São Paulo, quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

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COMIDA

Edição limitada

Cafés nacionais produzidos em pequenos lotes e com notas altas em concursos internacionais viram atração em cafeterias do país

CRISTIANA COUTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Depois de apostar em cafés de diferentes origens e divulgar os vários métodos de preparar a bebida, as cafeterias estão voltando os olhos para um novo segmento dos grãos de qualidade. Produzidos com extremo cuidado, em edições limitadas e sob condições especiais de clima e de solo, eles têm em comum características únicas de aroma e sabor, que os colocam na elite dos cafés brasileiros.
"São cafés que, pela complexidade que apresentam, ganham notas acima da média dos grãos especiais", diz a barista Isabela Raposeiras, do Coffee Lab, que desde o ano passado oferece em sua cafeteria-laboratório seis opções desse tipo (confira os cafés ao lado).
Assim como Isabela, o Suplicy, em São Paulo, acaba de lançar duas opções de cafés que chegam a custar até quatro vezes mais do que os de marca própria. "Os clientes já estão preparados para perceber as sutilezas desses produtos", avalia o dono, Marco Suplicy.
Essas nuances podem ir desde sabores que lembram caramelo até aromas de pétalas de rosas e notas sutis de papaia. "Atributos importantes como doçura e acidez também são mais perceptíveis em cafés de alto nível", diz Georgia Franco, da Lucca Cafés Especiais, de Curitiba, pioneira nessa oferta.
Em março, a rede oferecerá 22 preciosidades, garimpadas por Georgia em concursos regionais e nacionais. O destaque deste ano é o quinto colocado do Cup of Excellence, o mais importante concurso de cafés brasileiros, cujos finalistas são disputados em leilão virtual. Uma saca (60 kg) vencedora pode chegar a custar R$ 15 mil contra R$ 360 de uma saca de café gourmet. Por isso quase toda a produção é absorvida pelo mercado externo.
Os concursos funcionam como uma vitrine para os produtores desses microlotes, como são tecnicamente chamados esses cafés de uma única variedade, plantados em um mesmo ano em uma parcela de terra de características bem definidas.
"Lotes menores têm melhores chances de atingir parâmetros importantes de qualidade, como a uniformidade e a maturidade dos grãos", ensina o engenheiro químico e especialista em cafés Ensei Neto.
Num paralelo com o mundo dos vinhos, os microlotes equivalem a um grand cru de Borgonha e, quando degustados por especialistas do calibre de Robert Parker, o famoso crítico de vinhos norte-americano, é desejável que alcancem, no mínimo, 88 pontos (numa escala de 100). "Apenas cerca de 100 mil sacas brasileiras alcançam esse nível", contabiliza Silvio Leite, um dos mais conceituados provadores de cafés do país. Para ter uma ideia do quanto esse volume representa, o Brasil produzirá, neste ano, cerca de 50 milhões de sacas de café de todos os tipos.

Tendência
Microlotes são um fenômeno relativamente novo no mundo dos cafés especiais, mas já se tornaram tendência em mercados mais "maduros", como Escandinávia, Estados Unidos e Japão. "São pequenas torrefações e cafeterias que se dedicam a procurar os melhores cafés disponíveis", diz Isabela.
No Brasil, os especialistas já identificam microclimas que se destacam na produção desses lotes. Vale da Grama, na região da Mogiana paulista, Carmo de Minas, na Serra da Mantiqueira, Matas de Minas e, recentemente, uma área na Chapada Diamantina (BA), são consideradas "minas de ouro". "Mas ainda há muito o que explorar", acredita Leite.
Algumas dessas joias foram recentemente descobertas. É o caso do café da fazenda Chapadão de Ferro, produzido em região de solo vulcânico e a altas altitudes, vendido no Suplicy, e o singular maracatuaí, desenvolvido na fazenda Baú a partir de sucessivos cruzamentos de duas variedades. "Ele tem a picância da pimenta-da-Jamaica e um final doce e prolongado", diz Isabela, que conseguiu duas das 15 sacas produzidas.
Mas a alta qualidade desses cafés não se deve apenas à variedade escolhida e à natureza privilegiada. Tão importante quanto a matéria-prima é o seu processamento. Se mal conduzido, pode arruinar o sabor da bebida na xícara.
"Não adianta comprar microlotes se não tiverem o tratamento adequado", alerta Georgia, que, como Isabela e o Suplicy, torra seus grãos. O cuidado na torra, que desenvolve os aromas e os sabores do café, e a apresentação de um produto fresco nas prateleiras são fatores decisivos para apreciar a delicada bebida.


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