison des Amériques Latines, o brasileiro Luiz Ferreira, a escolha de Brasília como tema para iniciar o Ano do Brasil na França se deu "porque a cidade representa nosso país no seu aspecto contemporâneo, voluntariamente voltado para o futuro. Ao mesmo tempo, o público francês se interessa por esta cidade saída do nada, construída em cinco anos e badalada nas imagens do filme "O Homem do Rio", de Philippe de Broca, com Jean-Paul Belmondo, nos anos 60".
A "cidade saída do nada" pode ser percebida melhor nas imagens de Alberto Ferreira, enquanto o "aspecto contemporâneo" está mais fluído no trabalho de Lanes.
Alberto Ferreira, que em 1960 trabalhava no "Jornal do Brasil", foi um dos muitos fotógrafos que acorreram ao Planalto Central para documentar o reluzente nascimento da cidade feita de concreto e vidro em meio ao cerrado. Graças à pesquisa realizada por Luiz Ferreira, as imagens de Alberto Ferreira -não há parentesco entre eles-, somam-se agora às já lendárias fotografias da construção e inauguração da capital federal realizadas por Thomaz Farkas e Marcel Gautherot (1910-1996).
O trabalho de cunho jornalístico e documental de Alberto possui alguns preciosismos como a imagem que ilustra o convite da mostra, na qual vemos apenas os pés calçados de pessoas sentadas sobre uma marquise, na verdade uma das muitas arestas criadas por Niemeyer, que serve também de ponto de contemplação para o Palácio do Itamaraty, que se vê ao fundo. Toda a cena é duplicada pelo reflexo do espelho d'água, resultando numa imagem em caleidoscópio, uma vertigem visual.
Dessa forma, a abordagem de Alberto Ferreira se vale da linguagem da fotografia moderna para retratar seu equivalente na arquitetura. "Uma visão ao mesmo tempo jornalística, artística e social", segundo o curador.
"O Silêncio das Formas" é o título do extenso ensaio realizado por Jair Lanes durante várias visitas à cidade. O uso de uma câmera polaróide acrescida de filtros coloridos colocados na frente da lente, além do uso deliberado do desfoque, remete o conjunto das imagens à tradição da fotografia pictórica, na qual há uma busca de confluência dos conceitos da própria fotografia com a pintura.
Trata-se de uma visão lírica sob a qual as formas desenhadas por Niemeyer têm seus contornos esmaecidos e perdem a solidez do concreto. É como se Lanes partisse não da obra acabada do arquiteto, mas sim dos desenhos da prancheta deste. O uso dos filtros coloridos cria uma atmosfera falsa, uma luminosidade estranha que reforça ainda mais o impacto de Brasília como uma cidade "saída do nada", como assinala o curador, ou mesmo como uma cidade-maquete. O que, para Alberto, Ferreira era construção em 1960, para Lanes, é apenas diluição no século 21.
Antes de chegarem à exposição, as imagens de Lanes foram publicadas nas revistas "Big" (EUA) e "Minotaure" (França) -seis delas foram adquiridas pelo Museu de Fotografia de Houston (EUA). Agora tanto seu ensaio quanto o de seu companheiro de mostra serão transformados em livros pela Editions de L'Oleil e estarão à venda durante a exposição.
No segundo semestre a fotografia brasileira estará presente na França com mostras de Pierre Verger, Sebastião Salgado, Miguel Rio Branco e da ONG Olhares do Morro, uma agência de fotografia criada pelo francês Vincent Rosenblat com adolescentes do morro Dona Marta, no Rio de Janeiro.


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