|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CRÍTICA
Filme tem elenco ruim e roteiro frágil e burocrático
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
Primeiro, aos que leram
"O Código Da Vinci": a
adaptação para cinema não se
resume apenas a jogar fora situações do romance, algo natural diante da impossibilidade
de condensar toda a ação em
140 minutos. Há também uma
série de variações -algumas
pequenas, outras mais significativas, sobretudo no final.
Pode ser que o roteirista Akiva Goldsman tenha preferido
suas soluções às de Dan Brown,
mas é provável que as alterações sirvam ao objetivo primordial de criar novidades para quem já conhece a trama e
tende a encarar o filme com
certa desconfiança.
De qualquer forma, com
Goldsman nunca se sabe: depois de perpetrar "Batman e
Robin" (1997) e "Perdidos no
Espaço" (1998), ele ganhou o
Oscar de roteiro adaptado por
"Uma Mente Brilhante" (2001)
e assinou também "A Luta pela
Esperança" (2005), os dois últimos em parceria com o diretor
Ron Howard, que o trouxe para "Código".
O que era "Uma Mente Brilhante"? Um filme de ator (e
que ator: Russell Crowe) delineado em torno de um só personagem (e que personagem:
gênio e maluco em doses cavalares). "O Código Da Vinci"
tem arquitetura mais descentralizada: aventura com ações
paralelas, meia dúzia de personagens relevantes para o encadeamento da trama.
Para complicar, o pano de
fundo de almanaque, conduzindo à obrigação de combinar
ingredientes de história, religião e arte. Costumou-se dizer
que o livro era um roteiro
pronto, mas aí está o filme para
demonstrar o contrário: quando segue o romance ao pé da letra, o resultado é burocrático e
insatisfatório; quando procura
escapar dele, frágil.
A escolha do elenco tem sua
cota de responsabilidade, claro.
Tom Hanks e Audrey Tautou
não foram capazes de fazer por
seus personagens o que Ian
McKellen e Jean Reno conseguem, ao usar os traços descritos por Dan Brown para compor figuras de identidade própria. Já Alfred Molina e Paul
Bettany, a turma da Opus Dei,
beiram o constrangimento.
Agora, aos que não leram e
não pretendem ler: "O Código
Da Vinci" procura ser didático
para não deixar ninguém com
a sensação de que perdeu um
pedaço importante da história.
Na medida em que a correria
permite, explica-se o essencial.
O problema é que, neste caso, o
essencial talvez seja pouco.
Além disso, a pretensão de
deixar tudo muito explicadinho soa escolar, no mau sentido do termo. Em vez de fluir
naturalmente, a narrativa tem
"legendas", por meio de diálogos que contam o que não se
viu e de inserções ao estilo PowerPoint que resumem abruptamente informações e linhas
de raciocínio.
E, aos quem não leram o romance e não pretendem ver o
filme exclusivamente por questões de fé: no final das contas, o
discurso da adaptação para cinema é carola e inofensivo. Até
a Opus Dei, vilanizada como
instituição no livro, recebe tratamento mais moderado, quase gentil.
Eis um filme com comportamento de candidato que acende uma vela para Deus e outra
para o diabo em tempo de eleição: nem tanto à esquerda nem
tanto à direita, muito pelo contrário. "O Código Da Vinci"
quer ficar bem com todo mundo, mas é provável que essa
ambição desmedida lhe renda
o castigo de gerar descontentamento em todo mundo.
O Código Da Vinci
The Da Vinci Code
Direção: Ron Howard
Produção: EUA, 2005
Com: Tom Hanks, Audrey Tautou,
Paul Bettany, Ian McKellen, Jean Reno
Quando: a partir de amanhã no Frei
Caneca Unibanco Arteplex, Bombril e
circuito
Texto Anterior: Ator de "Código" alimenta polêmica com igreja Próximo Texto: Filmes políticos abrem competição Índice
|