São Paulo, sábado, 18 de abril de 2009

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LIVROS

Crítica/"Os Sonhos de Grete Stern"

Obra exibe viagem onírica de Stern

Livro reúne montagens de alemã para ilustrar interpretações de sonhos em revista argentina; imagens estão no Lasar Segall

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

Décadas antes de a tecnologia digital permitir a manipulação de fotografias sem deixar rastros perceptíveis para não profissionais, na busca por aproximar o simulacro do real, a alemã Grete Stern (1904-1999), radicada na Argentina de 1936 até a sua morte, usou a fotomontagem para obter efeito contrário: o de criar imagens oníricas que, artifício exposto, investiam em uma "miscelânea imaginária".
O termo foi usado pela pesquisadora portuguesa Margarida Medeiros no catálogo de uma exposição de Stern em Lisboa, em 1997. Ao lembrar que a fotomontagem foi "uma das técnicas privilegiadas pela estética dadaísta e surrealista", ela observa que "a ideia de "colar" imagens" oferece "veículo ideal para sugerir o tumulto das emoções recalcadas".
Parte desse universo -46 obras realizadas por Stern, de 1948 a 1951, para a revista argentina "Idilio", hoje no acervo do Instituto Valenciano de Arte Moderna- revive na mostra "Os Sonhos de Grete Stern: Fotomontagens", em cartaz até 28 de junho no Museu Lasar Segall (r. Berta, 111, tel. 0/xx/11/5574-7322; entrada franca).
O catálogo inclui, em tamanho menor, outras 102 obras da mesma série, que ilustrava a seção "A Psicanálise Vai Ajudá-la", dedicada à interpretação de sonhos. "Era um momento em que os conceitos de ideias psicanalíticas se inseriam em todas as camadas sociais, e a referida página foi recebida com agrado pelo público leitor, majoritariamente feminino", diz Stern em "Anotações sobre a Fotomontagem", texto de 1967 incluído no catálogo.

"Pedido de interpretação"
Sob o pseudônimo de Richard Rest (que usava em companhia do editor Enrique Butelman), o sociólogo Gino Germani dirigia a seção. Stern recebia dele "cópia fiel, na maioria dos casos, das cartas que haviam sido dirigidas à editora Abril com pedido de interpretação", ouvia solicitações (se a fotomontagem deveria ser horizontal ou vertical, por exemplo) e começava o trabalho, que descreve em detalhes técnicos.
"A fotografia é o meio pelo qual me expresso e que requer, como afirma Julio Cortázar em seu conto "As Babas do Diabo", que se possua "disciplina, educação estética e firmeza nos dedos'", diz Stern. A série "Sonhos" a configura, com a ajuda difusa de cartas cujas autoras talvez se exercitassem na ficção, como investigadora de fantasias e inquietudes femininas, traduzidas em imagens de beleza perturbadora, mas que, à época, eram ignoradas ou mesmo tratadas com desprezo.
"Para Grete, a arte fotográfica era produto de uma "visualização prévia", uma espécie de "design" que não surgia como ideia abstrata, mas sustentada em uma materialidade a qual havia que, de certo modo, "editar", eludindo o artifício como valor agregado. Sem por isso fazer da necessidade virtude, fazia arte com o que havia", analisa a crítica argentina María Moreno em um dos quatro ensaios reunidos pelo catálogo. Enquanto Moreno reconstitui o cenário cultural em Buenos Aires durante a produção de Stern, o também argentino Luis Príamo analisa a sua obra.
A contribuição brasileira vem com a crítica Annateresa Fabris, que examina o "teatro do inconsciente" nas fotomontagens da "Idilio", e com o psicanalista João A. Frayze-Pereira, que explora as relações entre fotografia e psicanálise.


OS SONHOS DE GRETE STERN

Organização: Jorge Schwartz
Editora: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo / Museu Lasar Segall
Quanto: R$ 60 (180 págs.)
Avaliação: ótimo



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