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LIVROS
Crítica/"Os Sonhos de Grete Stern"
Obra exibe viagem onírica de Stern
Livro reúne montagens de alemã para ilustrar interpretações de sonhos em revista argentina; imagens estão no Lasar Segall
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
Décadas antes de a tecnologia digital permitir a manipulação de
fotografias sem deixar rastros
perceptíveis para não profissionais, na busca por aproximar o
simulacro do real, a alemã Grete Stern (1904-1999), radicada
na Argentina de 1936 até a sua
morte, usou a fotomontagem
para obter efeito contrário: o de
criar imagens oníricas que, artifício exposto, investiam em
uma "miscelânea imaginária".
O termo foi usado pela pesquisadora portuguesa Margarida Medeiros no catálogo de
uma exposição de Stern em Lisboa, em 1997. Ao lembrar que a
fotomontagem foi "uma das
técnicas privilegiadas pela estética dadaísta e surrealista", ela
observa que "a ideia de "colar"
imagens" oferece "veículo ideal
para sugerir o tumulto das
emoções recalcadas".
Parte desse universo -46
obras realizadas por Stern, de
1948 a 1951, para a revista argentina "Idilio", hoje no acervo
do Instituto Valenciano de Arte
Moderna- revive na mostra
"Os Sonhos de Grete Stern: Fotomontagens", em cartaz até 28
de junho no Museu Lasar Segall
(r. Berta, 111, tel. 0/xx/11/5574-7322; entrada franca).
O catálogo inclui, em tamanho menor, outras 102 obras da
mesma série, que ilustrava a seção "A Psicanálise Vai Ajudá-la", dedicada à interpretação de
sonhos. "Era um momento em
que os conceitos de ideias psicanalíticas se inseriam em todas as camadas sociais, e a referida página foi recebida com
agrado pelo público leitor, majoritariamente feminino", diz
Stern em "Anotações sobre a
Fotomontagem", texto de 1967
incluído no catálogo.
"Pedido de interpretação"
Sob o pseudônimo de Richard Rest (que usava em companhia do editor Enrique Butelman), o sociólogo Gino Germani dirigia a seção. Stern recebia dele "cópia fiel, na maioria dos casos, das cartas que haviam sido dirigidas à editora
Abril com pedido de interpretação", ouvia solicitações (se a
fotomontagem deveria ser horizontal ou vertical, por exemplo) e começava o trabalho, que
descreve em detalhes técnicos.
"A fotografia é o meio pelo
qual me expresso e que requer,
como afirma Julio Cortázar em
seu conto "As Babas do Diabo",
que se possua "disciplina, educação estética e firmeza nos dedos'", diz Stern. A série "Sonhos" a configura, com a ajuda
difusa de cartas cujas autoras
talvez se exercitassem na ficção, como investigadora de fantasias e inquietudes femininas,
traduzidas em imagens de beleza perturbadora, mas que, à
época, eram ignoradas ou mesmo tratadas com desprezo.
"Para Grete, a arte fotográfica era produto de uma "visualização prévia", uma espécie de
"design" que não surgia como
ideia abstrata, mas sustentada
em uma materialidade a qual
havia que, de certo modo, "editar", eludindo o artifício como
valor agregado. Sem por isso fazer da necessidade virtude, fazia arte com o que havia", analisa a crítica argentina María
Moreno em um dos quatro ensaios reunidos pelo catálogo.
Enquanto Moreno reconstitui o cenário cultural em Buenos Aires durante a produção
de Stern, o também argentino
Luis Príamo analisa a sua obra.
A contribuição brasileira vem
com a crítica Annateresa Fabris, que examina o "teatro do
inconsciente" nas fotomontagens da "Idilio", e com o psicanalista João A. Frayze-Pereira,
que explora as relações entre
fotografia e psicanálise.
OS SONHOS DE GRETE STERN
Organização: Jorge Schwartz
Editora: Imprensa Oficial do Estado de
São Paulo / Museu Lasar Segall
Quanto: R$ 60 (180 págs.)
Avaliação: ótimo
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