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ENTREVISTA
LOBO ANTUNES
"Penso em fazer mais um livro e calar-me"
Escritor português, que vem ao Brasil, fala sobre novo romance e a possibilidade de aposentadoria
Tiago Vicente-9.ago.07/Itspress Brainpix Group
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António Lobo Antunes, 66, completa três décadas de estreia no mundo literário
FABRICIO VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Aos 66 anos, o escritor português António Lobo Antunes comemora três décadas de estreia
no mundo literário. Foram 20
romances, prêmios e a consolidação de uma reputação de difícil e genial. Após acabar sua 21º
obra, a ser publicada no segundo semestre, Antunes começa a
considerar a aposentadoria.
"Estava a pensar em fazer apenas mais um livro e depois calar-me", afirmou. O autor vem à
Festa Literária Internacional
de Parati, em julho. De Lisboa,
falou com a Folha, por telefone. Leia trechos da entrevista:
FOLHA - Há quantos anos o sr. não
visitava o país?
ANTÓNIO LOBO ANTUNES - A última vez que estive no Brasil foi
em 1983. Eu tento não viajar
muito, tenho de escrever. Convidam você porque escreve,
mas, se começa a aceitar os
convites, não tem tempo para
escrever. O Brasil é uma questão pessoal para mim, meu sangue vem todo daí. Meu avô nasceu em Belém do Pará. Agora
retorno para participar da Flip,
onde não sei o que me espera, e
depois provavelmente passarei
em São Paulo, mas isso dependerá dos planos da editora, que
ainda não sei ao certo quais são.
FOLHA - Vir aqui ajuda a aproximar
os leitores brasileiros de sua obra?
LOBO ANTUNES - Não estou muito preocupado com a promoção
da minha obra. Não sou caixeiro viajante, isso não me interessa. Quero ver os amigos que aí
tenho, alguns familiares.
FOLHA - Muitos livros seus permanecem inéditos aqui. Por quê? Seu
primeiro livro, "Memória de Elefante" (1979), ganhou uma edição nacional há apenas poucos anos...
LOBO ANTUNES - Eu não deixava
publicar esse primeiro livro por
aí. Nesse caso, a culpa não é do
Brasil, a culpa é minha porque
era um primeiro livro, eu nunca
o tinha relido e parecia-me estar muito confiante dos defeitos dele. Depois fui ler o livro e
até gostei, mas é escrito por outra pessoa, minha ideia do que é
um livro agora é muito diferente do que era naquele tempo.
FOLHA - E depois de 20 livros há
medo de começar a se repetir?
LOBO ANTUNES - Claro que tenho
medo. Não sei se tenho ainda
muito ou pouco a criar, mas estava a pensar em fazer apenas
mais um livro e depois calar-me. Não há nada mais terrível
do que ver a decadência de um
bom escritor. Olha os últimos
romances do Faulkner ou os últimos contos de Hemingway.
FOLHA - E o livro que terminou há
pouco? Há previsão de publicação?
LOBO ANTUNES - Esse novo livro
em outubro deve estar a sair
aqui em Portugal. No Brasil não
sei, não depende de mim. Escrevi esse livro por causa do título, algo que não costuma
ocorrer. Eu estava ouvindo modas, que são canções de camponeses. Era uma moda do século
19, de camponeses analfabetos
que nunca viram o mar. E seus
dois primeiros versos são: "Que
cavalos são aqueles/que fazem
sombra no mar?" E esses dois
versos ficaram em mim, impressionaram-me mesmo, foram o clique que fez o livro começar a sair. Achei esses versos
espantosos e viraram o título.
FOLHA - De que trata esse livro?
LOBO ANTUNES - Não gosto de falar dos livros, não é possível falar deles. Se pudesse resumir
um livro em cinco minutos, para que escrevê-lo? O que me interessa é que as páginas sejam
espelhos em que a gente se veja,
é meter a vida inteira entre as
capas de um livro.
FOLHA - Acompanha o que tem sido feito atualmente na literatura?
LOBO ANTUNES - Não conheço
muito do que está sendo feito,
mas não vejo na nossa língua
grandes escritores atualmente.
FOLHA - Nem em Portugal?
LOBO ANTUNES - Em Portugal
tem eu (risos). Já chega, não?
Agora falando sério, embora o
que eu disse seja verdade (risos). No século 19, a gente tinha
30 gênios escrevendo ao mesmo tempo, em França, Alemanha, Rússia. Agora, se descobrir
cinco grandes escritores no
mundo inteiro já está muito
bom. Não há, é dramático.
FOLHA - Muitos consideram os
seus livros experimentais, difíceis...
LOBO ANTUNES - Fico espantado
em ouvir isso. Os livros para
mim são tão claros! Não compreendo as pessoas que digam
isso, penso que tem a ver com
hábitos de leitura. Fazemos um
trabalho completamente impossível que é o de tentar transformar em palavras coisas que
são anteriores às palavras, pulsões, emoções. Difíceis eu não
acho. Eu me lembro de aos 20
anos ver os filmes do Bergman
e me chatearem pra burro. Agora me comovem até as lágrimas: era eu que não estava preparado para o Bergman.
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